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Crítica | O Senhor dos Anéis: Os Anéis de Poder – 1X01 e 02: A Sombra do Passado e À Deriva

O passado da Terra-média.

por Kevin Rick
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Assim como outro spin-off recente de um mundo de fantasia famoso, O Senhor dos Anéis: Os Anéis do Poder é situado milhares de anos antes dos eventos conhecidos de O Hobbit e O Senhor dos Anéis, com a história começando durante um período de relativa paz e posteriormente cobrindo todos os principais eventos da Segunda Era da Terra-média: a criação dos Anéis do Poder, a ascensão de Sauron, o crescimento de riqueza dos anões, os ancestrais dos hobbits e a última aliança entre Elfos e Homens. Não quero entrar em discussões de cronologia e cânone (não sou de importar com isso se tivermos uma boa história), mas é interessante ressaltar que esses eventos são inspirados nos apêndices dos livros originais, O Silmarillion e vários pedaços de textos clássicos e “perdidos” de J. R. R. Tolkien.

É importante começar a crítica falando sobre contexto, porque, bem, contexto é algo extremamente importante nos dois primeiros episódios da série. A partir da montagem inicial de A Sombra do Passado que explica os eventos que nos levam ao cenário da história, até o final de À Deriva, temos basicamente duas horas estabelecendo núcleos, introduzindo tramas e nos fazendo conhecer os personagens que iremos acompanhar. Por um lado, isso traz certos problemas de ritmo e uma narrativa que parece não progredir muito além de seus retrospectos históricos, easter-eggs, momentos nostálgicos e explicações de tapa-buracos de mitologia, mas temos uma introdução efetiva e eficiente, principalmente no que tange a apresentação de muitos personagens carismáticos.

Passando pelas versões mais jovens de Elrond (Robert Aramayo) e Galadriel (Morfydd Clark), até as novas figuras de Nori (Markella Kavenagh), Durin IV (Owain Arthur), Arondir (Ismael Cruz Cordova), entre outros, temos um elenco vasto e diversificado, encapsulando os elfos, os anões, humanos e os pés-peludos, ancestrais dos hobbits. Quem é familiar com o trabalho de Tolkien sabe de seu apreço por construção de mundo, descrições de paisagens, de criaturas, de povos e suas tradições, linguagem e modos de vida. Um dos elementos mais fascinantes deste universo é justamente o seu mundo, deixando uma responsabilidade complicada para a produção.

Pelo lado técnico, o seriado cumpre sua tarefa com louvor. Temos muitas locações, efeitos práticos e cenários deslumbrantes que dão uma bela sensação de imersão, ainda que uns momentos raros de tela verde aqui e ali sejam visualmente estranhos. A trilha sonora sinfônica de melodias, instrumentos e motifs clássicos oferecem ótimas peças musicais para situar o tom de grandiosidade da obra, assim como a direção de J.A. Bayona segue um estilo panorâmico para evidenciar espaços, horizontes e o meio de vivência dos povos. Sem dúvidas, o design de produção consegue transmitir o que O Senhor dos Anéis significa para o audiovisual: um grande espetáculo estético e cinemático.

Agora os roteiros não me convenceram tanto, apesar de perceber potencial. Tive algumas quebras de imersão na forma de alguns diálogos e interações ruins. Para o mérito dos roteiristas, é complicado capturar a mistura e naturalidade da elegância, fantasia, linguagem medieval e poesia que Tolkien traz nas conversas dos seus personagens, mas, aqui, o roteiro tenta compensar isso com um estilo de fala teatral que me estranhou em diversas momentos. Mas, no geral, nada muito negativo também.

Além disso, é possível notar apenas um pouco da essência de Tolkien no trabalho dos showrunners Patrick McKay e John D. Payne, principalmente no lado de mitologia e a escolha por personagens de diferentes cantos deste universo. No entanto, senti uma falta de originalidade no material, basicamente reciclando cenários e arquétipos, o que me decepcionou um pouco, pois Senhor dos Anéis sempre foi sobre o deslumbramento de cada parte da aventura, cada novo território descoberto na Terra-média. O romance de Arondir e Bronwyn (Nazanin Boniadi) parece tirado dos clichês de obras literárias do gênero YA, por exemplo. Se tudo é uma versão derivativa do que vimos antes, onde está a novidade da aventura, não é mesmo?

E isso me leva à minha principal crítica aos dois primeiros episódios: parece que a jornada ainda não começou. Não sei vocês, mas senti que vi dois episódios de ensaio, de explicações e elaborações para uma aventura que vai se iniciar. Vejo esse problema principalmente com o núcleo de Galadriel, onde o texto passa tempo demais explicando as motivações da personagem, seja vingança, seja manter o legado do irmão vivo. Eu até gosto da personagem, de seu conflito e do trabalho da atriz, mas é o bloco com Nori que mostra a essência deste universo com um olhar puro, curioso e inocente para uma grande aventura, seus mistérios (o ótimo enigma do homem estranho com poderes) e também seus riscos.

Como viram, tenho algumas ressalvas com o começo de O Senhor dos Anéis: Os Anéis do Poder, mas o saldo é muito positivo e a história é promissora. Os roteiristas levam jeito com personagens bem encantadores, cenários cômicos (adorei todo o bloco entre Elrond e Durin IV, por exemplo), uma ótima representação maniqueísta com esse mal à espreita, e também seguem à risca certas características de Tolkien, como os temas centrais de ganância e corrupção por poder (a Pedra Arken; os Anéis; a arma maligna do garotinho) e um grande escopo. Só estou sentindo falta do sentimento de aventura, de descobrir coisas novas que justifiquem a existência do seriado para além das respostas do passado e da mitologia. Veremos o desenrolar dos próximos episódios.

O Senhor dos Anéis: Os Anéis do Poder – 1X01 e 02: A Sombra do Passado e À Deriva (The Lord of the Rings: The Rings of Power –1X01 e 02: A Shadow of the Past and Adrift) | EUA, 03 de setembro de 2022
Criação:
J. D. Payne, Patrick McKay (baseado no universo de J. R. R. Tolkien)
Direção: J. A. Bayona
Roteiro: J. D. Payne, Patrick McKay (1X01); Gennifer Hutchison (1X02)
Elenco: Morfydd Clark, Will Fletcher, Lenny Henry, Sara Zwangobani, Thusitha Jayasundera, Maxine Cunliffe, Dylan Smith, Markella Kavenagh, Beau Cassidy, Megan Richards, Robert Aramayo, Benjamin Walker, Ismael Cruz Córdova, Geoff Morrell, Nazanin Boniadi, Tyroe Muhafidin, Charles Edwards, Daniel Weyman, Owain Arthur, Sophia Nomvete, Peter Mullan
Duração: aprox. 60 min. cada

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