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Crítica | Spy x Family – 1ª Temporada

Política da Guerra Fria e muita fofura.

por Luiz Santiago
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Baseado no popular mangá de Tatsuya Endo, cuja publicação original começou em 2019, Spy x Family ganhou sua esperada adaptação para a TV com uma primeira temporada de 25 episódios, dividida em duas partes, entre abril e dezembro de 2022. Seguindo a essência do quadrinho, o enredo do anime acompanha o espião Twilight, que, disfarçando-se de psiquiatra (adotando o nome Loid Forger) e construindo uma família fictícia, precisa investigar o líder do Partido da Unidade Nacional de Ostania, o Sr. Donovan Desmond. O que coloca um pouco mais de lenha na fogueira é que toda a sua família vive de aparências, algo que os roteiros tratam com leveza e ironia: Yor, a esposa de conveniência, é uma assassina profissional; e Anya, a filha adotiva, tem habilidades telepáticas. Num primeiro momento, a série parece querer seguir o caminho de intrigas e ocultações mais densas entre os personagens, porém se desvia dessa trilha a cada episódio, chegando ao final em uma abordagem completamente diferente.

A linha condutora da temporada é o conflito entre Ostania e Westalis, dinâmica geopolítica muitíssimo perigosa para todo o mundo, seguindo a atmosfera da Era MAD (Destruição Mútua Assegurada), durante a Guerra Fria — com maior destaque temático para os anos 1950. Existem, aliás, inúmeras adaptações de conflitos reais, embates diplomáticos, citações ou sugestões de que esta realidade é uma versão um tantinho mais fria do que a Guerra Fria real. E apesar de haver grande violência, interesses territoriais e econômicos, e ações estatais de espionagem de ambos os lados, a maneira como os textos tratam a questão nos coloca e um ambiente [pseudo] neonoir (os figurinos destacam isso melhor que tudo!), com cada episódio apresentando um ou mais conflitos para diferentes personagens ganharem destaque. No início, esses problemas estavam mais centrados em Anya e em sua adaptação na escola, mas com o andamento da temporada, o leque de atuação se abriu, mudando também o tom da série.

Por mais que Twilight e Yor guiem o texto do ponto de vista da ação e dos planos, quem assume o real protagonismo é Anya, a adorável e hilária menininha, que é esperta o bastante para não permitir que os outros saibam do seu grande segredo. Enquanto os adultos fazem isso de maneira óbvia, Anya percebeu que pode se dar muito mal se alguém desconfiar dela — inclusive lembrando de eventos traumáticos de seu passado, fazendo-nos pensar em algo na linha do que vimos com Eleven, em Stranger Things –, por isso faz de tudo para guiar as situações ao seu redor apenas com a inocência movida por este “pequeno conhecimento” dos pensamentos alheios. Ela é a personagem com o desenvolvimento mais coerente ao longo de toda a temporada, e a que menos teve mudanças bruscas no núcleo principal. Twilight varia bastante em tratamento dramático, ora sério demais, ora despreocupado demais; porém, sustenta a essência de grande espião. Por outro lado, Yor é definitivamente reconstruída. Sua atividade de assassina simplesmente desaparece, a partir de determinado momento, e dessa atividade sobra apenas a sua admirável lista de habilidades e os pensamentos intrusivos sobre a essência do ofício — divagações estas que me arrancaram boas gargalhadas.

Talvez o personagem mais fora de órbita aqui seja Yuri, o irmão de Yor. É impossível não sentir imensa estranheza pela forma como esse personagem é apresentado, com um ciúme/amor/fixação pela irmã que ultrapassa qualquer nível de uma saudável relação fraterna, por mais amorosa e cuidadosa que consideremos uma relação entre irmãos. Já a contraparte de Yuri, a espiã Nightfall, mesmo caracterizada de maneira bobinha na paixão que sente por Twilight, alterna de forma aceitável os seus arroubos românticos com uma participação interessante na trama, destacando o episódio com o jogo de tênis, um dos mais tensos e dinâmicos da temporada, juntamente com o capítulo da reunião da cúpula política, que acabou sendo um dos meus favoritos, porque traz outro personagem adorável para o elenco: o cão Bond.

O segundo bloco da temporada trouxe uma dinâmica mais leve e visualmente mais afeita a experimentos, como vemos na diagramação das emoções dos personagens (com desenhos cada vez mais exagerados, seguindo o caminho conhecido dos animes) e muitos momentos de conflito. É também um bloco visualmente mais claro e com tramas narrativamente mais simples, embora mais marcadas por dinâmicas de movimento. É também um momento da temporada onde os personagens são verdadeiramente desenvolvidos, algo que praticamente não ocorre na parte inicial do ano. Novamente, a melhor construção de personagem aqui é a de Anya, mas todos os outros recebem o seu quinhão dramático aceitável, chegando ao episódio final com um bom nível de conquista do público, assim como a trama central, que embora tenha perdido muito com regulares missões paralelas, conseguiu entregar aquilo que prometeu. O primeiro contato de Twilight com seu alvo foi feito. Falta agora entender mais da personalidade e ações políticas desse indivíduo, o que talvez aponte para um novo caminho sério nos dramas da série, no começo da próxima temporada. É esperar para ver.

Spy x Family – 1ª Temporada (Supai Famirî / スパイファミリ) — Japão, 2022
Direção: Kazuhiro Furuhashi, Takahiro Harada, Tetsurô Araki, Norihito Takahashi, Tatsuyuki Nagai, Shinsaku Sasaki, Yousuke Yamamoto, Yukiko Imai, Takashi Katagiri, Kenji Takahashi, Toshifumi Akai, Daiki Harashina, Tomoya Kitagawa, Yusuke Kubo, Takahiro Miura, Takeyoshi Akane, Haruka Tsuzuki, Ryō Kodama, Hidekazu Hara, Miyuki Kuroki
Roteiro: Tomomi Kawaguchi, Rino Yamazaki, Daishirō Tanimura, Honoka Katō, Ayumu Hisao (baseado na obra de Tatsuya Endo)
Elenco 1 (vozes originais): Takuya Eguchi, Atsumi Tanezaki, Saori Hayami, Kenichirou Matsuda, Hiroyuki Yoshino, Yūko Kaida, Kazuhiro Yamaji, Kensho Ono , Mirei Kumagai, Natsumi Fujiwara, Emiri Katō, Ayane Sakura, Kenichirou Matsuda, Umeka Shōji, Manaka Iwami
Elenco 2 (vozes da dublagem brasileira): Guilherme Marques, Maíra Paris, Nina Carvalho, Victor Moreno, Ricardo Daunt, Alice Caffagni, Rodrigo Cagiano, Nicolas Mattos, Gabriel Noya, Hélio Ribeiro, Glauco Marques, Eduardo Borgerth, Thiago Keplmair, Clara Rocha, Beatriz Villa, Samira Fernandes
Duração: 24 episódios de 24 minutos

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