Home Diversos Crítica | O Caso da Viúva Assustada (Perry Mason #10), de Erle Stanley Gardner

Crítica | O Caso da Viúva Assustada (Perry Mason #10), de Erle Stanley Gardner

Nunca subestime uma vovó determinada!

por Luiz Santiago
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Uma senhora de quase 70 anos aparece no escritório de Perry Mason para contratá-lo. Sua representação inicial na trama chama muito a atenção do leitor, pois se trata de uma mulher decidida e corajosa, disposta a pagar muito dinheiro para livrar a neta de um problema com diversas implicações negativas. Viciada em jogos de azar, Sylvia Oxman devia dinheiro aos proprietários de um navio de jogo, que detinham alguns títulos com os quais poderiam fazer qualquer tipo de chantagem. Ao mesmo tempo, Sylvia passava por um processo de divórcio, e toda essa situação certamente seria utilizada contra ela, no processo, terminando por dar ao marido a custódia do filho.

Matilda Benson não quer que a neta saiba que Mason está trabalhando no caso, e a primeira parte do livro explora as tentativas do advogado em recuperar os títulos de dívidas sem atiçar a curiosidade dos donos do navio de jogos. Para o contexto da época (o livro é de 1937), fica muito clara a reafirmação de um olhar negativo para o fato de mulheres participarem de jogos de azar, ainda mais sendo viciadas neles. Ou seja, um prato cheio para aproveitadores usarem situações delicadas como esta, de uma grande dívida, para atingirem um caminho de lucro ainda maior, através da chantagem. O autor trata Matilda Benson como uma mulher que já viveu o bastante para saber exatamente como funciona a sociedade e como batalhar contra essa horda opressiva, algo que identificamos em seu comportamento do início ao fim do livro — destaco a inteligente e decisiva mentirinha que ela conta em dado momento do desfecho do caso.

A ambientação do livro é majoritariamente dentro do navio, e quando não estamos neste espaço, vemos os personagens escondendo-se em apartamentos alugados ou em quartos de hotel. É, portanto, um livro de caráter claustrofóbico, característica que Erle Stanley Gardner sabe explorar muito bem. Outro ponto notável no livro é a participação de Drake e sua equipe de investigadores (contando até com um “desnaturado” que vende, para um jornal sensacionalista, uma informação comprometedora a Perry Mason). A base de investigação aqui é quase inteiramente realizada fora do tribunal ou dos escritórios, sendo um dos melhores livros da série, até o momento, nesse tipo de construção. Embora  nenhum dos blocos conte com situações, diálogos ou contextualização exemplar, em termos de estilo de escrita, são todas muito boas naquilo que se propõe narrar.

A maioria dos personagens em O Caso da Viúva Assustada são escravos das aparências sociais e tendem, de certa forma, ao crime, aos grandes problemas com a lei. Nos livros da série Perry Mason, esse aspecto sempre foi tratado em uma linha tênue, até porque o protagonista também tem ações éticas, morais e até legais que não são lá muito certinhas. O que difere os “desvios legais” dele dos “desvios legais” dos bandidos é o alvo; quem prejudicam e o que ganham com isso. Mason não permite que pessoas inocentes se machuquem e seu objetivo é chegar à verdade e fazer valer a justiça. Já os vilões…

Mesmo numa perspectiva maniqueísta de construção de bandidos e mocinhos, podemos olhar para o trabalho de Gardner como uma cutucada básica na estrutura do sistema de justiça estadunidense (embora saibamos que não é um problema exclusivo daquele país). Um sistema tão viciado e com agentes tão corruptos no meio do processo, que muitas vezes, a justiça só pode ser feita quebrando de leve alguns caminhos legais. Eis aí um excelente dilema moral. Dá um debate e tanto!

Perry Mason – Livro 10: O Caso da Viúva Assustada / O Caso da Milionária Perigosa (The Case of the Dangerous Dowager) — EUA, 1937
Autor: Erle Stanley Gardner
Publicação original: William Morrow and Company (Abril de 1937)
292 páginas

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