Luke Cage e Punho de ferro são uma dupla que não vêem seus nomes estampados na capa de um quadrinho há muito tempo. É lógico que os dois personagens já protagonizaram sagas individuais, mas não ouvimos esse icônico dueto cantar juntos desde os anos 80. Claro que isso não é pela falta de profundidade dos protagonistas. Os dois são personagens profundos o suficiente para sustentar as suas tramas, e também as dos outros.
A demora em ver um título com ambos também não tem como culpada a falta de harmonia que os dois heróis possuem, os dois são excelentes juntos, pode-se dizer que Cage completa Daniel, e juntos os dois são capazes de ter enredos engraçados, dramáticos, profundos e perigosos. Então qual foi a motivação para a Marvel ressuscitar essa parceria? Surfando na onda dos sucessos das séries da Netflix, a série Luke Cage já está disponível para ser devorada pelos fãs, e a do ninja mágico chega ainda esse ano. A casa das idéias decidiu dar um novo destaque para essa peculiar dupla. O roteiro ficaria nas mãos de David F. Walker , e a arte nos pincéis de Sanford Greene.
Republicar um título de dois personagens famosos é uma missão mais árdua do que se aparenta, mude muito e os personagens perdem a essência, aposte no antigo e os dilemas debatidos nos anos 80 não terão o mesmo peso que nos 2000. O roteiro da HQ deve ser moderado, apostar no novo mas não chutar o passado como se ele não fosse bom. Mesmo com essas limitações David consegue alcançar um tom ideal para essas 4 edições do quadrinho.
A trama é muito simples, uma ex-secretária da dupla acabou de sair da prisão, depois de cumprir pena por assassinar seu namorado. Quando encontra seus amigos a mulher pede um favor para a dupla; a tarefa é simples, eles devem pegar um colar que, ela diz pertencer à sua vó. A primeira edição passa e a missão é cumprida, mas no final somos surpreendidos e vemos que o colar é uma fonte de magia que transformará a mulher na vilã de toda a trama.
Toda essa simplicidade é um pouco decepcionante no começo, os dois, principalmente Cage, sempre tiveram tramas muito políticas. É normal lermos enredos em que os roteiristas insiram assuntos como desigualdade, racismo e corrupção. Fazer os dois heróis lutarem contra uma entidade que deixa seu portador cada vez mais raivoso, parece um pouco banal demais para seus complexos protagonistas.
Isso só não chega a ser um grande defeito devido a criatividade e competência de Walker em contar essa história. A forma que o roteirista escreve a dupla é tão divertida que o leitor tem vontade de ler um quadrinho que seja apenas ambos sentados no sofá discutindo e conversando como dois velhos amigos. Todo esse entrosamento é tão bem trabalhado que faz com que a história da HQ seja colocado em segundo plano.
Vemos um Punho de Ferro que insiste em ter a velha dupla de volta, e um Cage que simplesmente quer se dedicar a nova vida com Jessica e sua filha. A relação do herói indestrutível com sua família é outro acerto do roteiro, ver Luke falando fiddle-faddle em vez de falar um palavrão, por conta de sua filha, é no mínimo hilário. Por vários momentos o quadrinho leva seu leitor a uma risada que é difícil de se ter quando estamos consumindo esse tipo de mídia.
Essa amizade também é reforçada com os traços de Sanford Greene, ver um herói mirrado lutando ao lado de um homem ENORME, e perceber que o pequeno é o “folgado” e o grande o “coração” foi um belo uso dos clichês visuais. A associação que temos quando apresentados à isso é involuntária, é como se os dois fossem complementos um do outro, misture isso tudo com as linhas do roteiro e temos um belo trabalho de estruturação de imagem.
Greene não acerta apenas nos protagonistas, todo o traço escolhido pelo artista reforçam os conceitos trabalhados no roteiro. O estilo de arte de rua escolhido por Sanford misturados com as cores fortes de John Rauch tornam a imersão do leitor muito mais agradável. Em muitos quadrinhos vemos um roteiro que tem um tom completamente diferente das cores e linhas escolhidas pelos artistas. Em Luke Cage e Punho de Ferro, vemos um excelente trabalho de entrosamento entre os dois pilares de uma HQ.
Todo esse arco só reforça o já grande “hype” que a Netflix tem a capacidade de trabalhar no fandom. A Marvel ajuda a empresa de streaming nos entregando um divertido, leve e muito, muito carismático novo começo para essa tão aclamada dupla. O reencontro é tão bom que por diversas vezes vemos os personagens que circundam a trama comentar coisas como ” finalmente eles voltaram”. E tenho toda a certeza que ao terminar esse curto primeiro arco, os leitores verão o quanto essa frase faz sentido.
Luke e Punho de Ferro #1 a 5: The Boys Are Back in Town (Power Man and Iron Fist: The Boys Are Back in Town, EUA – 2016)
Roteiro: David Walker
Arte: Flaviano Armentaro
Cores: John Rauch
Letras: Clayton Cowles
Editora original: Marvel Comics
Datas originais de publicação: abril a agosto de 2016
Páginas: 123