Home LiteraturaConto Crítica | Sem Ateus no Túmulo, de Edward D. Wood Jr.

Crítica | Sem Ateus no Túmulo, de Edward D. Wood Jr.

A banalização do sofrimento e da violência.

por Luiz Santiago
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Ed Wood lutou na 2ª Guerra Mundial. Sua experiência na guerra influenciaria muito o seu pensamento sobre questões ligadas ao sofrimento humano, sobre relações internacionais entre os Estados e sobre o horror da guerra. Neste conto de 1971, ele aborda esse cenário, mas não em relação à guerra que lutou. Seu personagem central, o reverendo Paul Carstairs, está em plena Guerra do Vietnã, e sua observação para o local e para as dificuldades de sobrevivência ali nos lembra um pouquinho de sua escrita em Posição Impossível. No presente conto, porém, o espaço geográfico não toma toda a atenção, não é um personagem central. A atenção aqui vai para o trabalho religioso do reverendo em campo. Ele precisa fazer as orações finais pelos soldados moribundos e participar de ações de resgate. É um homem de 48 anos de idade que já está marcado pela guerra, psicologicamente abalado e inteiramente mergulhado em um senso de obrigação que o pressiona e o impede de se aposentar.

Eu gosto bastante da discussão que o conto sugere. Ele fala sobre a banalização do sofrimento e da violência, e como isso afeta a mente das pessoas. Em dado momento da história, o reverendo acha melhor que uma serpente pique um soldado do que salvá-lo. Assim, a morte do jovem seria mais rápida e ele não precisaria sofrer por tantas horas até finalmente morrer, no amanhecer do dia seguinte. É possível ver aqui uma crítica do autor à própria ação americana na guerra, mostrando o lado dos que estavam naquele território, sofrendo e causando todo tipo de males, sem esperança alguma de que aquilo acabasse logo.

A única esperança aqui é a religiosa, mas mesmo esta parece afetada pela depressão na qual o reverendo mergulha, chegando a um certo estado niilista, na reta final do conto, para depois, em um episódio traumático, aventurar-se num processo de resgate que acaba trazendo a reflexão final. Embora a gente consiga entender o que o reverendo quis dizer (é a mesma coisa sobre a piadinha de “não existir ateus quando o avião está caindo“), falta um maior suporte para que essa frase faça sentido real na história. É uma observação profunda e espirituosa, mas que acaba não se conectando bem ao que foi trabalhado no enredo — se pelo menos um soldado ateu tivesse sido introduzido antes… mas infelizmente isso não aconteceu. O que deixa o encerramento com um sabor um tantinho estranho, mesmo que não seja ruim.

Blood Splatters Quickly: The Collected Stories — (Estados Unidos, novembro de 2014)
No Brasil: Contos & Delírios (DarkSide Books, 2022)
Publicação original: No Atheists in the Grave, 1971
Autor: Edward D. Wood Jr. (Ed Wood)
Tradução: Carlos Primati
Ilustrações: Laerte
10 páginas

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