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Crítica | Perigo na Noite

Um noir preguiçoso.

por Ritter Fan
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Os primeiros 10 anos da carreira cinematográfica de Ridley Scott foram curiosos, especialmente se analisados sob a ótima moderna em que apenas um fracasso financeiro pode custar o nome e a reputação de um cineasta. Foram cinco longas dirigidos nesse período, começando com Os Duelistas e acabando em Perigo na Noite, com apenas um, Alien, o Oitavo Passageiro, sendo sucesso de bilheteria. Todos os outros quatro foram fracassos retumbantes, com Blade Runner conseguindo fazer marginalmente mais do que seu orçamento, o que nem de muito longe paga os custos quando as cópias e a publicidade são computados.

Tudo bem que Alien não foi apenas um sucesso, mas um gigantesco sucesso, mas é raríssimo Hollywood ter essa paciência toda com cineastas que, reiteradamente, falham em criar obras que garantem o retorno do investimento. Perigo na Noite foi um filme barato para os padrões da indústria da época e, mesmo contando com um elenco de relevo, não conseguiu sequer arrecadar seu orçamento. Não obstante esses percalços, Scott, ainda bem, perseverou e estabeleceu-se como um dos grandes cineastas modernos, mesmo com sua carreira, se vista em retrospecto, ser uma montanha-russa qualitativa.

Perigo na Noite é o retorno do diretor ao film noir. Em 1982, ele criou o filme que acabaria sendo um clássico cult da variedade neon noir, uma nomenclatura que acho genial, e, cinco anos depois, devotou-se a um neo noir que conta a história de Mike Keegan (Tom Berenger), um detetive recém-promovido da prestigiada 21ª Delegacia de Nova York, que se apaixona pela socialite Claire Gregory (Mimi Rogers), mulher que ele precisa proteger por ela ter testemunhado um assassinato. Bem casado com Ellie (Lorraine Bracco), com um filho e morador do Queens, Keegan parece ser afetado por uma espécie de choque social, entrando em um círculo endinheirado que ele jamais imaginaria que sequer vislumbraria, o que o leva a uma espécie de adoração pela bela Gregory e seu inacreditavelmente suntuoso no Central Park.

O roteiro de Howard Franklin que, no ano anterior, foi um dos que adaptou O Nome da Rosa para as telonas, é, muito sinceramente, básico, sem qualquer esforço para criar um texto realmente memorável ou que trabalhe os típicos clichês do gênero de maneira relevante. E parece que Ridley Scott sente isso, pois sua direção é igualmente básica, com poucas tomadas realmente interessantes como a que mostra Keegan entrando no apartamento de Gregory pela primeira vez e se perdendo em cômodos dentro de cômodos e espelhos que cercam tudo. O cineasta tem seu costumeiro ótimo comando de câmera e de enquadramentos, mas chega a ser frustrante o quanto sua narrativa visual, aqui, não tem apelo algum, beirando o cansativo e o repetitivo.

Tom Berenger, que se destacara no ano anterior como o Sargento Barnes, em Platoon, faz o que acredito ser seu último papel de real destaque e fica evidente o porquê: primeiro, ele não faz esforço algum para convencer o espectador de que é um detetive, algo em que o roteiro em nada ajuda por tratar o personagem como um sujeito que não só não segue regras básicas, como, também, não tem o menor bom senso e, segundo, apesar de contracenar com duas ótimas atrizes, não consegue nem por um segundo estabelecer química com elas. Cada cena em que Scott tenta nos convencer que o Keegan de Berenger está dividido entre seu amor pela esposa e a paixão pela amante é uma tortura quase risível. Cada cena de suposta ação com Berenger é como assistir a um dos Três Patetas fazendo besteira.

Perigo na Noite, que usa a famosa canção de George e Ira Gershwin diversas vezes ao longo da projeção (um licença, diversos usos) e reutiliza Memories of Green que Vangelis compôs para Blade Runner (também por economia, suponho…), é uma obra completamente esquecível na carreira de Ridley Scott, talvez a menos memorável desses primeiros 10 anos (A Lenda pelo menos tem maquiagem e efeitos práticos muito bacanas) , pelo que sua bilheteria sofrível faz bastante sentido. Sorte que o cineasta conseguiu reverter sua maré de azar já a partir de 1989, com Chuva Negra

Perigo na Noite (Someone to Watch Over Me – EUA, 1987)
Direção: Ridley Scott
Roteiro: Howard Franklin
Elenco: Tom Berenger, Mimi Rogers, Lorraine Bracco, Jerry Orbach, John Rubinstein, Andreas Katsulas, Tony Di Benedetto, Jim Moriarty, Mark Moses, Daniel Hugh Kelly, Harley Cross
Duração: 106 min.

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