Home TVMinisséries Crítica | Quem é você, Alaska? (2019)

Crítica | Quem é você, Alaska? (2019)

A busca por uma saída, a busca por um talvez.

por Felipe Oliveira
1,K views

Pode não ser um efeito tão raro quanto se parece, mas quando lançada em 2019, a adaptação do primeiro livro de John Green, Quem é você, Alaska?, conseguiu ser um desses casos em que se supera o romance original ao elevar a sensibilidade das páginas de lidar com temas universais além do público-alvo. A minissérie criada por Josh Schwartz teve a sorte de trazer para as telinhas mais uma atração teen que atrai a audiência, porém, com efeito de ser uma concepção cativante e marcante, quase atípica pela densidade ao gênero que se propõe. E esse sentimento também é dos frutos que acompanhava os leitores que conheceram a escrita de Green, que para sua obra de estreia, chegava com uma abordagem segura e uma história acolhedora para o público juvenil.

Com a adaptação de Cidades de Papel, parecia que os estúdios estavam explorando de maneira precoce as publicações do tio verde depois de A Culpa é das Estrelas, contudo, com Looking for Alaska, foi notável um cuidado para dar vida ao conflitante mundo da personagem título e os dilemas existenciais. Conhecido por séries como The O.C – Um Estranho no Paraíso e Gossip Girl, é interessante a identidade concebida por Schwartz ao desenvolver a minissérie para o Hulu. Pensando nas produções para o ano que o livro se passa, 2005, enquanto American Pie e as tramas derivadas da comédia erótica adolescente estavam no auge, a série limitada seria como os dramas românticos de Gilmore Girls e One Tree Hill, encapsulando um coming of age independente, no entanto, evitando o melodrama comum ao gênero e injetando reflexões mais densas, filosóficas sobre a vida, o lugar de pertencimento, algo característico da escrita de Green.

A composição desse universo atingiu uma nostalgia distinta, individual, ao saber que bebia dos tropos do gênero, e ainda assim, tendo um resultado único que injetava os arquétipos da cultura pop, os besteiróis americanos, mas com a própria receita, fazendo do colégio interno de Culver Creek, o cenário particular para contar esse drama pungente. E essa particularidade que torna a minissérie especial ao tratar todas as suas escolhas, genéricas como um ato singular. De toda forma, Quem é Você, Alaska? é mais uma história que versa sobre a fase de amadurecimento, não da transição para a vida adulta, e sim dos questionamentos, do não-pertencimento, da desesperança, da busca por um propósito. E isso é bem resumido entre os dois personagens centrais, Alaska, ao pegar a frase de um dos seus livros favoritos (de Gabriel García Márquez) e traçar uma reflexão para seu estado: “como vou sair desse labirinto?”, de sofrimento, de inconstância, de “culpa”; depois, Miles, fascinado pelas últimas palavras de inúmeras figuras e principalmente a do escritor François Rabelais, que “ia em busca de um grande talvez”, o que se torna seu mantra para se autoconfrontar e experimentar coisas novas.

Essas características fazem parte da receita própria, do estilo Green ao fazer de falas de escritores, filósofos e poetas um recorte existencial como fosse a letra de um rock melancólico. Claro que o encontro desses dois personagens é embalado no típico romance, e nesse caso, também acompanhado da obsessão de Miles por Alaska, porém, mesmo utilizando dos elementos-base para a história, há toda uma estrutura entre esse protagonismo que converge para uma representação e maneira da série trazer reflexões. A diferença na “busca por um grande talvez” e “do sair de um labirinto de angústia constante” é dispensada quando isso se torna ponte para outras discussões e questionamentos como o luto, a perda, a vida, a morte, o existencialismo, e isso cresce ainda mais na forma que Schwartz consegue trazer uma abordagem delicada sem soar banal, e mantendo na trama o mesmo símbolo acolhedor e honesto com que Green evocava na sua escrita.

Há muitos trechos que não só mantém alguns arcos fiéis ao livro como também suas falas – tomando o cuidado de não ser só ser uma reprodução de efeito -, porém, é louvável como Schwartz conseguiu expandir muitos aspectos do romance e tornar isso mais relacionável na minissérie. Um claro exemplo disso é a própria Alaska, que ao contrário do que se sugere no livro ficava apagada no meio da narrativa além da personalidade que a deixava na sombra de uma manic pixie dream girl, mas aqui, o título ganha forma ao telespectador se sentir atraído em entender a personagem interpretada com intensidade por Kristine Froseth. E junto a ela, a série somava seus momentos comoventes com o melhor amigo de Alaska, Coronel e a grande performance de Denny Love. É ótimo como o personagem teve mais espaço além do efeito cômico, o que entra também o conflito de não pertencimento, os preconceitos raciais e sociais e a sua visão sobre fé, sendo este último um acréscimo e expansão para o recluso dr. Hyde (Rin Cephas Jones).

Doce, apaixonante e encantadoramente triste, Quem é Você Alaska? é muitas vezes típica e inocente, e mostra de maneira honesta e fascinante os questionamentos que mais nos assombram.  

Quem é Você, Alaska? (Looking for Alaska – EUA, 18 de outubro de 2019)
Criação: Josh Schwartz (baseado em romance de John Green)
Roteiro: Josh Schwartz, Warren Hsu Leonard, Stephanie Savage, Ashley Wigfield, Leila Gerstein, Kirk. A Moore
Direção: Josh Schwartz, Clea DuVall, Rachel Lee Goldenberg, Rashaad Ernesto Green, Megan Griffiths, Brett Haley, Ami Canaan Mann, Sarah Adina Smith
Elenco: Charlie Plummer, Kristine Froseth, Denny Love, Jay Lee, Sofia Vassilieva, Landry Bender, Timothy Simons, Deneen Tyler, Henrique Zaga, Uriah Shelton, Jordan Connor
Duração: 370 min (oito episódios)

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais