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Crítica | Sparklite

por Giba Hoffmann
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Dentre as zonas criativas no mundo dos games independentes, encontram-se em alta tanto as explorações variadas do modelo rogue-lite quanto revisitações das icônicas entradas 2D de The Legend of Zelda. Ainda que não seja o primeiro a se arriscar na combinação dessas duas tendências, Sparklite é um daqueles títulos capaz de chamar sua atenção logo de cara  — os contornos autorais do spritework e a leveza das animações dão uma bela embalagem visual para a promessa tentadora, ainda não cumprida, de um “Zelda 2D sem fim”.

Embora a exploração do estilo audiovisual de “16-bits HD” já não seja um elemento diferencial com o mesmo peso que possuía alguns anos atrás, trata-se de uma primeira impressão positiva que se mantém por toda a jornada. Sabendo delimitar seu estilo com precisão e explorando uma variedade de paletas diferentes, o mundo em eterna transformação de Sparklite não fica devendo em nada no quesito em relação à arte trabalhada de The Swords of Ditto, por exemplo.

A construção de mundo segue a mesma toada, trazendo uma ambientação futurista-steampunk que não foge muito do minimalismo característico das aventuras de Link. No controle de Ada, os jogadores exploram o mundo de Geodia, que enfrenta atualmente uma catástrofe natural que aparentemente possui relações com a misteriosa fonte de energia que dá o nome ao jogo. Embora os personagens não tragam muita originalidade, o elenco oferece o suporte necessário para uma aventura curta e despretensiosa.

Por trás desse charme superficial bem construído, temos o prato principal do jogo: a jogabilidade. Ao descer da plataforma voadora que serve como hub para sua equipe de exploradores, inventores e agregados, Ada se vê em um cenário que segue o esquemão conhecido de Zelda: um mapa do mundo persistente, pontuado por dungeons exploráveis e dividido em áreas temáticas cujo acesso depende de determinados requisitos, como a coleta de itens e power-ups específicos. Em linhas gerais, além das caverninhas menores opcionais, temos cinco santuários de equipamentos e cinco dungeons principais, cada qual contando com um chefe titânico.

Até aqui, tudo normal, certo? A grande diferença é que a cada vez que Ada vai a nocaute, coincidentemente, um grave acidente geológico transforma todo o mapa-mundi de Geodia, fazendo com que cada nova tentativa de superar o jogo conte tecnicamente com um mapa único. Dizemos “tecnicamente” porque na verdade o que se tem, tanto no mapa do mundo quanto nas dungeons, é um embaralhamento de telas pré-definidas, ou seja, um nível bem mais básico de aleatorização do que o que se veria em um rogue-lite “de raiz”.

Esse foco no aspecto “lite” do subgênero é uma faca de dois gumes para o game. Ao mesmo tempo em que ganha pela leveza e acessibilidade inicial, o jogo também apresenta menos variabilidade do que se poderia esperar em termos dos cenários, que trocam de ordem mas se mantém os mesmos. Como grande parte da progressão consiste em acumular sparklite para financiar suas explorações, com o tempo o jogador vai ficado habituado com os “blocos de construção” que compõem cada configuração de Geodia, o que pode ser um ponto negativo para quem espera um elemento maior de imprevisibilidade.

Uma vez aceito o fato de que o jogo propõe uma aventura de pequeno porte, sem prometer construção procedural de mapas ou grande variedade de itens, o título prova que o simples embaralhamento da ordem dos fatores é, sim, capaz de mudar consideravelmente o produto. O ciclo de exploração e progresso, coração de todo bom jogo do gênero, é bem balanceado e me manteve engajado por horas e mais horas. Um dos elementos mais legais é o da progressão de personagem, através de patches equipáveis que podem ser fundidos entre si e organizados em um inventário de grade. Simples, intuitivo e incentivador, trata-se e um dos pontos fortes em termos da mecânica de progressão.

Acumulando sparklite por entre as diferentes “encarnações” de Geodia, Ada pode adquirir diferentes upgrades para sua base, bem como power-ups consumíveis (widgets) para aumentar suas chances de completar o desafio. Por conta de uma ativação demorada, os widgets ofensivos acabam não tendo tanta utilidade. Na hora do aperto, foram bem poucas as vezes em que uma dessas bombas pouco práticas me serviu de alguma coisa. Já os itens defensivos e de cura podem ser a diferença entre o sucesso e o fracasso de uma investida. Já os gadgets, obtíveis a partir de santuários específicos, são equipamentos fixos que adicionam habilidades variadas para Ada. Conforme se avança na história, a coleção de opções aumenta —  tirando um início um pouco lento, no qual a barra de energia ainda pequena limita demais a ação, a variedade complementa bem o ótimo level design das cavernas, oferecendo opções novas que estimulam a revisitação das áreas antigas.

Após completar a primeira das dungeons principais, o robozinho Wingnut passa a atuar como ajudante de Ada, e com isso um uma opção de jogo cooperativo é habilitada. De início, o pobre robô não é capaz de fazer muita coisa, porém com o passar do tempo é possível incrementar seu arsenal com novas habilidades. No entanto, não espere nada muito elaborado: o modo parece mais um complemento posterior do que um elemento pensado como parte integrante da experiência.

No fim das contas, o que realmente conta na briga contra as forças do mal acabe sendo uma boa masterização da mecânica básica de ação, que consiste no uso do dash, dos gadgets e da chave inglesa que Ada usa como arma, ao melhor estilo Ratchet. Com o ciclo de tentativas e sistema de progressão bem equilibrados, o jogo é capaz de oferecer boas horas de diversão para quem busca uma exploração precisa e bem focada do subgênero. Uma coleção mais variada de puzzles — incluindo alguns desafios mais cabeludos — poderia complementar perfeitamente a experiência, aliviando a frente da ação de segurar quase toda a responsabilidade pelo desafio. Ainda assim, o título joga muito bem e cumpre com precisão aquilo que se propõe a fazer.

Por trás da aparente simplicidade e da tonalidade leve e acessível, Sparklite acaba revelando uma sólida mecânica de ação que acaba sendo um de seus inusitados pontos fortes. Combinada com o audiovisual carismático, a jogabilidade bem afinada oferece uma bela aventura retrô para jogadores em busca de um desafio mais focado do gênero. Mas ainda não é o “Zelda 2D procedural” que tanto aguardamos (e merecemos). Quem sabe na próxima?

Sparklite
Desenvolvedora: Red Blue Games
Lançamento: 14 de novembro de 2019
Gênero: RPG de ação, rogue-lite
Disponível para: PC, PS4, Xbox One, Switch

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