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Crítica | Planeta Proibido

por Ritter Fan
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estrelas 4

Detectar e estabelecer momentos de criação de obras audiovisuais definitivas que marcaram e influenciaram determinados gêneros cinematográficos não é algo que possa ser feito muito facilmente. No gênero da ficção científica, que permite voos inacreditáveis de imaginação, essa tarefa talvez seja ainda mais difícil. Mas, se Viagem à Lua talvez tenha marcado o nascimento do gênero em si, arriscaria dizer que foi provavelmente Planeta Proibido que trouxe seu amadurecimento, moldando o futuro dessas obras por muitas décadas.

Combinando uma sensível evolução dos efeitos especiais vistos três anos antes em Guerra dos Mundos com a abordagem de temas adultos e filosoficamente impactantes como em O Dia em que a Terra Parou, de cinco anos antes, Planeta Proibido oferece uma mescla que literalmente inspiraria Rod Serling a criar a fantástica série Além da Imaginação e, talvez mais famosamente ainda, Gene Roddenberry a criar Jornada nas Estrelas. Os elementos estão todos presentes: uso inteligente de efeitos visuais, criatividade impactante e, principalmente, um história com contornos profundos e personagens inesquecíveis. Diria que especialmente para aqueles que conhecem Jornada nas Estrelas, é literalmente impossível assistir Planeta Proibido sem ver o Capitão Kirk como o Comandante Adams (Leslie Nielsen) e o Dr. Leonard “Bones” McCoy como o Tenente “Doc” Ostrow (Warren Stevens). E Robbie, o Robô, de certa maneira, fecha a trinca como uma versão de Spock.

Mas não é só com seus personagens que Planeta Proibido estabelece moldes que serviriam de base para dezenas e dezenas de filmes para cinema e séries de TV por anos a fio. Filmado integralmente em estúdio, o controle sobre o ambiente por parte do diretor Fred McLeod Wilcox (mais conhecido por filmes estrelando Lassie) foi total. A impressão que dá é de estarmos literalmente dentro de um cenário de ficção científica por excelência, mas se pararmos para observar os detalhes, veremos o cuidado com o design de cada detalhe da produção. E talvez o elemento mais impressionante seja a omnipresença das pinturas de fundo (matte paintings) que permitem horizontes extensos às câmeras que não se furtam em fazer uso constante do foco profundo. A nave espacial comandada por Adams é o “disco voador” clássico, mas seu desenho interno é perfeitamente funcional e crível, passando a impressão efetiva de um destacamento militar no século XXIII em expedição a Altair IV para descobrir o que aconteceu com uma colônia humana de 20 anos antes (trama ecoada em Aliens, O Resgate, não é mesmo?). Os uniformes de militares espaciais serão familiares a muitos, pois é perfeitamente possível concluir que eles não só inspiraram diretamente o que vemos em Jornada nas Estrelas, como uma multitude de outras obras do gênero.

E a trama é ambiciosa, apesar da cadência do roteiro pecar pela lentidão e exposição excessivas. A ambição vem na transformação de uma simples missão de resgate em um encontro com uma figura misteriosa, mas cativante, o Dr. Morbius, vivido quase que como um vampiro por Walter Pidgeon. Quando o ouvimos pela primeira vez, ainda na nave comandada por Adams, ele avisa para não pousarem no planeta, por ser muito perigoso. Quando, porém, o pouso acontece, Morbius recebe a equipe com toda a graça e simpatia, mas deixando, lógico, um ar sinistro por detrás que somente muito vagarosamente passa a ser desvelado.

