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Crítica | Quatro Moscas Sobre Veludo Cinza

por Luiz Santiago
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Finalizando a Trilogia dos BichosQuatro Moscas Sobre Veludo Cinza (1971) conta a história de Roberto Tobias (Michael Brandon) baterista de um grupo de rock que está sendo perseguido por um misterioso homem de óculos escuros, chapéu e bigode; alguém que certa noite ele persegue até um teatro vazio e age de uma forma tal (sendo fotografado durante toda a ação) que dá início a algo ainda maior. Inicia-se uma sequência de mortes ao seu redor e uma perseguição que aos poucos vai fazendo com que ele fique paranoico e temendo pela própria vida. Alguém está querendo vê-lo definhar psicologicamente até a morte.

Diferente de O Gato de Nove Caudas, 4 Moscas trabalha de maneira bastante aceitável o envolvimento do assassino com o protagonista, não caindo na frustração final de a revelação parecer nula aos olhos do espectador, já que o filme não foi construído para focar no processo de assassinatos e sim na identidade e particularidade de ações do assassino. Ciente desse processo, Dario Argento não só coescreveu, mas também mostrou, através de sua caprichada direção, a ação cada vez mais doentia do criminoso e o impacto psicológico que as mortes vão tendo na vida de Roberto, que tenta seguir normalmente com sua vida. Mas está claro para ele e para o espectador que isto não será possível.

Nos primeiros quinze minutos de filme temos um grandioso circo armado, com o tema psicológico e de ação levantado e uma linha musical macabra composta por Morricone para marcar pontos específicos da obra, funcionando como prenúncio e reafirmação, dependendo do contexto em que aparece. No primeiro ato da fita, o deleite visual do leitor mais a expectativa diante dos esperados ataques do criminoso têm o seu melhor momento. A linha rítmica não deixa de brincar com o fato de Roberto ser o baterista de uma banda e o que vemos são inteligentes saltos da montagem para um momento importante de revelação, um truque de fundir o caminho percorrido até um determinado lugar com a presença futura do indivíduo naquele espaço. Não é uma técnica que funcionaria com essa força em nenhum outro gênero, mas no giallo, faz sentido e é bem-vinda.

Um lamento em relação à montagem e também à edição de som do filme é que de um lado temos excelentes aplicações de técnicas e estrutura que se saem muito bem em uma porção de cenas, mas em outras ocasiões, o que temos é a dificuldade de entender o por quê daquilo ter entrado no corte final. Em relação ao som, notem as terríveis cenas com o carteiro (não gosto de nenhuma, e acho a comédia ali destoante do filme) e a cena da morte de uma certa prima… Já em relação à montagem, nada supera as insanas elipses que temos na sequência do Parque, onde vemos pessoas desaparecerem num passe de mágica (o mesmo acontece na cena do metrô, com o detetive gay que investigava o caso) e o dia se transformar em noite sob o mesmo padrão. O maravilhamento que tivemos com bons truques elípticos na primeira parte, recebe, nesse caso em particular, o seu pior uso do filme, em uma cena que tem uma forte dose de tensão, tem uma perseguição bem dirigida, mas a condução do tempo nesse ambiente ameaçador simplesmente não funciona.

Michael Brandon é outro caso paradoxal aqui. Ele se expressa pouco, até mesmo para demonstrar um pouco mais de “loucura”, que é o que esperávamos de alguém numa banda de rock. É possível compreender sua posição, pois todo o desenvolvimento do filme se dá depois que o grande motivo para o seu tormento é concluído, no teatro. Mas com o passar do tempo, o que vemos é uma expressão cansada, séria, quase blasé por parte dele. Uma atuação anti-natural que devo dizer que funciona para o propósito exclusivo desse estranho personagem, mas certamente é algo que trocaríamos facilmente por uma presença mais intensa do ator em cena. Do restante do elenco, os únicos sólidos destaques vão para Jean-Pierre Marielle como o detetive do caso; e Bud Spencer, como uma espécie de conselheiro que faz pouco, fala pouco, mas demanda imediata atenção do espectador para o seu personagem.

E então chegamos ao final, para mais uma decepção. Dessa vez, porém, não diante da revelação do assassino. A identidade, aliás, é bastante satisfatória. O problema está na justificativa e no apelo moral que o texto traz na cena final. A questão psicológica é praticamente inseparável desse tipo de argumento, especialmente em um com homenagem tão dramática a Hitchcock. Ocorre que para uma teoria ser relevante para um filme e ter o esperado impacto dramático, ela precisa ser exposta de maneira clara, de modo ao público entender não apenas o aprofundamento da questão, mas a sua real consequência na vida de uma pessoa. Aqui, temos apenas partes dessas duas coisas bem colocadas na tela. E mais do que qualquer outra parte problemática do filme, isso acaba derrubando um tanto do que deveria ser um ótimo resultado final.

Quatro Moscas Sobre Veludo Cinza (4 mosche di velluto grigio / Four Flies on Grey Velvet) — Itália, França, 1971
Direção: Dario Argento
Roteiro: Dario Argento, Luigi Cozzi, Mario Foglietti
Elenco: Michael Brandon, Mimsy Farmer, Jean-Pierre Marielle, Aldo Bufi Landi, Calisto Calisti, Marisa Fabbri, Oreste Lionello, Fabrizio Moroni, Corrado Olmi, Stefano Satta Flores, Laura Troschel, Francine Racette, Bud Spencer, Dante Cleri, Guerrino Crivello
Duração: 104 min.

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