Com tantos animais geneticamente modificados na seara do subgênero horror ecológico, tardou para que os gatos protagonizassem histórias do tipo, no papel de antagonistas monstruosos. Esses felinos domesticados, conhecidos por sua beleza e hábitos peculiares, geralmente representam mistério, morte, azar, dentre outras coisas. O imaginário popular em torno dos gatos, em especial, na relação que fazemos com o famoso conto de Edgar Allan Poe, é vasto. E, neste espaço cultural, as criaturas que miam e dizem por aí, possuem sete vidas, não tem nada de agradável, como o caso do filme Sem Convite, trama bizarra sobre um gato que sofre uma mutação genética e se torna uma criatura assassina. Sob a direção e roteiro de Greydon Clark, a produção lançada em 1987 é um manancial de absurdos ao longo de seus toscos, mas divertidos 91 minutos. Fosse apenas um animal assassino, tudo bem, mas o seu dom de ponderar comportamentos e agir como um maníaco slasher que pune as vítimas despudoradas é demasiadamente irreverente.
Com os desdobramentos da ação em sua maior parte, dentro de um iate luxuoso, Sem Convite nos faz acompanhar o passeio de um milionário criminoso que viaja com um grupo em sua embarcação, tendo em vista fugir das agruras e possível condenação de um projeto judicial. O seu destino, tal como vários filmes e séries, é um período de glória nas Ilhas Cayman, paraíso dos golpistas e local onde os personagens de tantas produções adoram assegurar as suas economias. O que ninguém esperava era a presença aterrorizante de um gato mutante que espalha medo e horror entre os passageiros, numa trilha de corpos ensanguentados pela fúria desta excêntrica criatura. Antes, porém, de chegar ao iate, o filme nos faz seguir a trajetória do animal. Ele escapou do laboratório de pesquisa de uma grande corporação e matou várias pessoas até chegar ao seu destino. Primeiro foram os funcionários do prédio onde se instalava o laboratório, depois, ao passar pelo duto de ar, chega ao caminhão que lhe serve de carona ligeira, pois o felino mata o motorista.
Depois dessa breve missão na estrada, o gato consegue chegar ao iate, sem antes deixar o estrago para trás. A sua caminhada é exposta pela supervisão de efeitos visuais, comandada por Debi Boulden, um setor com desafio enorme, tamanha a excentricidade do conteúdo dramático e o orçamento limitado. Além disso, transformar o gato numa criatura monstruosa requer muita inventividade e ultrapassagem de limites, postura tomada pela equipe de produção que entrega aos espectadores um bicho asqueroso, figura bizarra que ganha ainda mais presença tosca em cena pelo design de som de Tom Gunn, responsável pela presença auditiva desta aberração em cena. Na trilha sonora, Dan Slider faz o que pode com os seus instrumentos, numa textura percussiva incapaz de sublimar as falhas de Sem Convite, produção que não é o pior momento do horror ecológico na história do cinema até então, mas que testa nossa crença no bom-senso constantemente. Some tudo isso ao veneno expelido em sua mordida. O horror está completo!
Walter Graham (Alex Cord) e Mike Harvey (George Kennedy) são os idealizadores da viagem, homens que na fuga das garras da justiça, tornam-se vítimas de uma inesperada criatura monstruosa que assalta a luxuosa embarcação. Os jovens que acompanham o capitão e acabam indo parar no iate são vítimas para lista do gato, sem acréscimo dramático algum para a narrativa. Ademais, na direção de fotografia de Nicholas Josel von Sternberg, o gato encontra alguns breves momentos no famoso ponto de vista, recurso básico das narrativas que subjetivam um antagonista desde que Tubarão estabeleceu alguns padrões estéticos copiados exaustivamente até os dias atuais. Aqui, cabe ressaltar, há insinuações de estupro, tensão sexual em demasia, personagens quase sem roupa, de tanto “tesão” e um grupo de pessoas iludidas, na crença de que a viagem seria uma verdadeira “festa da carne”, algo revertido diabolicamente, pois há abundância de carne, mas humana, ofertada exclusivamente para o grotesco gato mutante assassino.
Sem Convite (Uninvited– Estados Unidos, 1987)
Direção: Greydon Clark
Roteiro: Greydon Clark
Elenco: Alex Cord, Clu Gulager, George Kennedy, Toni Hudson, Beau Dremann, Clare Carey, Shari Shattuck, Rob Estes
Duração: 97 min.