No mais curto episódio dessa tardia segunda metade da 1ª temporada de Primal, Genndy Tartakovsky retorna à forma e consegue alcançar o equilíbrio exato entre o lado sobrenatural que ele insiste em inserir em sua série e o realista que é o coração e o grande atrativo de seu trabalho. De certa forma, The Night Feeder é a versão mais redonda e assustadora do recente Plague of Madness em que Spear e Fang fogem desesperadamente de um argentinossauro zumbi.
Bebendo da escola Evil Dead de transformar movimento de câmera com trilha sonora evocativa em ameaça demoníaca pela floresta, Tartakovsky estabelece, da maneira mais violenta possível, a existência de uma criatura poderosíssima que, como o título bem indica, só sai para alimentar-se à noite. O espectador não a vê quase até o final, mas é justamente esse o charme do episódio, algo amplificado por outros animais pré-históricos sendo trucidados a cada noite que passa. Paralelamente, acompanhamos os protagonistas ouvindo o literal show de horrores à distância, com o terror de Spear e Fang crescendo a cada novo rugido ou guincho de morte de outras criaturas.
A consciência pelos personagens de que há uma ameaça “invisível” que cada vez mais chega perto deles é muito bem utilizada no episódio, como quando a dupla simplesmente levanta a cabeça para ouvir o que está acontecendo, permanecendo “congelados” por diversos segundos. O mesmo efeito acontece com o desespero de Fang de impedir que Spear investigue o que está acontecendo ou mesmo veja de perto as vítimas do monstro. De todos os capítulos de Primal até agora, The Night Feeder é o primeiro de puro horror daqueles de fazer o coração bater mais forte no peito, acompanhando os suores no rosto assustado de Spear ou os olhos atentos de Fang a cada novo som das profundezas da floresta.
Por um momento, achei que pela primeira vez teríamos um episódio duplo na temporada, já que Tartakovsky leva o mistério até seus minutos finais em um episódio dois minutos mais curto do que o tamanho regulamentar, mas não é isso o que acontece e o padrão é mantido, com histórias autocontidas a cada nova aventura. Essa escolha do criador da série é inteligente e permite muita variedade narrativa e muita experimentação, algo que parece ser a palavra de ordem desta interessantíssima segunda metade de temporada começando com Scent of Prey que retira Fang da equação e culminando – até agora, pelo menos – com um episódio que mantém seu vilão escondido por quase toda a duração.
Outra aposta diferente de Tartakovsky é na resolução do problema enfrentado por Spear e Fang. Ela não só é simples e, em retrospecto, óbvia, como acontece em literais segundos com uma sagaz troca de ponto-de-vista que merece todos os elogios. É tudo realmente muito rápido, mal dando tempo do cérebro fazer os ajustes necessários, mas o resultado é para lá de original e muito bem executado, de certa forma até sendo uma pena justamente por ele ser tão rápido, ainda que, ironicamente, seja a rapidez que o torne tão bom.
The Night Feeder, depois da escorregadela em Coven of the Damned, é mais outro triunfo da série, ficando ali lado-a-lado com A Cold Death e River of Snakes. Faltando apenas mais um episódio para o fim da temporada e o começo de provavelmente mais um longo hiato, Primal firma-se como uma das melhores séries animadas dos últimos anos justamente por conseguir fazer tanto com tão pouco sem precisar recorrer a tramas complexas, cheias de referências ou repletas de bobagens nerds. Não há nada como o cheiro de vísceras e sangue pré-históricos pela manhã!
Primal – 1X09: The Night Feeder (EUA – 25 de outubro de 2020)
Criação: Genndy Tartakovsky
Direção: Genndy Tartakovsky
Roteiro: Genndy Tartakovsky
Elenco: Aaron LaPlante
Duração: 20 min.