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Crítica | Pretty Little Liars: Um Novo Pecado – 1ª Temporada

O slasher não redime a mesmice.

por Felipe Oliveira
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É um efeito raro quando uma sequência supera o original, porém, na pauta aqui, é a terceira série spin-off de Pretty Little Liars, agora como um reboot que se passa numa nova cidade e ainda se conecta com a série mãe. A empreitada não se configura como uma requel, mas quando anunciada em 2020, os criadores Roberto Aguirre-Sacasa e Lindsay Cahloon Bring estavam atentos a tendência das sequências legados em Hollywood, ainda mais quando o retorno de Jamie Lee Curtis em 2018 na franquia Halloween e a confirmação de um quinto capítulo de Pânico com um trio principal presente fez o subgênero slasher parecer modinha com sagas tão categóricas ressurgindo em um momento que as apostas em filmes independentes tinham marcado o nicho após a fase de remakes. Então, Pretty Little Liars: Um Novo Pecado chegou sabendo muito bem como se encaixar nesse forro, aproveitando pela primeira vez a predisposição pro terror que a história inspirada nos livros de Sara Shepard evocava e assim também mantendo a base de fãs interessada. As Maldosas e “A” estão de volta, e não é como se ter um pouco de slasher faz tudo valer a pena, mas mostra que ter esse foco faz muita diferença.

Pavimentando a estrutura slasher que se popularizou na década de 80, de uma figura do passado buscando vingança, a trama aqui se passa intercalando duas frentes: 22 anos antes (1999) e a linha presente (2021). É curioso que mesmo tendo o período atual com maior ênfase, Sacasa e Bring moldaram uma composição estética que sempre remete a ambientação de Original Sin a filmes do subgênero na fase oitentista e pós-Pânico. De qualquer forma, se não se colocasse como uma extensão precoce da novela que é PLL, esse reboot poderia ter outro nome que ainda ressoaria como um amontado de plots e subplots de séries adolescentes com uma pegada slasher.

Afinal, se pararmos para pensar, não há tantos exemplos na TV de séries que souberam malhar tão bem a narrativa do terror com um assassino mascarado. De longe, Harper’ s Island: O Mistério da Ilha é o melhor exemplo da categoria, já que a antológica Slasher se desenvolve por um conceito exagerado e pretensioso que nunca consegue satisfazer. A versão televisiva de Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado mas se resume pela jogada de marketing descarada do que um adendo à categoria, porque de tudo que ela fez com sua mitologia broxante que nada dizia, foi não ser slasher. Desse modo, o que Um Novo Pecado faz é o que Scream TV Series não conseguiu no mínimo por três temporadas: usar a narrativa slasher para movimentar a trama.

Ao menos nisso Original Sin tem mérito por se inspirar naquele que se popularizou como o primeiro no subgênero depois da influência de O Massacre da Serra Elétrica: Michael Myers. Dessa vez, a famosa figura de “A” se traja com uma máscara típica do slasher como alusão ao mistério de sua identidade, porém, é clara a caracterização do macacão e faca como de Michael, e se Halloween: A Noite do Terror a composição inexpressiva e sem olho do vilão o fazia personificar vários tópicos sociais e políticos, a peruca que cobre a máscara desfigurada de “A” imprime o terror de não enxergar esse rosto de alguém que movimenta com fúria e violência para executar sua vingança. Ademais, o filme de John Carpenter pode ser percebido na cena das protagonistas Imogen (Bailee Madison) e Tabby (Chandler Kinney) caminhando pela vizinhança assim como Laurie (Curtis) e Annie (Nancy Kyes), ou de quando Imogen nota que alguém a observa do outro lado da rua enquanto assiste aula, o que reproduz outro trecho marcante de Halloween, contudo, essas e outras referências (que se estende ao remake de Rob Zombie) são passadas de forma apressada, com uma montagem afoita como se apenas panfletar o aceno que está fazendo aos filmes de Myers. Mas se há um exemplo que melhor se qualifica com a abordagem slasher, é o quinto episódio por ter apresentado um roteiro que organiza muito bem os conflitos que se sucedem durante uma festa do Dia das Bruxas e como isso culmina com utilização mais espontânea do clássico de Carpenter.

Entretanto, Original Sin sofre da mesma inconstância da série Scream de achar que a metalinguagem empregada no revolucionário roteiro de Kevin Williamson se resumia nas referências que o Ghostface trazia ou do aficionado por cinema Randy (Jamie Kennedy), e o que melhor pontua a cartilha modinha que o reboot segue está na cinéfila de Twitter Tabby, que simplesmente, em qualquer situação cita um nome de um filme de terror que ninguém na roda de personagens dá atenção, mas ela solta citações como se isso servisse como lógica para contextualização, ou pior, metalinguagem. É uma composição chata que os roteiristas imprimiram para uma das protagonistas, que se intensifica com as “militadas” aleatórias. Um exemplo ocorre no episódio piloto, ao Tabby dizer que gostaria de fazer uma sessão dupla no cinema em que trabalha de Corra! e Nós, “para mostrar a sua classe da escola que há diversidade no cinema contemporâneo”… certo, para uma cinéfila que gosta mais de filmes de terror faz sentido a colocação, porém, já que Sacasa somou os elementos do hype e do Twitteiros para formar a expert em cinema, a fala teria mais impacto se não soasse tão mal inspirada e dita por uma personagem extremamente insuportável quando o assunto é falar de filme.

