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Crítica | Servant – 4X02: Itch

O apocalipse de percevejos.

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios.

Leanne está se tornando Moisés ou, pelo menos, a canalizadora de uma versão moderna das Dez Pragas do Egito. Depois de invocar pombos empombados para salvá-la em Pigeon, ela partiu para convocar um infindável e nojento exército de percevejos de colchão para atazanar a vida de Dorothy, no momento presa em sua cama hospitalar em um dos quartos de sua mansão. Mas, em uma demonstração considerável de seu descontrolado poder “divino” – coloco as aspas simplesmente por não ter certeza de onde ele vem -, sua praga da vez causou um caos na Rua Spruce, com caminhões de dedetização e pessoas com macacões de segurança e máscara tomando o local.

Confesso que essa situação toda, apesar de bizarra e talvez até horripilante, serviu, pelo menos para mim, como momentos de alívio cômico em meio ao embate psicológico entre uma Leanne contrariada e vingativa e uma Dorothy inválida e enfurecida. Afinal, quando Sean, Julian, Leanne e Kourtney (esta chamada ali por Dorothy) olham pela janela para a rua, a visão que eles têm é quase que literalmente apocalíptica, em um exagero de pegada claramente satírica – uma das marcas da série, mas que nem sempre aparece com vigor – que a direção de Kitty Green capturou muito bem, transportando a doideira para dentro da casa com a chegada de Frank, já devidamente fardado de plástico para proteger seu caríssimo terno Tom Ford, trazendo ajuda para sua família.

O caos que se instala, com direito a ensaios românticos entre Leanne e Julian, ataques de ciúmes de Julian em razão da presença de Tobe, conspiração entre Dorothy e Kourtney, estofados sendo revirados para encontrar quantidades absurdas de percevejos e assim por diante é um primor de como se guiar um episódio frenético, daqueles que não dá tempo para o espectador sequer pensar, o que dirá respirar. É como assistir um curta metragem de horror produzido por Eugène Ionesco com condução de Salvador Dalí filtrado por lentes de Comédia de Erros. O resultado final chega a ser tão inusitado, que é surpreendente que ele não só seja harmônico, como também capaz de impulsionar a história, jamais parecendo “enrolação” ou aquela esperta “andada de lado” que costuma acontecer em últimas temporadas.

Se o primeiro episódio da temporada mergulhou fundo na ameaça da ex-igreja de Leanne a ela, com uma abordagem mais clássica de horror claustrofóbico até mesmo a demonstrações mais abertas do poder da babá, Itch reverte ao estilo padrão da série, mantendo a ação confinada à casa dos Turners e, em essência, focando no conflito entre ela e Dorothy, conflito esse cada vez mais aberto e cruel, com medidas extremas tomadas pelos dois lados. Mas o mérito verdadeiro do capítulo é conseguir fazer isso tudo dentro de um envelopamento primoroso de “filme de fim de mundo” que gravita ao redor de algo tão prosaico – mas realmente irritante e nojento – como os insetos sugadores de sangue que adoram se alojar onde nós dormimos e, mais ainda, dentro da minutagem apertada usual.

A chegada das duas enfermeiras aparentemente muito ferozes para proteger Dorothy é outra jogada ótima do roteiro de Alyssa Clark que usa a presença delas como um contraponto a uma Leanne cada vez mais dividida entre querer ser da família a todo custo e seus dons sobrenaturais. A promessa de um embate ainda mais aberto entre os dois lados dessa guerra íntima é algo que consegue – pelo menos para mim – ser infinitamente mais interessante do que o vindouro cabo de guerra religioso que, provavelmente, será o verdadeiro clímax da temporada e, naturalmente, de toda a série.

Itch é mais um acerto neste começo da derradeira temporada da série que não parece receosa em inovar em sua estrutura sempre que possível, seja transportando a ação para o outro lado da rua, seja enxertando humor ácido e absurdo, por vezes dadaísta até, como é o caso aqui. Se Tony Basgallop será capaz de manter esse ritmo apertado e diferente até o final é algo que teremos que esperar para ver, mas, com certeza, de dedos cruzados para que ele consiga. E que venham mais pragas!

Servant – 4X02: Itch (EUA – 20 de janeiro de 2023)
Criação e showrunner: Tony Basgallop
Direção: Kitty Green
Roteiro: Alyssa Clark
Elenco: Toby Kebbell, Lauren Ambrose, Nell Tiger Free, Rupert Grint, Tony Revolori, Boris McGiver, Todd Waring, Katie Lee Hill
Duração: 27 min.

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