Baseado nos eventos reais da diretora/roteirista britânica Nazrin Choudhury, o curta-metragem Red, White and Blue conta uma história impactante e importante. Substituindo o Reino Unido por um EUA rural no estado de Arkansas (escolha intencional para levantar algumas cutucadas), a cineasta Choudhury extrai de suas próprias experiências uma trama que envolve estupro e aborto, especificamente em uma região que a interrupção da gestação é proibida, no que é possivelmente um dos temas mais complexos e debatidos na sociedade moderna.
Brittany Snow estrela a produção como uma mãe solteira em busca de uma clínica de aborto, em uma narrativa que começa de maneira sensível e sutil, ainda que extremamente objetiva sobre seu tópico principal. A cineasta lida muito bem com o silêncio de suas cenas, de um abuso calado, um sofrimento profundo e o desespero para encontrar uma saída em meio aos olhos lacrimejantes de Snow, que entrega uma ótima atuação comedida. Em alguns momentos, Choudhury quase cai em um tom moroso ou claudicante, mas existe uma construção bonita e humana sobre a personagem e seus filhos, incluindo alguns momentos de ternura familiar.
À medida que a trama avança, podemos notar que a narrativa simples de Choudhury não ganha muitos impulsos dramáticos, até priorizando uma abordagem suave em algumas interações da mãe e sua filha, mas existe um reviravolta que começamos a suspeitar a partir de uma determinada escolha da personagem, ao passo que torcemos para que não se concretize. Não quero dar spoilers, mas a virada envolve um estupro, algo que muda completamente a trajetória do curta-metragem.
A partir dessa descoberta, Red, White and Blue deixa de ser algo sensível para se tornar chocante. Não sei se gosto muito disso, porque a obra acaba se tornando mais sobre a mensagem do que sobre a maneira de passar a mensagem, se conseguem me entender. Penso que o drama acaba ficando de lado para abrir caminho para reações impactantes da audiência, incluindo um flashback que me soou desnecessário. É até um pouco difícil criticar uma situação que me parece tão real e pessoal para a diretora, inclusive na forma que ela enquadra o comportamento das vítimas e as atitudes das pessoas que lhes ajudam (sempre mulheres, em um detalhe feminino da obra), mas de um ponto de vista narrativo e dramatúrgico, não consigo sacudir a sensação de que a diretora perde a delicadeza que ecoa com mais qualidade do que o choque.
Ainda assim, Red, White and Blue é desconfortável, tanto para aqueles que têm opiniões contrárias ao discurso da produção quanto para quem tem um mínimo de compaixão e empatia pelo próximo. Às vezes é complicado fazer a separação entre um tópico importante e a forma como esse tópico é desenvolvido em um filme (muita gente não entende a diferença), então de maneira geral penso que a obra é apenas razoável na abordagem de seus temas, mas é definitivamente um trabalho genuíno e trágico, com uma intenção muito forte de passar uma mensagem para reflexão de seu público. No fim, o amor prevalece com suas cicatrizes.
Red, White and Blue — EUA, 2023
Direção: Nazrin Choudhury
Roteiro: Nazrin Choudhury
Elenco: Brittany Snow, Juliet Donenfeld, Redding Munsell
Duração: 24 min.