Desde o início de Shadowhunters eu venho procurando motivos para gostar e justificar algumas coisas que os roteiristas escolheram para os episódios, mas tem ficado cada vez mais difícil encontrar. E a realidade ainda piora quando temos um episódio como este, que traz uma baita de uma promessa, executa cenas perdidas de coisas muito boas e assim, como quem não quer nada, se desvia do caminho ou repete aquilo que todo mundo já sabe e já se familiarizou desde The Mortal Cup.
A melhor coisa do episódio? Magnus Bane, o feiticeiro. A melhor proposta do episódio? Magnus Bane, o feiticeiro. E… conseguiram trabalhar bem Magnus Bane, o feiticeiro? Definitivamente não. Harry Shum Jr. é um ator competente e possui uma interpretação afetada que faz sentido para o personagem — Magnus é um bon vivant que está ameaçado e é orgulhoso demais para se deixar abalar, então tudo aquilo é uma alta pose proposital e bem interessante, embora tão artificial que enjoa, mesmo quando entendemos sua intenção –, mas nem com a inserção desse personagem, o episódio conseguiu ao menos chegar no patamar mediano. E olha que alguns momentos eu achei que iria chegar.
Nos perguntamos, por exemplo, por que Luke teve que aparecer nesse episódio. O que de interessante esse personagem trouxe para a série depois de sua participação no piloto? Absolutamente nada! E mesmo assim, seu cameo inútil parece ser lei em Shadowhunters. Perceba que nos capítulos dois e três tivemos a mesma dinâmica de Luke às voltas com seu trabalho na polícia e dizendo que precisa proteger e encontrar Clary, mas não faz nem uma coisa, nem outra e não sai do lugar. Nesse Universo, Luke deve ser o equivalente aos nossos “revolucionários de facebook”.
E eis que eu estava esperando o momento em que a sexualidade de Alec viria a tona. O tom do episódio desde a inserção de Magnus mudou um pouco, ficou mais divertido, mais… irônico, trazendo um pouquinho da essência dos livros. Esse lado e a verdadeiramente doce cena de ligação Parabatai entre Jace e Alec me animaram por alguns minutos. Mas então percebemos que o diretor deixou Magnus com sua pose afetada durante muito tempo (é função do diretor guiar os atores por um caminho “x” de representação, ao menos quando falamos de bons atores e Shum Jr., mesmo não sendo lá gloriosamente excelente, é um bom ator, está bem acima da “atuação-porta” de Katherine McNamara, por exemplo); não resolveu logo o impasse de Simon como semi-vampiro e quase não nos deu nada novo, nem estética e nem dramaticamente.
E mais sobre o terrível roteiro… Imagine que você vê alguém com uma runa queimando no pescoço e marcando a pele. Essa pessoa, claro, demonstra dor. Você perguntaria a ela se ela está tudo bem? Pois é, Clary perguntou. Imagine que você está super assustado e foi caçado e sequestrado por vampiros. Você sabe que sair de um lugar que te manteve seguro até o momento não é a melhor ideia e pode colocar as outras pessoas que você ama em risco. O que você faria, contaria para alguém que confia o que está acontecendo ou sairia do lugar que te manteve seguro e iria para onde moram as pessoas que te sequestraram? Pois é, Simon escolheu a segunda opção.
Sem contar que parece que fizeram um único take para marcar a entrada narrativa em Chernobyl e desde a primeira vez que isto apareceu nós vemos exatamente a mesma coisa. E nem falamos do diminuto uso de cenários no mesmo lugar. Sem contar o lenga-lenga do pai de Clary, que faz a mesma coisa desde o primeiro episódio; a mãe dela que está na mesma posição desde o primeiro episódio; e as mortes e ações inúteis dos Shadowhunters desde o segundo episódio. O espectador fica espantado em saber que o grupo conseguiu sobreviver até esse momento sendo tão… pouco inteligentes e tão emotivos e tão inconstantes para praticamente todos os problemas que tem em mãos.
E para piorar tudo, a estranhíssima sugestão da homossexualidade de Alec na cena — bacana, até — do demônio que comeu a memória de infância de Clary. Se as incursões libidinosas vieram de forma cômica e fofa (essa é a palavra, não tem jeito) no primeiro olhar trocado entre Alec e Magnus, elas vão caminhando para uma relação um tanto forçada e representa um medo ou negação que parecem exagerados demais. Tudo bem que, do livro, sabemos que a Clave não é tão confortável assim com Caçadores de Sombras gays (péssimo, não?), mas a forma como essa colocação está posta no episódio, já sugerindo um triângulo-retângulo amoroso, estragou a única coisa que poderia ser bem construída em Raising Hell.
Nada mudou, tudo está lento demais, quase parando, e a parte técnica — especialmente a direção — que já não era lá essas coisas, conta agora com execuções desleixadas e sem identidade. Cassandra Clare deve estar tendo pesadelos horríveis toda semana com esses episódios.
E antes de terminar, deixo aqui um desafio a todos: contem quantas vezes vocês reviraram os olhos ao longo dos episódios. Em Raising Hell, eu revirei os olhos 21 vezes.
Shadowhunters 1X04: Raising Hell (EUA, 2016)
Direção: Tawnia McKiernan
Roteiro: Michael Reisz
Elenco: Katherine McNamara, Dominic Sherwood, Alberto Rosende, Matthew Daddario, Emeraude Toubia, Isaiah Mustafa, Harry Shum Jr., Alan Van Sprang, Kaitlyn Leeb
Duração: 42 min.