Home Diversos Crítica | Perry Rhodan – Livro 21: A Guerra Atômica Que Não Houve, de Kurt Mahr

Crítica | Perry Rhodan – Livro 21: A Guerra Atômica Que Não Houve, de Kurt Mahr

por Luiz Santiago
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Grande Ciclo: Via Láctea — Ciclo 1: A Terceira Potência — Episódio: 21/49
Principais personagens: Perry Rhodan, Reginald Bell, Oberst Freyt, Hauptmann Welinskij, Major Deringhouse, Fedor A. Strelnikow, Marschall Sirow
Espaço: Terceira Potência (Galáxia/Terrânia), Federação Asiática (Rússia)
Tempo: Meados de junho de 1980

Eu já estava achando estranho que nenhum dos livros da série Perry Rhodan, até este momento, tivesse abordado de forma direta, ampla e contextualizada os impasses da Guerra Fria que marcavam o mundo na época em que esses livros foram escritos. É verdade que a temática estava lá no início da saga, como pano de fundo de alguns conflitos, mas nunca com a força que teve neste 21º volume. E isso é especialmente curioso quando consideramos que, nos anos 1960, a Alemanha passava por inúmeras transformações internas (no ramo social, político, econômico e ideológico), presenciando, em 1961, a construção de um muro dividindo a cidade de Berlim, por exemplo. Isso sem contar as divergências entre duas grandes potências aparecendo nos jornais, na boca do povo e nas movimentações militares cercando as fronteiras entre a RDA e a RFA.

Com isso em mente, é perfeitamente compreensível e duplamente interessante um livro como A Guerra Atômica Que Não Houve, que inclusive incorpora em sua narrativa muito das ameaças entre os Estados Unidos e a URSS na construção de um drama que coloca a unidade política do planeta novamente em perigo, fazendo-nos lembrar de aventuras anteriores, como A Abóbada Energética ou O Crepúsculo dos Deuses. O medo de uma “destruição mútua assegurada” foi a marca dos anos 1960, e esse conflito aparece no presente livro de Kurt Mahr como um inteligente jogo de poder, vindo em um momento bastante lógico da série. Após retornar do Sistema Vega e ter se encontrado com AQUILO no planeta Peregrino, Rhodan travou uma batalha em Vênus contra militares exploradores do Bloco Oriental (leia-se Rússia) e, ao chegar à Terra, se deparou com um ditador que queria fazer a sua própria exploração espacial, não ligando para as orientações de paz propostas pela Terceira Potência.

O autor soube trabalhar muito bem esse novo levante nacionalista e concentrou toda a ação em um único livro, sem estender mais do que deveria um problema que, de alguma forma — apesar do contexto diferente — já fora foco principal da série, ainda em seus primeiros volumes. Aqui, no entanto, a trama se encaixa perfeitamente nas tomadas de decisões vistas durante a Guerra Fria, inclusive a dificuldade de comunicação e as informações ocultas pela “Cortina de Ferro”. O interessante é que, em vez de usar os seus personagens para vender o “sonho do capital americano/europeu” ou coisa parecida, Kurt Mahr pegou um problema social real e o transformou em uma interessante jornada para estabelecimento de algo novo na Terra: uma Corte de Justiça internacional que utiliza a Declaração Universal dos Direitos Humanos como base legislativa. Apesar da rapidez estonteante com que é organizada, a ideia para essa instituição é incrível, e o seu primeiro caso de julgamento, idem.

Rhodan não quer “alcançar a paz pela força“. Ele bem que poderia colocar as armas arcônidas em funcionamento, matar um monte de gente e mostrar para os russos que com a Terceira Potência não se brinca. Mas isso seria uma maneira contraditória e muito similar à do ditadorzinho do Bloco Oriental para se chegar a um suposto estágio de união entre as nações. Em vez disso, o chefe da nação mais poderosa da Terra destaca o Major Deringhouse para ir a campo, em pleno território russo, e dar início a um plano que termina com a rendição dos principais líderes desse governo ditatorial à nova Corte Internacional.

Ao longo de todo o livro temos uma narrativa que alterna de modo ágil e bem pensado as ações de Deringhouse com as ações na Terceira Potência. Essa narração alternada cria uma boa expectativa no leitor e vai escalando de maneira cada vez mais interessante, sempre com o agente de Terrânia (antiga Galáxia) colocado em perigo. Durante a leitura, confesso que fiquei em conflito em relação à capacidade de Deringhouse em fazer absolutamente tudo aquilo que o vemos fazer nesse livro. Por um lado, sabemos que é muitíssimo bem treinado e tem um traje especial que ajuda em tudo. Mas as coisas pelas quais ele passa e o que ele consegue fazer… sozinho (!) é algo para se pensar várias vezes como um exagero heroico por parte do autor. Mas a rigor, é algo que só me “incomoda” na problematização do conceito, porque durante a leitura muito divertiu, e em nenhum momento pensei em justificar esse tratamento como algo que fez a qualidade do livro cair para mim.

Algumas das fraquezas de A Guerra Atômica Que Não Houve está no abandono de narrativas políticas que poderiam contextualizar muitíssimo melhor o governo rebelde; no ataque final das naves, que acabou sendo uma cena clássica de “chutar cachorro morto“, além de saturar essa insistência dos russos em destruir os inimigos, nesse caso, acabando com praticamente toda a vida humana no planeta; e por fim, a rapidez com que coisas muito importantes são criadas. Ainda assim, essas novidades são utilizadas de maneira quase completa na última parte do livro, cujo corte final é seco e preciso: daqueles em que o escritor sabe onde interromper a narrativa, deixando aberta uma janela de curiosidades para o futuro. E nesse caso, o futuro cheira a perigo, pois logo descobrimos que Thora, cansada de esperar por uma atitude de Rhodan, irá fugir. Já podemos esperar por uma nova temporada em Vênus?

Um único agente da Terceira Potência, equipado com algumas das surpresas da tecnologia arcônida, fora suficiente para instalar a confusão num país inteiro e prender o principal instigador da discórdia. Mas nem por isso conseguiu a união definitiva da humanidade. Enquanto essa união não se realiza, Perry Rhodan não pode estabelecer contato com o mundo de Árcon. Thora, uma das últimas representantes da dinastia reinante de Árcon, começa a se impacientar e foge. A FUGA DE THORA é o título do próximo volume da série Perry Rhodan. 

Perry Rhodan – Livro 21: A Guerra Atômica Que Não Houve (Der Atomkrieg findet nicht statt) — Alemanha, 26 de janeiro de 1962
Autor: Kurt Mahr
Arte da capa original: Johnny Bruck
Tradução: Richard Paul Neto
Editora no Brasil: Ediouro (1976)
101 páginas

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