- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios.
Em seu antepenúltimo episódio, a segunda temporada de Perry Mason continua a tendência iniciada no capítulo anterior de focar mais no caso do que no lado psicológico de seus personagens, ainda que, claro, nada desse segundo aspecto seja simplesmente esquecido ou largado de lado. Afinal de contas, é necessário fazer a temporada caminhar na direção de seu fim e da resolução do caso dos irmãos Gallardo e dos negócios escusos da família McCutcheon, com a abordagem psicológica tornando-se mais entremeada com a linha narrativa em tese principal.
Depois de ameaçado diretamente com o trenzinho de seu filho funcionando quando ele chegou em casa, Perry toma medidas extremas para evitar que alguém entre em seu apartamento ao literalmente acorrentar a porta à cozinha e sair pela escada de incêndio (não sei muito bem qual é a lógica de proteger a entrada e deixar a escada como estava, mas tudo bem, vamos fechar os olhos aqui por um momento). Seja como for, Perry revela-se muito abalado pelo ocorrido e mal consegue reunir seus pensamentos, o que, no agregado, funciona tanto para ele ficar ainda mais obcecado pelo caso e pela destruição da reputação dos McCutcheons, o que pode ser sua ruína, claro, quanto para que o episódio possa abrir espaço para Della Street em sua primeira aparição ativa perante o tribunal, fazendo perguntas ao político irmão de Noreen, que fora atacada por Brooks McCutcheon, e que, agora, encontra-se em estado vegetativo em uma clínica.
O momento, claro, é outra grande vitória para o “Time Mason”, com Juliet Rylance mostrando toda sua categoria em seu papel e desde já deixando claro que ela não deixa nada a dever a Matthew Rhys e seu Perry Mason. Mas, claro, a vitória é momentânea. Graças à traição de Pete Strickland que, vale dizer, Mason sequer consegue imaginar em toda a sua fúria injustamente descarregada em cima da pobre da Ginny (mas o roteiro foi esperto em fazê-la mais cedo entreouvir Della falando que ela era “saborosa”), a arma do crime guardada no cofre é finalmente achada em uma sequência quase ceremonial que conta até mesmo com a presença do juiz que muito claramente espera, lá no fundo, que nada seja encontrado. Não me pareceu muito lógico a promotoria afirmar como fato, perante o Juiz, que aquela era a arma do crime sem que os testes necessários fossem feitos e o lado “espetaculoso” da sequência parece ter atropelado um pouco a abordagem normalmente mais técnica da série. No entanto, independente disso, mesmo com Della tentando defender o que eles fizeram, fica evidente a imoralidade do ato da dupla que escondeu prova incriminatória que tem o condão de reativar o caso da promotoria com força total mesmo que a reputação “ilibada” de Brooks tenha sido demolida não muito tempo antes. Dizer que a situação dos irmãos Gallardo ficou complicada é um eufemismo.
No entanto se, de um lado, Strickland traiu Mason a pedido do assistente do promotor (tenho minhas dúvidas se Hamilton Burger sabe como a arma foi obtida, já que, tecnicamente, é uma prova ilegal), Gene Holcomb, tentando entender o que afinal de contas aconteceu que lhe colocou em uma posição difícil com seu barco dos prazeres, “vira casaca” por desespero egoísta (obviamente) e faz uma parceria com Mason primeiro obtendo a ficha médica de Noreen necessária para provar os hábitos estranguladores de Brooks e, depois, levando-o para ver o lugar de desova dos vegetais e frutas dos navios comandados por Lydell McCutcheon em um quebra-cabeças que continua enevoado na temporada, mas que, claro, muito provavelmente será o ás na manga de Mason e Street na continuação do julgamento.
Paralelamente, em uma linha narrativa que permeia todo o episódio e que é um tantinho mais didática do que o necessário, vemos a epopeia do tênis Converse laranja de Ozzie Jackson que Paul Drake teve que espancar por ordem de Perkins tanto para obter as informações que queria quanto para ser seu próprio castigo. Claro que os capangas de Perkins deram cabo de Ozzie e Drake, talvez como uma forma de expiar esse seu pecado, fique obcecado pelos sapatos a ponto de estremecer seu relacionamento com a esposa e de deixar escapar o carro relacionado com o assassinato de Brooks que ele tanto procurava. Sei lá, as coincidências e conveniências necessárias para que Drake esbarrasse nos sapatos ensanguentados por duas vezes em dois dias seguidos me pareceram exageradas e, em última análise forçadas.
O antepenúltimo episódio da temporada tem seus ótimos momentos, em especial o destaque dado a Della Street no interrogatório cruzado, mas ele pecou em tentar correr talvez um pouco demais com a trama, usando, para isso, alguns atalhos incômodos. Não é nada muito sério, claro, mas qualquer coisa menos do que o ideal torna-se chamativo dada a excelência costumeira da série como um todo. Seja como for, agora, ao que tudo indica, todas as peças estão posicionadas no tabuleiro para permitir que o caso dos irmãos Gallardo seja encerrado, seja favoravelmente ou não a eles.
Perry Mason – 2X06: Chapter Fourteen (EUA, 10 de abril de 2023)
Showrunners: Jack Amiel, Michael Begler (baseado em personagem criado por Erle Stanley Gardner)
Direção: Marialy Rivas
Roteiro: Elizabeth Baxa
Elenco: Matthew Rhys, Juliet Rylance, Chris Chalk, Shea Whigham, Justin Kirk, Diarra Kilpatrick, Verónica Falcón, Paul Raci, Jee Young Han, Sean Astin, Matt Bush, Gayle Rankin, Eric Lange, Fabrizio Guido, Peter Mendoza, Jen Tullock, Katherine Waterston, Christopher Carrington
Duração: 56 min.