Tirando isso, ao menos nos cinco primeiros episódios, os elementos familiares de Halloween foram bem reproduzidos na narrativa, além de servir como coesão na mitologia proposta da série de aproveitar a estrutura slasher para seu desenvolvimento. Nesse caso, a assinatura de “A” não representa só o anonimato para alguém que está um passo à frente das novas protagonistas, mas como um lembrete do pecado que acompanha o passado de suas mães. Essa ideia de uma figura mascarada buscando vingança pelo passado foi se tornando base para muitos slashers da década de 80 graças a Sexta-Feira 13 (1981), e junto a isso, Original Sin respinga um pouco de A Letra Escarlate, de Nathaniel Hawthorne, para acrescentar nuances à sua mitologia embebida no terror e sobre o que há de mais escandaloso e cruel no que essas personagens fizeram.

Essa configuração de mães e filhas, com Noa (Maia Reficco), Faran (Zaria) e Mouse (Malia Pyles) completando o leque das jovens protagonistas ao lado de Imogen e Tabby, diz muito sobre amizades tóxicas entre garotas e cultura do bullying: se a juventude das mães foram marcadas pelas práticas absurdas que faziam contra Angela Watters (Gabriella Pizzolo), para as filhas recai a reflexão de até onde vão os limites da toxicidade, e como podem se apoiar em vez de alimentar a rivalidade. Nesse aspecto, Um Novo Pecado transita bem nas discussões sem parecer forçada, mas falha ao querer trabalhar com tantos arcos e temas ao não definir um tom para como seriam costurados narrativamente.

Se a releitura da música Secrets de The Pierces e Joseph Bishara, que compõe o tema da série não foi o suficiente para chamar atenção, as imagens cheias de pistas sinalizam também o tom sombrio que será abordado no reboot. Embora os bilhetes e mensagens de “A” sejam menos frequentes aqui, há um esforço para que as reações das meninas sejam mais realistas dentro do contexto louco em que são arrastadas, além da coisa batida de adolescentes bancando detetives. Sacasa até tentou não usar demais esse clichê, na intenção de que o mistério fosse levado mais a sério visto que há temas sobre violência sexual e suicídio na trama, e a forma que são tratados em favor do suspense e ganchos narrativos deixa questionável a seriedade que a série quer aplicar e ser reconhecida. E ao dar muito destaque para Tabby e Imogen, faz parecer que as outras personagens chaves são deixadas de lado no que poderiam ter um desenvolvimento mais caprichado, o que pesa também os arcos envolvendo os traumas de infância, psicológico e conflitos familiares, além dos demônios pessoais pessoais de cada uma, principalmente para Mouse.

No geral, Original Sin tenta evitar os erros do passado da série mãe, mas não consegue fugir dos fantasmas recorrentes de uma série adolescente e da previsibilidade de querer ser grande demais fazendo mistério. Temos aqui um reboot que aproveita mais do potencial, com um elenco com quatro garotas não brancas e um final fechado; ligações equivocadas com Riverdale e menos slasher do que promete, e caso não sofra da maldição do cancelamento de um spin-off de PLL na primeira temporada, um outro novo pecado pode surgir numa possível renovação, porém precisará sustentar mais a sua base de terror e slasher e ter menos clichês adolescentes se quiser fazer valer essa investida diferente.

Pretty Little Liars: Um Novo Pecado – 1ª Temporada (Pretty Little Liars: Original Sin – EUA, 2022)
Criação: Roberto Aguirre-Sacasa, Lindsay Cahloon Bring
Roteiro: Roberto Aguirre-Sacasa, Lindsay Cahloon Bring, Katie Avery, Alexis Scheer, Evelyn Yves, Michael Grassi, Stasia Demick, Pamela Garcia Rooney, Danielle Iman, Eleanor Jean, Jenina Kibuka, Daniel G. King, Neil McNeil
Direção: Lisa Soper, Cierra Glaude,Maggie Riley, Alex Pillai, Megan Griffiths, Roxanne Benjamin
Elenco: Bailee Madison, Chandler Kinney, Maia Reficco, Zaria, Malia Pyles, Mallory Bechtel, Alex Aiono, Carson Rowland, Jordan Gonzalez, Elias Kacavas, Brian Altemus, Sharon Leal, Elena Goode, Eric Johnson, Lea Salonga, Carly Pope, Zakiya Young
Duração: 47 a 53 min (10 episódios)

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