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Crítica | Pisque Duas Vezes

A estreia de Zoë Kravitz na direção.

por Felipe Oliveira
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Desde o primeiro momento de sua divulgação, era difícil olhar para Pisque Duas Vezes e não lembrar de Corra! e Não Se Preocupe, Querida, a diferença é que o filme não pretende discutir questões étnicas-raciais como Jordan Peele, e Zoë Kravitz não dirige como Olivia Wilde tratando a peça como a maior obra-prima já feita. A inspiração em Get Out é inevitável, visto a semelhança como a narrativa é pensada para gerar paranoia e envolver os personagens – e audiência – na atmosfera alienada, ou na similaridade no tema de Don’t Worry Darling, porém, a direção de Kravitz é segura ao entregar um trabalho de estreia consistente e consciente na forma que quer contar essa história.

Mesmo podendo cair na linha de comparações visto que o filme é um thriller psicológico com toques de humor ácido, Blink Twice é repleto de escolhas visuais criativas que brincam com a ideia de percepção e imersão – um exemplo simples é a maneira que surge o tittle card do longa, um detalhe, mas que também faz parte da estilização que forma a construção visual de Kravitz. A forma de envolver o público em sua abordagem fica a cargo da protagonista Frida (Naomi Ackie), empolgada por mais uma vez estar na presença do CEO de tecnologia Slater King (Channing Tatum), até ser convidada para um evento em sua ilha particular. Conforme nos seduzimos pela perspectiva de Frida, é fácil embarcar na ideia de realidade desconexa, porém, o que importa, é a história que está sendo contada.

Essa preocupação com a história além da quebra de expectativa por reviravoltas pode ser percebida na condução de elenco. O leque é recheado, mas cada personagem age em função da história, do elemento que sirva para construção da narrativa, e Kravitz quer tanto o público imerso nessa história que brinca com enquadramentos e um jogo estilizado na edição que sempre reforça a autoconfiança da sua direção. Inclusive, mesmo para um filme com orçamento limitado, Kravitz comanda com uma ambição de blockbuster. E em vez de assumir inspirações e evidenciar acenos para outras obras, ao falar de Pisque Duas Vezes, a diretora estreante defende a maneira que quer explorar sua imaginação, e esse é um aspecto evidente até na mesmo em como  “manipula” a percepção da audiência quando a forma sobrepõe o jogo de informações com a edição e fotografia pensadas para prender a atenção, o que entra a trilha angustiante da Chanda Dancy, fazendo o famoso jumpscare servir em escolhas ousadas.

Não há nenhuma surpresa que a trama esconde um mistério, mas Kravitz é direta ao não tratar o tema por uma alegoria. O que reflete na maneira como as revelações vão surgindo e na construção do ato final. É notável que, ao mesmo tempo em que a diretora e co-roteirista deixa margem para caminhos óbvios, ela acrescenta escolhas que sempre elevam o filme para um desfecho oposto do imaginado. Logo, as reviravoltas não são usadas como elemento surpresa – visto a maneira direta com que ela discute temas de abuso de poder e cultura do cancelamento – e sim, inseridas com a mesma dinâmica bem elaborada da edição estranha e desconfortável que em vários momentos está brincando com a ideia de percepção dos acontecimentos. Dito isso, o que faz Blink Twice ser um acerto interessante é por Kravitz mirar numa direção estilosa, mas sem perder de vista as discussões que pretende gerar.

Seria cedo para sugerir outros filmes, mas é curioso observar que o co-roteirista de Pisque Duas Vezes é o criador de High Fidelity, um dos trabalhos mais chamativos de Kravitz na televisão e que o resultado dessa parceria é um suspense psicológico cheio de imaginação, criatividade e uma energia confiante para iluminar o que homens brancos fazem para realizar seus caprichos. Da tensão, ao humor desconcertante, e por fim uma brutalidade insana, Kravitz navega por várias nuances nessa sua estreia que merece ser vista muito mais potencialidade e composição do que ser resumida pela bolha da interpretação e comparação.

Pisque Duas Vezes (Blink Twice – EUA, 2024)
Direção: Zoë Kravitz
Roteiro: Zoë Kravitz, E. T. Feigenbaum
Elenco: Naomi Ackie, Channing Tatum, Adria Arjona, Alia Shawkat, Christian Slater, Simon Rex, Haley Joel Osment, Liz Caribel, Trew Mullen, Levon Hawke, Geena Davis, Kyle MacLachlan
Duração: 102 min.

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