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Crítica | Recém Chegada

Uma jornada de autoconhecimento boba como entretenimento, mas com valiosas lições de Administração.

por Leonardo Campos
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Uma narrativa sobre transformação humana e reorganização na pavimentação de jornadas. Se Recém Chegada é um poço de clichês no sentido entretenimento, funciona como aquelas reflexões para debater recursos humanos, dentre outras teorias administrativas, algo que o torna ao menos útil para se manter como tema de reflexão nas densas malhas dos textos analíticos na internet. Lançado em 2009, a produção dirigida por Jonas Elmer e escrita pela dupla de roteiristas formada por C. Jay Kox e Jen Rance traz a atriz Renée Zellweger como a ambiciosa executiva Lucy Hill, uma mulher no mundo dos tubarões corporativos, interessada em se manter no cargo que ocupa e alcançar a desejável promoção. Diante disso, a premissa é básica: ao ser convocada para sair de Miami e visitar as instalações de uma fábrica em Minnesota, o posto do espaço cultural onde atua, ela enfrentará uma extensa caminhada de desafios, redescobrindo a si mesma, além de encontrar o amor, por meio da figura de Ted Mitchell (Harry Connick Jr.), o representante do sindicato dos trabalhadores.

Inicialmente, o contato entre ambos é odioso, dominado pela antipatia, mas, como estamos diante de uma comédia romântica, os laços entre a dupla se fortalecerão ao passo que a narrativa de 97 minutos avança. O amor, então, fica no ar, contaminando a todos. Mas seria leviano dizer que o filme é apenas isso. Produzido numa era posterior ao advento de O Diabo Veste Prada, um clássico sobre liderança autocrática e comportamento organizacional, Recém Chegada reflete de longe, sem a mesma genialidade, os aspectos de uma executiva que não se preocupa com o bem-estar de nenhum de seus liderados. A sua missão única e exclusiva é manter os negócios em equilíbrio e fazer o capital girar como as grandes corporações precisam. Supervisionar a fábrica e reestrutura a linha de produtos é a grande chance de avanço no plano de carreira.

Os desafios, neste processo, são exorbitantes. E a equipe técnica da narrativa consegue desenvolver tudo isso com eficiência. A direção de fotografia de Chris Seager capta o clima gélido implacável, o oposto das ensolaradas manhãs de Miami onde fica a sede da empresa que Lucy trabalha. Essa mudança de clima muda não apenas as questões físicas do cotidiano de trabalho da executiva, mas também a sua relação com todas as situações. Além do clima geográfico, temos um clima organizacional diferente. Com sua postura arrogante, Lucy acredita piamente que a mão pesada de uma liderança autocrática resolverá todas as coisas, mas com o tempo, percebe que o desenvolvimento da empatia ajudará na recomposição das demandas e, consequentemente, no alcance de suas metas.

Quem mais sofre com os impactos da antipatia de Lucy Hill é a secretária Blanche Gunderson (Siobhan Fallon). As suas distrações, tentativa de amizade e outros laços de humanidade no ambiente de trabalho são repelidos por sua chefe constantemente, tendo em vista evitar perda do foco em relação ao que almeja realizar nas instalações.  No entanto, a dureza de Hill precisa encontrar uma alternativa para conquistar Stu Kopenhafer (J. K. Simmons), um homem admirado pelos colaboradores da fábrica, um formador de opinião local que diante de sua experiência, sabe como manipular as situações para conquistar o apego de todos e dificultar o trabalho da executiva que representa, para os humanos ali presentes, uma forte ameaça na empregabilidade.

As pessoas daquele lugar trabalham num ritmo diferente. Há responsabilidades, mas as urgências ao estilo das grandes metrópoles não cabem naquele espaço. Os envolvidos misturam assuntos pessoais com negócios, se relacionam fora do ambiente de trabalho como membros de um conglomerado familiar, algo que incomoda Lucy, focada apenas na modernização dos processos para conseguir atender aos objetivos da corporação. Aos poucos, por sua vez, ela ganha o time. Os resultados começam a surgir quando ela compreende as regras sociais que ditam aquele ambiente. Forma, assim, um time mais motivado ao tentar se adaptar melhor culturalmente. Ao buscar entender o outro de forma mais sincera, a personagem encontra as soluções que precisa para fazer com que as coisas aconteçam como o planejado.

Tudo isso, envolto em múltiplas situações cômicas. De volta aos elementos estruturais em Recém Chegada, a trilha sonora de John Swihart entra como colaborativa para as situações mais inusitadas envolvendo os choques culturais entre Lucy e os operários da fábrica. Traz uma mescla de country em dissonância com os estilos musicais das poucas cenas de ação da protagonista em suas passagens por Miami. Dan Davis, responsável pelo design de produção, deixou os espaços devidamente concebidos para que pudéssemos mergulhar na jornada de Lucy, também em contraste no quesito espacial, mobiliário, etc. As cenas no ambiente da fábrica são convincentes e ajudam na imersão necessária solicitada pelo roteiro frágil, mas não ofensivo dramaticamente. Nem de longe uma obra-prima estética, mas funciona dentro de sua proposta.

Ademais, Recém Chegada também traz algumas reflexões sobre o velho embate entre homens e mulheres nas dinâmicas corporativas. As pressões em torno de Lucy são maiores, por ser uma mulher e precisar mostrar a competência de uma maneira mais agressiva. É uma obviedade, sabemos, e o filme não trabalha bem esta perspectiva, deixando apenas que nós, do lado de cá, façamos essas conexões. Dentre outras lições, a narrativa flerta com a violação de direitos de criação de um produto, fala sobre projetos e processos criativos, aponta o quão importante é lançar mão de conhecimentos básicos e investir em pesquisas de mercado quando o assunto é um produto vinculado ao gosto do consumidor, dialogando também com verificação de máquinas e equipamentos, fluxo de caixa, adequação de layout, análise de riscos na confecção de um produto, dentre outros pontos necessários para a dinâmica de qualquer um envolto no âmbito da administração. No filme, adaptação, conflitos, cultura organizacional, impacto cultural e inovação são algumas de suas principais palavras-chave.

Recém Chegada (New In Town, Estados Unidos – 2009)
Direção: Jonas Elmer
Roteiro: C. Jay Cox, Ken Rance
Elenco: Renée Zellweger, Harry Connick Jr., Siobhan Fallon, J. K. Simmons, Mike O’Brien, Frances Conroy, Nancy Drake, Ferron Guerreiro
Duração: 97 min.

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