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Crítica | Paraíso Perdido, de John Milton

por Leonardo Campos
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Ler e analisar Paraíso Perdido, de John Milton, é uma tarefa árdua, no entanto, muito prazerosa diante de toda sua complexidade. Dentre as principais edições disponíveis para contemplação pelos leitores em língua portuguesa, a tradução do lusitano Antônio José Lima Leitão, de 1840, ainda é uma das disponíveis no circuito mercadológico. A versão publicada pela Martin Claret, luxuosa em sua capa dura belíssima, criada pelo design Wolney Fernandes, é um deleite para os interessados em seu conteúdo, mas desejam viajar pelos cantos de Milton por meio de um trabalho editorial atraente também para manter na coleção, haja vista o tom vermelho vibrante, em consonância com as temáticas abordadas nos versos dispostos ao longo das 512 páginas diagramadas por Giovana Quadrotti, um destaque que, convenhamos, faz toda a diferença para a leitura, pois o suporte de veiculação do material também é algo importante para quem curte literatura. Diante do exposto, realizadas as análises estruturais da publicação, vamos ao conteúdo deste poema intenso sobre a queda do homem e esfacelamento do projeto divino?

Sigamos. Com notas adicionais de Fabiano Seixas Fernandes, bem como um breve argumento que resume os principais conflitos de cada passagem das linhas gerais do projeto, Paraíso Perdido “narra”, ao longo dos seus 12 cantos (10 na edição de 1667, revisada e ampliada em 1674), o ardiloso momento de derrocada da humanidade, quando Satanás desafia o criador e promove a tentação entre Adão e Eva, conduzindo-os para o encontro do fruto proibido. É uma leitura enigmática, erudita e desafiadora do Gênesis, uma das passagens mais literárias da Bíblia Sagrada. Após ser expulso dos céus numa batalha com os arcanjos, Lúcifer, vulgo Satanás, acorda confuso e descobre que há uma criação de Deus, o homem, figura ideal para ser desviada e assim, demonstrar o quão desafiador esse antigo anjo se tornou, o líder das forças das trevas, comandante das legiões de demônios que assombraram o projeto divino e instituíram o inferno.

Com a tentação de Adão e Eva, temos a já conhecida e amplamente interpretada expulsão do Paraíso, alegoria para diversas correntes religiosas ainda no contemporâneo. Alijados da vida planejada após cometer o pecado da desobediência, Adão e a mulher criada de sua costela conhecem o pecado e a morte, vidas transformadas por escolhas que mudam para sempre as suas trajetórias. Por meio da radiografia destes acontecimentos fundadores de muitos dogmas na história da humanidade, John Milton versa sobre a busca pela redenção, a tirania dos monarcas de sua época, representados pela figura de Satanás, além de fornecer material de base para a nossa cultura iconográfica, tendo encontrado ressonâncias em Eugene Delacroix, Salvador Dalí, dentre tantos outros mestres das artes, encantados com a atmosfera sombria do poema. Anticatólico, avesso ao regime monárquico e com postura puritana firme, o sofisticado autor que ditou os seus poemas enquanto se encontrava acometido pela cegueira criou uma obra-prima conhecida, como já mencionado, por ser um desafio para o leitor contemporâneo, tamanha a força dos seus versos, envolventes e, concomitantemente, tomados por muita complexidade.

Para alguns especialistas, há um mercado brasileiro ideal para novas edições e traduções de Paraíso Perdido, um trabalho que levaria um bom tempo para ser executado, algo naquela linha de projeto de vida para o ofício do tradutor.  Ademais, ao tratar do Gênesis, livro sobre a criação do mundo, do ser humano, da nossa moral condutora, da queda e da tentação subjacente ao homem, John Milton também refletiu sobre Eva e seu desconhecimento no que concerne ao que hoje, movimentos discutem como a busca pela identidade. O divórcio, defendido pelo poeta, também está nas entrelinhas desta pomposa jornada poética que flerta com a celeuma do homem que não consegue seguir os ensinamentos e orientações divinas e acaba adentrando pelo terreno da corrupção. Sem rimas, isto é, com os versos brancos que para muitos não são atraentes, principalmente pelo fato de faltar musicalidade, algo que para Milton, poderia ser considerado uma simplificação da sua poesia, o poema reflete bastante do pensamento da época do seu autor, um homem erudito, de postura política firme e com escolhas literárias constantemente comparadas com Shakespeare, o dramaturgo e poeta quintessencial da língua inglesa, segundo Harold Bloom e outros críticos literários que seguem a tradição do Cânone Ocidental.

Paraíso Perdido (Reino Unido, 1667)
Autor: John Milton
Publicação original: Samuel Simmons
Editora: Martin Claret
Tradução: Antônio José Lima Leitão
Páginas: 512

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