Wilcox não tem pressa. Ele emprega os 45 minutos iniciais para nos apresentar ao planeta e a Morbius, além do sensacional robô Robbie, praticamente o faz-tudo de seu mestre. Como curiosidade, Robbie é o primeiro robô cinematográfico a efetivamente ser um personagem completo e não apenas um adereço à trama. Robbie tem personalidade e funções efetivas dentro da estrutura narrativa, funcionando tanto como alívio cômico quanto como uma espécie de ameaça a ser enfrentada. Mas, continuando a abordar o roteiro, Cyril Hume que o sofisticou a partir de história criada por Irving Block e Allen Adler em versões anteriores, acaba se deslumbrando com o material que tem em mãos e quase faz uma espécie de documentário da National Geographic quando Morbius revela – e mostra em detalhes – a tecnologia dos Krell, povo que, há 2 mil séculos, ocupava o planeta. Eles se desenvolveram a níveis inimagináveis, chegando a estudar maneiras não-corpóreas de viver (ecos de Stargate SG-1 aqui) e, segundo Morbius, pereceram diante de uma ameaça misteriosa, a mesma ameaça que teria dizimado os demais colonos que, junto com ele, chegaram no planeta há 20 anos.

Mas, quando menciono a natureza “National Geographic” do passeio turístico de Morbius acompanhado de Adams e Doc, de forma alguma quero dizer que não é um momento fascinante. O uso de efeitos visuais nesses 15 ou 20 minutos em que a trama se adensa é verdadeiramente um marco no Cinema. São cenários enormes, convenientemente limpos e perfeitos (não se pode ter tudo, não é mesmo?), amplificados imensamente por truques visuais em câmera e, novamente, um sensacional trabalho de pintura de fundo, do tipo que, nessa magnitude, só seria visto novamente em Star Wars. No entanto, apesar do deslumbramento visual que é inevitável se o espectador souber se transportar para a década de 50, é inafastável o didatismo de tudo que vemos, com explicações interessantes, mas que chegam a ser enfadonhas e repetitivas.

Além disso, os patrulheiros do politicamente correto provavelmente terão uma síncope nervosa ao verem como a única personagem feminina – Altaira, Alta para os íntimos (a bela Anne Francis) – filha de Morbius, é usada. E “usada” é mesmo a palavra-chave, pois ela está no filme unicamente para ser um colírio para os homens (tanto os personagens como os espectadores) e só usa roupas minúsculas, especialmente saiotes pouco abaixo das nádegas, além de aparecer nua nadando em um lago. Mas esse não seria o problema se sua inocência (afinal, o único homem que Alta vira até o começo do filme é seu pai) não fosse chauvinisticamente explorada por praticamente toda a tripulação visitante, com Adams chegando a dizer a ela que ela não pode andar com aqueles trajes diante de homens que há mais de um ano viajam pelo espaço… Ela é uma boneca Barbie sendo explorada por um monte de homens babões, sem quase nenhuma função narrativa que não seja ser a “dama em perigo”. Isso  na década de 50 era muito comum, mas em Planeta Proibido chega a ser ridículo.

De toda maneira, mesmo com seus problemas, a fita faz pensar, especialmente quando a ameaça misteriosa – e convenientemente invisível – reaparece e com a revelação final do que ela efetivamente é. É o ponto em que a filosofia e a psicologia entram em cena fortemente, aplicando outras camadas à narrativa em tese simples. Mesmo que a explicação, dada por Adams a Morbius, seja excessivamente expositiva e didática, com direito a repetições (lembrou-me muito o final de Psicose), a aura de sofisticação permanece, além da conclusão ser satisfatória e lógica dentro da narrativa proposta.

Planeta Proibido é, efetivamente, um destaque histórico entre os filmes de ficção científica que moldaram gerações. Merece, definitivamente, ser conferido e discutido entre os fãs do gênero, além de apreciado por sua beleza estética e efeitos especiais de primeira.

Planeta Proibido (Forbidden Planet, EUA – 1956)
Direção: Fred McLeod Wilcox
Roteiro: Cyril Hume, Irving Block, Allen Adler
Elenco: Walter Pidgeon, Anne Francis, Leslie Nielsen, Warren Stevens, Jack Kelly, Richard Anderson, Earl Holliman, Robby the Robot, George Wallace
Duração: 98 min.

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