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Crítica | Rebel Moon – Parte 1: A Menina do Fogo

Atravessando a galáxia em câmera lenta.

por Kevin Rick
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Eu sei o que isso parece. Um subtítulo brincando com o principal cacoete de Zack Snyder e uma nota que abre o texto com um sentimento negativo. Mas se acalmem, não comecei Rebel Moon – Parte 1: A Menina do Fogo com falsas expectativas. Desde que a produção foi anunciada como a reformulação do projeto que Snyder tinha para um novo filme de Star Wars, estava perfeitamente ciente da produção pastiche de George Lucas, narrativamente derivativa de tudo que conhecemos sobre óperas espaciais e visualmente excessiva de slow-motions que o cineasta criaria para seus cultistas chamarem de obra-prima artística. Eu também sabia que a Netflix iria descarregar seus caminhões de dinheiro para que Snyder mergulhasse na sua autoindulgência refém das opiniões dos seus “fãs” que adoram a falta de substância visualmente inflada que é a segunda metade da sua carreira.

É justamente por saber de tudo isso que entrei nessa experiência banhada de câmera lenta com a boa vontade de quem gostaria de se divertir com um blockbuster genérico e, para bem ou para mal, um filme de ação sci-fi excessivamente estilizado. Inclusive, me diverti horrores este ano com produções como Dungeons & Dragons: Honra Entre Rebeldes e Resistência, dois longas de alto orçamento que demonstram como tornar clichês deliciosamente bacanas nessas obras de pipocão para o grande público. O próprio Snyder teve sucesso em filmes dessa ordem com abordagens até provocativas com sua violência extrema e fascínio pelo espetáculo. Talvez, só talvez, Rebel Moon fosse a ópera espacial divertidamente descerebrada que todos queríamos, não é mesmo?

É, não exatamente. Chamar esse filme de genérico é óbvio; é praticamente uma crítica preguiçosa. Quero dizer, temos um império do mal inspirado em fascistas, vilões caricatos, heróis improváveis, uma narrativa ordinária de team-up que prepara uma sequência e por aí vai. Nem penso que vale a pena esmiuçar os detalhes da história, porque não existe nada remotamente interessante sobre a mitologia deste universo para perdermos nosso tempo. Afinal, quando sua história gira em torno de insurgentes marginalizados se juntando para derrotar soldados que querem estuprar uma camponesa, não há muito espaço para construção de mundo, profundidade narrativa ou latitude dramática, ou nem mesmo de um entretenimento divertido com humor perverso para quem quiser afirmar que estou cobrando demais do filme.

A questão é, ser genérico era esperado, até desejado para uma produção de massa. O problema maior é ser clichê sem ser charmoso. Para mim, Rebel Moon – Parte 1: A Menina do Fogo é um desastre justamente por sua falta de personalidade, não só com seu universo, mas principalmente com seus personagens. A nossa protagonista Kora (Sofia Boutella), por exemplo, começa e termina o filme sem deixar uma impressão positiva, meio que sempre à espreita em sua indiferença para a audiência, algo carregado para todos os coadjuvantes que gradualmente embarcam na aventura. Terminamos o longa sem nos afeiçoarmos por esses personagens não só dramaticamente superficiais, mas sem características simples que os tornem mais cativantes ou peculiares, sejam como indivíduos ou como uma equipe. Snyder tem claramente uma ideia de team-up no primeiro ato de sua saga espacial, o que torna a falta de química e de interação entre o elenco um problema central da narrativa.

Até que os visuais são legais e existe um esforço do cineasta em tornar suas introduções singulares (particularmente, gosto do bloco contra a mulher-aranha), mas os personagens são vazios demais nesse falso senso de seriedade e de melancolia que Snyder tenta criar em seus diálogos e backstories. A pífia construção dramática para a traição de um dos membros evidencia muito claramente como não ligamos para esse grupo e como há pouca, para não dizer zero evolução de confiança ou de amizade entre o elenco para sentirmos algum tipo de impacto narrativo ou de tensão no ato final, o que fica ainda pior quando Snyder enquadra um dos heróis nesses shots de câmera lenta no seu sacrifício final, como se importássemos com sua morte.

Honestamente, tudo visualmente na produção chega a ser brega e risível, não de uma forma autoconsciente, mas nos excessos de Snyder que tornam seu estilo de ação quase uma autoparódia. Boutella, novamente como exemplo aqui, é uma intérprete conhecida por seus contorcionismos, algo que o cineasta descarta absolutamente para repetir cansativamente seus slow-motions que gradualmente tornam o filme sem movimentação e bem entediante. Numa tentativa de maximizar todas as cenas, Snyder faz uma autossabotagem com sua produção que nada tem de épico em set-pieces sem imaginação e repetitivas, e que, mesmo em seus designs de alto orçamento, soam sem vida, sem graça e sem animação na sua duração inchada de mais de duas horas.

Cobrar originalidade de Rebel Moon – Parte 1: A Menina do Fogo é desilusão, só que a produção não falha apenas por ser genérica, mas por ser o produto de um cineasta que quer tanto ser autoral que acaba entregando um filme sem personalidade. A cada cena de ação, Snyder parece querer trazer a atenção para a sua câmera, quase dialogando com seus fãs fanáticos num frenesi de fan service, se esquecendo do coração do seu filme: seus personagens; que são esquecíveis num lamaçal narrativo desinteressado em drama, tensão, mitologia ou humor. Quando chegamos ao final, é difícil de entender a intenção do filme em seu team-up. Sim, sabemos que esses são os párias que precisam derrotar o império do mal, mas o que eles são além disso? No máximo, figuras de uma experiência cinematográfica cansativa.

Rebel Moon – Parte 1: A Menina do Fogo (Rebel Moon – Part One: A Child of Fire – EUA, 2023)
Direção: Zack Snyder
Roteiro: Zack Snyder, Kurt Johnstad, Shay Hatten
Elenco: Sofia Boutella, Djimon Hounsou, Ed Skrein, Michiel Huisman, Bae Doona, Ray Fisher, Charlie Hunnam, Anthony Hopkins, Dustin Ceithamer, Staz Nair, Fra Fee, Cleopatra Coleman, Stuart Martin, Ingvar Sigurdsson, Alfonso Herrera, Cary Elwes, Rhian Rees, Elise Duffy, Jena Malone, Sky Yang, Charlotte Maggi, Corey Stoll, Stella Grace Fitzgerald, Greg Kriek, Brandon Auret, Ray Porter, Dominic Burgess, Tony Amendola, Derek Mears
Duração: 134 min.

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