- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios.
Faltou algo ao antepenúltimo episódio de Servant. Ao longo de uma temporada decididamente mais bizarra e, por consequência, menos sutil que as anteriores, os sete primeiros episódios foram capazes de desconstruir e reconstruir Leanne como uma força da natureza, defenestrando completamente as dúvidas sobre seus poderes e, muito ao contrário, usando-os para rechear a história de momentos interessantes e tensos que a colocaram mais explicitamente do que nunca em rota de colisão tanto com os Turners quanto com sua ex-igreja. Mas Tunnels parece ter dúvidas sobre que caminho tomar, não conseguindo nem retornar à abordagem anterior mais discreta e nem aloprar de vez de maneira eficiente, sem apelar para obviedades um pouco cansadas e fáceis demais.
Em seu começo, talvez até mais do que isso, na verdade, o que vemos é um grandessíssimo nada que, ainda por cima, é lento demais, com a tempestade tomando conta da Filadélfia e Leanne considerando-a uma espécie de intervenção divina contra ela, sozinha e abandonada entre os mortais que também se colocaram em sua oposição. O conceito é até interessante, mas sua realização foi canhestra, um retrocesso no enfoque mais direto que a temporada vinha tendo, pois o estranhamento, representado pelo raio solitário que atinge o telhado da mansão logo atrás de Leanne, fica somente por aí, sem ganhar a dimensão que poderia ganhar de anjo caído versus Deus e sem realmente justificar que seus protetores sejam enviados para longe, para “espalhar a palavra da babá”. Se pelo menos a sequência tivesse tido mais tempo, sem a interferência quase imediata de Julian, ela poderia ter um poder maior do que o que foi mostrado, realmente criando um embate sobrenatural, mas, ao mesmo tempo, galgado nessa realidade claustrofóbica da série.
O plano de Sean e Julian para atrair Leanne para os túneis abaixo da casa é outro que não faz muito sentido e ainda bem que o roteiro de Laura Marks não inventa de fazer a jovem cair na esparrela dos dois, obrigando-os a tomar medidas mais físicas. E, com isso, a ação que faz com que Leanne, amarrada, seja entregue ao tio George, até funciona bem, ainda que tudo aconteça rapidamente demais. No entanto, o que vem em seguida é que realmente desaponta, pois, no papel, o encadeamento de situações – tio George desamarrando sua protegida, a faca quente sendo entregue a ela e, claro, ela enterrando a arma nele e, depois, usando-a para matar os dois minions e, em seguida, furar seus olhos – tinha mérito e poderia ser um grande ponto de virada. Mas a direção de Nimród Antal não deixou isso acontecer.
Na verdade, minto. O ponto de virada obviamente aconteceu. Tio George está morto, Sean e Julian estão fora do tabuleiro pelo momento e Leanne está sozinha na casa com Dorothy incapaz e Jericho indefeso. Mas o diretor faz da fúria assassina de Leanne uma pantomima que não está “lá nem cá”, ou seja, não combina nem com a Servant pré-temporada atual, nem a Servant da quarta temporada, sem freios e propositalmente desatinada. Sim, a faca em brasa enfiada na cabeça do tio George tem um efeito visual interessante, mas Antal consegue fazer até isso parecer burocrático, não aproveitando a previsibilidade do momento para entregar algo mais, algo que muito provavemente Ishana Shyamalan entregaria se estivesse capitaneando o episódio. E o mesmo vale para os assassinatos off screen dos outros dois cultistas e para os momentos em que Leanne faz Julian cair escada abaixo e em que Sean se esfaqueia.
Ou seja, conceitualmente está tudo lá, tudo encaixando-se com o estilo assumido pela temporada final, mas, em termos de execução, o que vemos é um episódio que ao mesmo tempo sabe que não pode ser sutil, mas que parece ter medo de soltar as rédeas para trabalhar os eventos sobrenaturais e violentos sem seguir fielmente o “manual básico de direção”. Faltou algo em Tunnels e esse algo certamente tem relação com o trabalho atrás das câmeras de Antal, ainda que o resultado prático final tenha sido suficiente para preparar o encerramento da série.
Servant – 4X08: Tunnels (EUA, 03 de março de 2023)
Direção: Nimród Antal
Roteiro: Laura Marks
Elenco: Lauren Ambrose, Toby Kebbell, Nell Tiger Free, Rupert Grint, Boris McGiver
Duração: 26 min.
