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Crítica | Revólver (2005)

por Kevin Rick
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Criar uma identidade fílmica poderosa o bastante para que até mesmo os menos aficionados em Cinema identifiquem a mão criativa por trás da película é uma tarefa árdua. O maior exemplo atual, talvez, é nosso querido Wes Anderson. Também temos Quentin Tarantino, Christopher Nolan, entre outros cineastas com uma individualidade cinemática tão forte que ao iniciarmos suas obras já existe uma certa expectativa por escolhas visuais e/ou narrativas. Guy Ritchie faz parte desse seleto grupo, mantendo uma assinatura pessoal única, carregada de humor negro britânico, em seus vários filmes de crime e gângster. Até mesmo obras de grandes estúdios como Rei Arthur: A Lenda da Espada e a franquia Sherlock Holmes contêm traços clássicos do diretor de Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes. Após o sucesso de seu filme de estreia, seguido por Snatch: Porcos e Diamantes, o cineasta fez a maior burrada de sua carreira ao lançar Destino Insólito. A fita, feita juntamente com sua então esposa Madonna, atualmente é considerado um dos piores filmes do século. Após a massiva recepção negativa, Guy retornaria a ares conhecidos com Revólver, regressando ao gênero criminoso que elevou sua carreira, retomando sua parceria com Jason Statham.

Infelizmente, o filme fica aquém das duas divertidíssimas obras iniciais de sua filmografia, constituindo uma narrativa que sequer parece um trabalho de Guy. E não há problema na construção de um estilo destoante dos anteriores, muito pelo contrário, a tentativa de criar algo completamente diferente merece louvor. A questão é a aparente negação de pessoalidade do diretor, numa tentativa frustrada de aparentar ser um cineasta “sério”. A história de Revólver gira em torno de Jake (Jason Statham), um cara durão que aprendeu uma técnica infalível de trapaça chamada “A Fórmula” enquanto estava em confinamento solitário entre dois prisioneiros gênios invisíveis, que renegaram a promessa de libertar Jake. Quando ele sai da prisão, ele entra em conflito com um senhor do crime chamado Macha (Ray Liotta), que é estúpido demais para ser assustador, mas existem outros personagens mais duros, incluindo um assassino implacável (Mark Strong) e dois estranhos misteriosos (André 3000 e Vincent Pastore). Esse último par convence Jake de que ele tem alguns dias de vida e que suas horas finais devem ser gastas dando a eles todo seu dinheiro e trabalhando em sua operação de agiotagem, em troca de uma possível cura.

A premissa parece ter saído de um roteiro dos sonhos de qualquer fã de Ritchie. O princípio absurdo, o elenco extravagante, os vários núcleos convergindo, entre outras convenções do diretor. Entretanto, a execução é completamente dessemelhante, e de forma bastante negativa, com o diálogo cômico e irreverente saindo de cena, dando lugar a vazios filosóficos, contando com passagens de Júlio César e Nicolau Maquiavel, esforçando um pobre debate sobre as questões intrínsecas da mente humana. A trama não é tão desafiadora intelectualmente quanto é confusa, e ainda assim a grande reviravolta é completamente telegrafada. Ritchie criou um filme que é paternalmente óbvio em um minuto e impenetrável logo em seguida.

Se o fracassado ensaio psicanalista do diretor não é o bastante, Guy decide adentrar numa vertente onírica para o psicológico quebrado de Jake, misturando a realidade e fantasia nos pensamentos do protagonista, em uma novamente falha investida sobre as adversidades da psique humana. Ele também tenta expor isso em uma bizarra sequência animada que, ironicamente, é bastante divertida. Dentro dessa linguagem fílmica surreal, a metáfora norteadora da narrativa é o xadrez, um jogo que o filme quer incorporar em uma grande ideia sobre identidade, metafísica e manipulação. Ritchie está procurando um enigma para costurar sua narrativa filosófica, mas oferece uma bagunça indecifrável, contando até com entrevistas de pensadores e psicólogos no final, empenhando-se na demonstração que a obra é um estudo da mente criminosa.

Revólver é o experimento falho de Guy Ritchie na criação de um filme psicologicamente instigante, negando qualquer traço original de seus trabalhos anteriores. A linguagem díspar usada pelo cineasta merece elogio apenas pela premissa tentadora, a vontade de conceber uma fita que brinca com as expectativas dos fãs e pelos divertidos personagens – Mark Strong é incrível como o hitman sensível e tímido. Revólver não é um filme ruim por ser distinto da filmografia de Guy, ele apenas é ruim. No entanto, o fato de ser um gênero que Guy tem uma voz tão reconhecível torna a experiência ainda pior.

Revólver (Revolver) — Reino Unido, França, 2005
Direção: Guy Ritchie
Roteiro: Guy Ritchie, Luc Besson
Elenco: Jason Statham, Ray Liotta, André 3000, Vincent Pastore, Terence Maynard, Andrew Howard, Mark Strong, Francesca Annis, Mem Ferda, Anjela Lauren Smith, Tom Wu, George Sweeney, Elana Binysh, Stephen Walters
Duração: 111 min.

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