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Crítica | Serviçal, Trabalhe Duro

O mais antigo filme de Mikio Naruse a sobreviver ao tempo.

por Luiz Santiago
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A experiência de assistir a Serviçal, Trabalhe Duro (1931), o mais antigo filme de Mikio Naruse a sobreviver (seus sete filmes anteriores são considerados perdidos, infelizmente, algo muito comum para diretores do Primeiro Cinema japonês — e, a bem da verdade, um problema observado em outras cinematografias ao redor do mundo), é bastante diferente do que esperaríamos de um filme do diretor, principalmente se levarmos em consideração as películas das décadas de 50 e 60.

O que chama a atenção de imediato é que este curta-metragem não é centrado em uma mulher, característica marcante na filmografia de Naruse. Na trama, um pobre vendedor de seguros (Isamu Yamaguchi) vive em uma casa pequena com sua esposa, um bebê e um filho mais velho, Susumu, o “grande problema” da vizinhança. Desde as primeiras cenas observamos o protagonista às voltas com as dificuldades causadas pela falta de dinheiro (tema caro ao diretor) e como ele e a esposa enfrentam a situação. A comédia é o gênero que nos acompanha em quase toda a obra, e o roteiro de Naruse é simplesmente delicioso aqui — exceto pela reta final do filme, onde reside o seu maior problema, mas falaremos disso adiante.

Yamaguchi dá vida a um personagem pelo qual o espectador se apaixona à primeira vista. Sua cara de inocente, a forma como ele é apresentado — limpando o sapato e com o filho bebê preso às costas — as trapalhadas bem medidas, tudo relacionado a ele recebe a nossa simpatia e isso talvez seja um dos principais problemas quando falamos da finalização do filme, que é um acovardamento do diretor — ou visão insanamente otimista… ou imposições do Estúdio, vai saber… Nesse ponto, o artista se deixa levar pelo sentimentalismo, e isso aparece claramente no filme como um Deus Ex Machina intragável e que só não faz a obra cair porque o caminho para chegar até ali foi realmente bem estruturado.

Um ponto curioso a se destacar na reta final é um erro de continuação em relação a uma notícia que o vendedor de seguros recebe. Já nesse ponto, o roteiro deixara de ser à prova de falhas e entrara no caminho das obviedades. O mais intrigante é que a montagem consegue fazer sobreposições, fades e jogos de imagem que, de certa forma, flertam com o cinema experimental europeu, mesmo que por alguns segundos. Essa liberdade maior na hora, de mostrar pensamentos, sentimentos e recepção de determinadas notícias é tão boa, que fica difícil entender como é que o mesmo setor conseguiu chegar a um erro de ritmo e continuação como o que temos no mesmo bloco.

Mesmo com um final que segue por um caminho nada condizente com a grandeza da maior parte do filme, Serviçal, Trabalhe Duro é um notável exercício de observação de uma família pobre, da relação entre pais e filhos e de como algo trágico pode entrar na vida das pessoas e mudar por completo a perspectiva sobre o que é ou não é importante para uma família.

Serviçal, Trabalhe Duro (Koshiben ganbare | 腰弁頑張れ) — Japão, 1931
Direção: Mikio Naruse
Roteiro: Mikio Naruse
Elenco: Shizue Akiyama, Seiichi Katô, Tomoko Naniwa, Tokio Seki, Hideo Sugawara, Isamu Yamaguchi
Duração: 31 min.

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