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Crítica | Os Imperdoáveis (2013)

por Ritter Fan
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Chega a ser poético que Por Um Punhado de Dólares, o filme que revelou Clint Eastwood em definitivo ao mundo do Cinema, seja uma refilmagem, na forma de faroeste, de Yojimbo – O Guarda-Costas, clássico longa nipônico de samurai dirigido por Akira Kurosawa e que Os Imperdoáveis, faroeste de 1992 dirigido e estrelado por Eastwood que desconstrói a figura do pistoleiro que ele mesmo ajudou a erguer, tenha ganhado uma refilmagem, na forma de filme de samurai, em 2013, com o grande Ken Watanabe assumindo o protagonismo. O Oriente alimentou o Ocidente que, agora, alimenta o Oriente de volta, em um ciclo eterno e bem-vindo.

Dirigido e roteirizado pelo coreano nascido no Japão Lee Sang-il, responsável por Um Paraíso Havaiano e Vilão, a versão oriental de Os Imperdoáveis segue quase que integralmente, passo a passo, o roteiro original de David Webb Peoples, alterando o início, que usa como gatilho narrativo não o jovem pistoleiro que busca a ajuda de um veterano para matar dois homens que mutilaram uma jovem prostituta, mas sim o amigo do veterano, com o jovem entrando em seguida e o fim em que… bem, não vou dizer para não dar spoilers sem necessidade. Na verdade, minto, pois o roteiro também conta com uma linha narrativa que resvala no massacre e assimilação do povo Ainu (ou Aynu), grupo étnico nativo de Hokkaido, no norte do Japão, onde a ação se passa, inclusive inserindo essa cultura no seio da trinca que segue para matar os mutiladores.

Esse elemento diferenciador, se é que podemos chamar assim, não é, porém, muito bem desenvolvido no longa, que, mesmo investindo uma sequência inteira para lidar com a violência governamental do início do Período Meiji contra esse povo, existindo talvez muito mais para ecoar o massacre dos nativos americanos que só de muito longe é visto no longa de Eastwood e para justamente “justificar” o remake. Mas essa justificativa não só não cola, como era desnecessária. Apesar de pessoalmente sempre preferir filmes originais ou baseado em material não adaptado antes para o audiovisual, a história nos mostra que a prática de se fazer remakes pode gerar ótimos resultados, como inclusive é o caso do já citado Por Um Punhado de Dólares. E o remake nipônico de Os Imperdoáveis, apesar de não alcançar o nível da obra de Sergio Leone (ou de Eastwood), tem o seu valor pelo apuro visual do diretor e roteirista e pela potente presença e atuação de Watanabe como Jubei Kamata, lendário samurai que, com o fim do xogunato Tokugawa, foge para o norte do país, se casa e tem um casal de filhos, com o longa abrindo com ele mais velho, tendo abandonado a espada e a bebida em promessa à agora falecida esposa.

Diante de sua pobreza extrema, ele parte com seu velho parceiro Kingo Baba (Akira Emoto) e com o jovem Goro Sawada (Yūya Yagira) para conseguir o dinheiro da recompensa oferecida pelas prostitutas, tendo que enfrentar o cruel ex-samurai e comandante de polícia Ichizo Oishi (Kōichi Satō) que mantém a ordem em seu vilarejo proibindo a entrada de quaisquer armas, sejam brancas ou de fogo. Ao mesmo tempo em que vemos uma era em que os samurais perderam seu significado como instrumentos de guerra, vemos também a hesitante jornada de um homem que não quer voltar a ser o que um dia foi, usando a espada para ceifar vidas. O Jubei de Watanabe é, apesar de silencioso e sério, um homem sensível e ciente de que ele já cumpriu o papel que tinha que cumprir e que essa última missão é uma gritante quebra de promessa feita à sua mulher, mas ele não tem opção que não continuar em frente, seja por seus filhos, seja por seu estimado amigo.

A direção de arte é belíssima, com figurinos raros de se ver em obras audiovisuais do gênero por quase ser o “elo perdido” visual que marca exatamente o momento em que os samurais – homens com valores antiquados, usando instrumentos de morte mais antiquados ainda – abrem espaço para a polícia ou exército moderno. As espadas velhas e os quimonos puídos de Jubei e Kingo deixam isso bem evidente, especialmente quando em contraste com o ainda orgulhoso, mas extremamente ocidentalizado Ichizo que, mesmo ainda portando uma katana brilhante, veste-se como um pistoleiro de faroeste. Aliás, esse é um aspecto da direção de arte que me incomodou um pouco, sendo bem sincero, já que os cenários e grande parte do figurino fazem grande esforço para aproximar esse Os Imperdoáveis do original de 1992, ou seja, criando uma convergência visual talvez grande demais, algo que é amplificado pela fotografia grandiosa de Norimichi Kasamatsu, que se vale das filmagens em locação, com montanhas verdejantes e nevadas para emular o tipo de ambientação que esperamos ver em um western.

Por outro lado, Lee Sang-il parece encarnar o estilo dos combates que vemos em filmes de samurai de Kurosawa e Hideo Gosha, ou seja, tudo acontece muito rapidamente, sem glamour, sem que a morte ganhe destaque, apenas a técnica. Além disso, o diretor se esmera na excelente sequência da luta final de Jubei contra seu nêmeses e todos os seus minions, com uma decupagem visceral e que eu nunca vi antes, ao mesmo tempo mostrando a técnica e a animalidade, desorganização e desespero de Jubei em uma combinação inusitada, por vezes estranha, mas inegavelmente fascinante, com Watanabe realmente entregando-se ao momento.

A orientalização – ma non troppo – de um marco do faroeste revisionista americano é uma proposta que se segura em pé por seus próprios méritos, seja a direção diferenciada de Lee Sang-il, seja pelo elenco excelente ou pelas “pequenas diferenças” que acabam dando um gosto novo ao material já conhecido. Remakes talvez sejam quase sempre desnecessários, mas, volta e meia, com um pouquinho de esforço criativo, uma boa história pode ganhar uma segunda vida e uma segunda visão que vale ser conferida. E esse é definitivamente o caso aqui.

Os Imperdoáveis (Yurusarezaru Mono/許されざる者 – Japão, 2013)
Direção: Lee Sang-il
Roteiro: Lee Sang-il (baseado em roteiro de David Webb Peoples)
Elenco: Ken Watanabe, Akira Emoto, Yūya Yagira, Kōichi Satō, Shiori Kutsuna, Eiko Koike, Jun Kunimura, Yukiyoshi Ozawa, Takahiro Miura, Kenichi Takitō, Yoshimasa Kondo, Go Jibiki
Duração: 135 min.

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