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Crítica | Oxigênio (2021)

por Ritter Fan
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Filmes de um ator só (ou quase) passados em espaços confinados normalmente exigem mais da suspensão da descrença e dependem de reviravoltas a cada poucos minutos para manter o espectador devidamente engajado. E, claro, quanto menor é o espaço, mais esses fatores ganham saliência, já que podemos considerar tanto Dredd quanto Náufrago e clássicos como Janela Indiscreta e Doze Homens e uma Sentença como filmes dessa categoria, mas eles têm naturalmente mais maleabilidade visual e narrativa. Por seu turno, longas como Demônio, passado em um elevador e, mais relacionado ao caso sob análise, Enterrado Vivo, em que o protagonista e único ator passa o filme inteiro enterrado em um caixão embaixo da terra, precisam fazer muita ginástica para funcionar.

Oxigênio, longa francês dirigido por Alexandre Aja (responsável pelo remake de Piranha e Predadores Assassinos), com roteiro de Christie LeBlanc (em seu primeiro longa) e estrelado por Mélanie Laurent (a Shosanna, de Bastardos Inglórios), é, basicamente, Enterrado Vivo em um cenário sci-fi com a protagonista, uma mulher que acorda da criogenia sem saber sequer quem é, com apenas 35% de oxigênio, o que lhe dá mais ou menos a duração do filme – que não é exatamente em tempo real, mas quase – para sobreviver em seu casulo tecnológico, tendo como companhia, apenas, a inteligência artificial M.I.L.O., com voz modulada de Mathieu Amalric (O Som do Silêncio) para emular o clássico H.A.L. 9000. Ou seja, não tem como pedir espaço mais confinado que esse em filmes do subgênero, ainda que, diferente de outros casulos de criogenia que vemos em sci-fis, normalmente espartanos, este é repleto de funções acessíveis internamente, o que torna a narrativa gostosa de acompanhar, ainda que tensa, mas, claro, exige que aceitemos essa premissa sem discutir ou ficar incomodado demais.

Falar mais sobre os detalhes do longa é caminhar perigosamente pelo mundo dos spoilers, pelo que pararei por aqui. O mais importante é que o roteiro de LeBlanc funciona muito bem na forma como introduz novas informações sobre a situação da desesperada personagem de Laurent. Em linhas gerais, a estrutura é usar com parcimônia o conta-gotas de revelações na metade inicial da projeção, soltando-as com ritmo cada vez mais frenético na segunda metade, especialmente nos tensos 20 ou 25 minutos finais em que todas as peças começam a se encaixar de verdade. Como disse, a suspensão da descrença do espectador precisa estar ativada para aceitar toda a estrutura narrativa, mas o divertimento é garantido.

Na direção, Aja faz os malabarismos de câmera necessários para manter constante o fluxo de novidades visuais do casulo, começando com tudo quase que completamente no escuro e com a lente muito próxima a Laurent e, depois, lentamente, abrindo cada vez mais o plano de maneira claramente inspirada pela citada obra-prima de Sidney Lumet. Há também o uso de flashes de memória da protagonista na medida em que ela tenta lembrar alguma coisa de seu passado e o artifício da tela interativa – e com acesso à internet – de M.I.L.O., algo que não adoro, mas que é o instrumento que torna possível a história. Mas o que realmente se destaca e, em última análise, faz o longa funcionar, é o convincente trabalho dramático de Laurent, com uma variedade de sentimentos e sensações que vão invadindo a personagem e tomando-a completamente, seja desespero, felicidade, esperança ou confusão. Mesmo com a inclemência da câmera em seu rosto o tempo todo, ela não se esquiva de encarar os desafios e consegue criar literalmente do nada uma personagem muito interessante.

A estética sci-fi é clássica. A direção de arte não inventa e cria uma ambientação bonita, eficiente e, mais do que isso, familiar para o espectador, de forma que toda as informações básicas e necessárias para dar ignição ao longa estão presentes de imediato, sem enrolação, ainda que, claro, as reviravoltas (pouco importa se são fáceis de “adivinhar”, pois isso não é parâmetro para análise de filme, pelo menos não para mim) sejam devidamente preservadas para seus momentos próprios.

Oxigênio é uma competente e descompromissada diversão cinematográfica que deixará o espectador constantemente ligado com a narrativa e tenso com o drama impossível da personagem de Laurent. Nada como ter ataques de claustrofobia de forma vicariante, no conforto do sofá, com o confinamento absurdo e desesperador da premissa deste pequeno sci-fi francês.

Oxigênio (Oxygène – França, 12 de maio de 2021)
Direção: Alexandre Aja
Roteiro: Christie LeBlanc
Elenco: Mélanie Laurent, Mathieu Amalric, Malik Zidi, Laura Boujenah, Eric Herson-Macarel, Anie Balestra, Marc Saez, Cathy Cerda, Lyah Valade
Duração: 100 min.

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