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Crítica | Os Croods 2: Uma Nova Era

por Iann Jeliel
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Os Croods 2: Uma Nova Era

Os Croods enfim chegaram no “amanhã” que tanto procuravam, no caso, esse amanhã é o “hoje”. O reino da premissa de Os Croods 2: Uma Nova Era, comandado pelos Betterman, reimagina aquele cenário pré-histórico sob os moldes tecnológicos e intelectuais avançados da humanidade atual para refletir sobre o seu contexto social de constante polarização ideológica, mais especificamente em questões derivadas do “papel” de cada gênero, masculino e feminino, numa subversão da famosa “guerra dos sexos”.

O primeiro filme até utilizava-se da teoria da Evolução para propor um choque de contrastes entre dois personagens sobre a remodelação do papel da figura masculina “alfa” e como ele deve lidar com a mulher querendo ser independente, mas neste segundo, isso é apenas mais uma dentre várias ramificações adotadas em tom genuinamente levado para o lado satírico, de comentários sociais adversos no assunto, travestidos pelo universo ilusório, na dicotomia do ser ou não primitivo. Apesar de não ter um enfoque específico, um fio condutor narrativo como foi o arco de pai e filha para o levantamento dramático do antecessor, cada movimento de trama ou tirada humorística é acompanhada por esse questionamento da primitividade, em tom de embate geracional.

Fica evidente através dele o objetivo do roteiro em debochar das próprias alusões comportamentais implantadas nos plots, que teoricamente, na cronologia da humanidade, seguiriam conflitos de acordo com o que rege tendências patriarcais consolidadas em âmbito social, mas que são subvertidas pelo ambiente modernizado, já normatizador de certas questões. Cito como exemplo a inexistência de uma rivalidade feminina para “conquistar” um homem, quando Guy (Ryan Reynolds), vivendo romance com Eep (Emma Stone), volta a encontrar uma velha amiga, Dawn (Kelly Marie Tran), e isso não se torna motivo para troca de ciúmes, pelo contrário, ambas ficam empolgadas em se tornarem amigas, fato esse que leva a um próximo movimento de trama ainda mais interessante, onde Dawn questiona a superproteção dada pela sua família cessando sua vontade de viver aventuras fora do cercado que criaram, ou seja, é replicando o conflito que Eep vivia no primeiro filme, querendo sair da caverna.

Esse teor cíclico, readaptando conflitos anteriores para uma nova diretriz cômica/crítica, é replicado em outras situações na história. Grug (Nicolas Cage) ainda sente ciúmes de Eep e Guy, mas desta vez não é por ter sua liderança do bando em risco, ou sobre o fato de ela querer montar uma nova família, mas o inevitável desfazer dela posterior, algo ameaçado de desmanche também pelo fato dos outros membros desejarem aquele novo lar como fixo. Situação que o deixa emocionalmente abalado e é mote para fazê-lo interagir com Phil (Peter Dinklage), pai de Dawn, num diálogo sobre crescente quebra de inseguranças paternas/masculinas, comedindo a linha tênue pressuposta de uma amizade masculina com sinônimo de homoafetividade. A piada envolvendo as bananas é uma tirada extremamente inteligente e sutil para tirar sarro desse errôneo julgamento sobre machões que abrem o coração na “brotheragem”.

Enquanto isso, as mulheres, também separadas para interagirem num grupamento entre si, resolvem as diferenças entre as famílias, colocadas pelos homens na conservadora parcimônia de um não quer deixar a filha encarar o mundo sozinha, e outro querer arranjar o futuro da filha sob seus princípios, numa conversa bem mais prática atingindo um desejado equilíbrio entre os costumes selvagens e racionais dos dois – destaque para a personagem Hope (Leslie Mann) que demonstra isso no seu cabelo natural –, porque a união faz a força, seja feminina, seja a familiar. Se o primeiro filme ainda colocava no fim como herói da família o pai tradicional desconstruído se sacrificando para salvar todos e ainda conseguindo salvar a própria pele com muita bravura, nesse são formadas as “Thundersisters” para salvarem o dia e os machões de agora, emocionalmente abalados por trocarem verdades um com os outros suados e quase desnudos.

É verdade que a parte de ação parece inserida de maneira aleatória, afinal, os macacos “Minions” e o “Donkey Kong” chefão parecem não pertencer à história dos conflitos familiares, mas eles têm um fundamento satírico por trás, tão significante quanto ser o desafio para fornecer as transformações dos personagens de maneira prática, visto que os Betterman basicamente davam prosseguimento ao modelo de vida sustentável, porque alimentavam camadas sociais abaixo que trabalhavam por si. O que não deixa de ser um comentário aleatório mesmo, mas direcionado para um grau de devida comicidade. Há outras deslocadas sem qualquer aprofundamento temático, como a repetida piada da janela de Thunk (Clark Duke) remetendo ao vício alienado dos jovens em consumir telas de celular basicamente vazias de conteúdo, ou a língua dos macacos serem feitas através de tapas, piada sobre a violência ser disfarçada pelo “diálogo”, mas que em relance, elas estão ali realmente no fornecimento de entretenimento.

E Os Croods 2: Uma Nova Era é inegavelmente muito divertido! De modo que só a Dreamworks sabe fazer, com uma vulgaridade aleatória, aparentemente sem critério, mas muito significativa nas quebras de expectativas do seu proposital descontrole humorístico. Mais curto, objetivo e engajante que o primeiro, além de ligeiramente distanciado dele no tempo, a continuação ganha vida própria em uma “nova era” que logo chegará e deixará certos temas tão debatidos aparecerem frequentemente numa normalidade não necessariamente tão reflexiva ou dramática que merecem.

Os Croods 2: Uma Nova Era (The Croods: A New Age | EUA, 2020)
Direção: Joel Crawford
Roteiro: Kevin Hageman, Dan Hageman, Paul Fisher, Bob Logan, Kirk DeMicco, Chris Sanders
Elenco: Nicolas Cage, Emma Stone, Ryan Reynolds, Catherine Keener, Cloris Leachman, Clark Duke, Leslie Mann, Peter Dinklage, Kelly Marie Tran, Kailey Crawford, Chris Sanders, James Ryan, Gabriel Jack, Melissa Disney, Joel Crawford, Januel Mercado, Ryan Naylor, Artemis Pebdani
Duração: 95 minutos

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