Episódio
Temporada
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Assistir a um episódio como The End of the Road, que é o irmão mais tímido e um pouco imperfeito de On the Road, nos mostra a capacidade que a equipe criativa de Preacher tem de criar enredos inteligentes, divertidos e cheios de boas referências à mitologia cristã e aos quadrinhos no qual se baseia, colocando-nos em um dilema de lamentações sobre as oportunidades perdidas nesta 2ª Temporada, que demorou demais para apresentar uma linha de eventos que fariam o programa avançar, passando muito tempo em blocos pouco ou nada interessantes (o Inferno foi o principal deles) e fazendo mais rodeios do que deveria para finalizar um arco e terminar outro.
Mas de certa forma o finale trouxe uma boa compensação. Exceto pelo fato de Eugene ter trazido Hitler do Inferno — em uma sequência de fuga muitíssimo bem dirigida e finalizada com uma ótima paródia de Caronte –, o episódio amarrou com bastante competência as pontas dos dramas lançados no serial, tendo ainda a oportunidade de apresentar Jesse adolescente, sua saída da fazenda da família, a recolocação do lado místico ligado à vovó (que já aparecera com a citação do nome de sua família, em Sokosha) e a volta do pastor a Angelville, com o claro objetivo de usar as mandingas dos L’Angelle para ressuscitar Tulipa.
Wayne Yip, que dirigiu Pig, volta à série guiando com o máximo de agilidade possível o fim da linha para os personagens centrais, avançando com alguns deles para uma outra fase ou dando-lhes uma oportunidade-coringa, que na esfera de mudanças da série não sabemos exatamente onde irão se enquadrar. Hitler, Eugene e Herr Starr são os maiores exemplos. No caso de Starr até fica um pouco mais fácil subtender sua presença na vida futura de Jesse (isso se ele realmente está falando a verdade sobre a alma do pastor), já que existe uma moeda de troca inestimável em jogo e todo o ponto do Jesse Messias pode se ampliar com os eventos em Angelville.
A grandiosidade que essa nova vertente de Preacher trouxe no episódio, com a promessa de ida de Jesse ao Jimmy Kimmel Live e venda desse novo “homem de milagres” pela internet fortalece a brincadeira dos produtores com a imagem/versão da série para o Anticristo, sugerida inicialmente em On Your Knees. O conceito aqui não é exatamente tal qual o do Apocalipse de João, mas funciona com quase todos os ingredientes, tendo o lado cômico da própria recusa de Jesse em ser tratado como Messias sendo que ele está em uma rota de transformação para ser um Messias. Esta e uma porção de outras ironias religiosas e morais são colocadas neste finale até para redefinir os papeis de herói, vilão e anti-herói. Dá para citar o tratamento dado a Featherstone, a colocação de Cassidy como um herói improvável (com todo o cenário do “assassinato” de Denis levado em conta) e de Jesse assumindo algo que já se vinha nutrindo a algum tempo, com a frase “Oh, você me odeia agora? Espere só para ver… Espere só…“.
Junto com o episódio de estreia da temporada, este finale foi o que mais similaridade mostrou com a Primeira Temporada, utilizando-se do conflito entre as forças do céu e do inferno, do conflito entre os homens, e das jogadas de atualidades e criação de situações um pouco bizarras para garantir o avanço da história. No plano técnico, foi um final tão bom quanto Call and Response, mas com ações de maior peso particular, não mais geral. Percebam que o roteiro nos lembra da ausência de Deus e que isso abre as portas para a mudança das regras, vide o que acontece no cruzamento entre o inferno e o nosso mundo. Sabendo que o Graal irá se aproveitar desse “buraco divino” e que Deus estará de alguma forma ligado a Angelville (aquele quarto com a fantasia do cachorro era na casa da vovó Marie?), percebemos uma conexão dramática em andamento, somada ao fato de Jesse não poder mais usar A Palavra sem interferência e da óbvia promessa de maus bocados que deve passar na propriedade da família.
A montagem de The End of the Road ganha fácil o posto de aspecto técnico de destaque, criando um ritmo de ações que funciona como atos inicialmente isolados, mas que aos poucos são mostrados como partes bem construídas de um quebra-cabeça em andamento. Curioso é que mesmo tendo excelentes escolhas para a trilha sonora, eu achei a presença musical escanteada aqui, o que é estranho, pois nos melhores episódios da série — inclusive nesta temporada que nem teve um desenvolvimento assim tão espetacular — a trilha assume um papel de bastante importância narrativa, não apenas de presença atmosférica, como no presente caso. E não estou dizendo que o uso foi ruim, apenas que ele está aquém das representações mais bojudas da música em capítulos de maior peso no show.
Marcada por um estacionamento narrativo e demora impressionante para que se criasse uma “missão dentro da missão” para Jesse, Tulipa e Cass, a Segunda Temporada de Preacher terminou com um estrondo, cheia de boas promessas e dando a entender uma maior aproximação com os quadrinhos, agora com o arco Até o Fim do Mundo, ao menos em um primeiro momento. A procura por Deus aponta para o caos vindo pela ausência de Deus, ou seja, há um grande número de oportunidades para a jornada seguinte da série. O bem e o mal, já apresentados, começam a montar seus times e ensaiar o primeiro de muitos enfrentamentos. Mais alguém espera uma boa guerra? Posso ouvir um amém?
Preacher 2X13: The End of the Road (EUA, 11 de Setembro de 2017)
Direção: Wayne Yip
Roteiro: Sam Catlin, Seth Rogen (baseado nos personagens de Garth Ennis e Steve Dillon)
Elenco: Dominic Cooper, Joseph Gilgun, Ruth Negga, Ian Colletti, Julie Ann Emery, Ted Ferguson, Gianna LePera, Graham McTavish, Terence Rosemore, Noah Taylor, Pip Torrens
Duração: 54 min.