Quem ainda tem paciência para histórias com tubarões perigosos a colocar seres humanos em momentos de puro horror? Pelo que pude contemplar por aqui, o cineasta Andrew Traucki é um desses, especialista em narrativas de horror aquático, isto é, filmes onde os seus personagens são colocados em situações adversas em meio ao ambiente natural. Ora tomado por tubarões, ora por algum obstáculo que coloca a sobrevivência humana em risco, este realizador australiano gosta de expor seus personagens ao perigo e deixar, nós espectadores, diante da contemplação de desafios que parecem aterrorizantes se acontecessem conosco, do lado de cá, na realidade. Em 2010, tivemos o primeiro Perigo em Alto Mar, uma trama interessante e conduzida com alguma emoção, sobre figuras ficcionais expostas aos perigos de um tubarão bastante enfurecido depois que todos se envolvem num acidente marítimo. A produção não é lá uma obra-prima do segmento, mas consegue delinear bem as suas propostas.
Na mesma época, conduziu o horror de uma família numa região australiana pantanosa, caçada por crocodilos após um desvio inesperado de rota que coloca todos em perigo. No geral, eis o cineasta representante do horror ecológico, o subgênero do cinema com seres humanos diante do desespero ao ter que lidar com as forças da natureza, nalguns casos, devidamente representada por animais antropomorfizados em assassinos. Competente em pontos de partida, Andrew Traucki, por sua vez, é péssimo para continuações, pois as duas vezes que retornou aos seus temas, demonstrou ineficácia na condução das tramas. Isso ocorreu tanto com Crocodilos: A Morte Te Espera, em 2020, e Perigo em Alto Mar 2, de 2022, sequências que tentam inserir alguma novidade no estilo, mas que resultam em produções tediosas e constrangedoras. Em duas narrativas, seguimos o fluxo do presente e as explicações para o passado. Observe.
Desta vez, a presença do tubarão perigoso não nos envolve, o motivo para a depressão da protagonista não é suficiente para a catarse, sendo a inteligente metáfora para o animal marinho como eco da masculinidade tóxica que tem ceifado a vida de mulheres cotidianamente no mundo inteiro também um recurso ineficiente, algo que destacarei no desfecho desta breve reflexão. Em seus 93 minutos, o filme nos apresenta as feras marinhas como obstáculos para a saga de quatro moças que decidem praticar um esporte aquático enquanto atravessam o mar para chegar até uma ilha do Pacífico. Nic (Teressa Line), a personagem central, sofre de um trauma recente, a perda de sua irmã, presente em flashbacks. Assassinada pelo companheiro agressivo, a garota não conseguiu ser salva pela familiar que tentou como pode tirá-la do ciclo de apreensão.
Em flashbacks, acompanhamos as motivações para o processo traumático da jovem enlutada. Junto, para tentar desanuviar e se esquecer dos problemas, Nic traz Annie (Saskia Archer), Jodie (Ann Truong) e Lisa (Kate Lister), as garotas que passarão por percalços agonizantes na tentativa de sobreviver ao monstro que habita as águas da região por ondem passeiam. Assim, temos um processo de produção que compreende a exaustão da temática e, para isso, resolver mesclar a aventura eletrizante (o que não é o caso deste filme) do horror ecológico com a crítica social sobre homens machistas perversos e agressores, associados aqui ao tubarão para o estabelecimento de uma metáfora que nem de longe é inadequada, mas por conta do desenvolvimento dos realizadores, naufraga nas intenções e fragiliza ainda mais a narrativa.
Ademais, além da estrutura dramática sem a devida coesão, Perigo em Alto Mar 2 é também insosso em sua composição estética: a direção de fotografia de Justin Brickle se esforça nas paisagens externas, mas isso é fácil, pois o cenário natural já fornece a base para o seu registro. O design de produção de Dylan Schenkeveld não possui muito trabalho a ser feito e a trilha sonora de Mark Smythe não empolga, burocrática ao extremo, mantendo as emoções da trama mornas e nada magnéticas, tal como os personagens desta aventura que ainda peca ao inserir crianças incautas no final, aparentemente para tentar remendar o que foi produzido para alcançar os 90 minutos de filme almejados pelos realizadores. Sobre os efeitos visuais, algo esperado numa aventura com tubarões, a decepção se estabelece: além de desinteressante, o vilão aqui é associado ao comum esquema de edição que mescla imagens reais de tubarões que não parecem em nada com a criatura desenvolvida pelos idealizadores. No geral, um tédio, mesmo que tenha em sua proposta um tema atual e associado inteligentemente pelo diretor que também assina o roteiro. Faltou, então, uma condução e finalização melhor.
Perigo em Alto Mar 2 (The Reef: Stalked, EUA – 2002)
Direção: Andrew Traucki
Roteiro: Andrew Traucki
Elenco: Teressa Liane, Ann Truong, Kate Lister, Saskia Archer, Tim Ross
Duração: 90 min