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Crítica | O Que Há, Tigresa?

Você disse... salada de ovo?

por Luiz Santiago
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O Que Há, Tigresa? (1966) marca a estreia de Woody Allen na direção de longas-metragens, embora esta não seja uma obra original no sentido pleno. A Benedict Pictures Corporation adquiriu os direitos de um filme japonês da Toho e, com Allen responsável pelo roteiro e direção adicional, transformou o projeto em um exercício cômico que seguia uma prática já conhecida nos Estados Unidos: adaptar produções estrangeiras, redublando-as em inglês, muitas vezes com mudanças drásticas no roteiro, ou inserindo cenas filmadas nos Estados Unidos para alinhar o resultado às expectativas do estúdio. No caso de O Que Há, Tigresa?, essa estratégia foi empregada com o claro objetivo de criar uma sátira irreverente e cheia de maluquices. O roteiro faz troça da própria natureza do projeto — um ótimo exemplo disso é a cena inicial, com Allen “explicando” o processo de dublagem para o público, em entrevista — e abraça o absurdo em cada detalhe, entregando uma comédia que não envelheceu bem, mas que ainda é capaz de fazer rir.

O filme original, dirigido por Senkichi Taniguchi, segue a fórmula dos clássicos de espionagem à la James Bond, trazendo também os característicos momentos de sensualidade forçados… e estranhamente magnéticos. Sob a direção de Woody Allen, a trama virou uma sátira das aventuras de espionagem muito populares (e sintomáticas) na Guerra Fria. É essa atmosfera específica que pode fazer a produção parecer essencialmente aleatória para o público de hoje. A seriedade original, como se esperava, foi subvertida pelo humor, e o que antes era uma busca por um objeto de grande valor, tornou-se uma procura hilária por algo banal, que arranca boas gargalhadas, mas que demora muito para se construir e mostrar algo relativamente coerente em seu andamento. Além disso, as piadas, muitas vezes apoiadas em estereótipos asiáticos, causam certo desconforto, e combinadas com o humor típico da época, contribuem para a má digestão da fita.

O roteiro alterado gira em torno de Phil Moskowitz, um agente secreto em busca da receita de salada de ovo mais cobiçada do mundo. Este é o fino fio condutor para uma série de gags visuais, trocadilhos infames, edição sem sentido e piadas de gosto duvidoso que, novamente, são parcialmente engraçadas, mas trazem peso ético-moral e uma relação pouco orgânica com a ideia geral do filme, fazendo o fiapo de enredo oscilar entre sequências inspiradas e outras desastrosamente sem graça. A trilha sonora, composta pela banda The Lovin’ Spoonful, é um dos poucos pontos positivos constantes da produção, considerando a lisergia e a agitação da proposta fílmica. O mesmo não podemos dizer das atuações, que são colossalmente caricatas e sempre muito ruins, resultado possivelmente aumentado pela transformação das expressões e ações originais em pura fanfarronice.

O Que Há, Tigresa? é, em uma frase simples, uma curiosidade cinematográfica que diverte em partes, mas que não resiste ao teste do tempo. É um filme datado, com humor cheio de altos e baixos e uma trama pra lá de absurda, com praticamente todos os elementos narrativos e técnicos sofrendo com as escolhas tomadas para a criação da comédia com base em um filme sério de espionagem. Recomendo apenas para fãs completistas de Woody Allen, que desejam acompanhar a filmografia do diretor desde suas raízes, por mais obscuras que sejam.

O Que Há, Tigresa? (What’s Up, Tiger Lily?) — Japão, EUA, 1966
Direção: Woody Allen, Senkichi Taniguchi
Roteiro: Woody Allen, Frank Buxton, Louise Lasser, Julie Bennett, Len Maxwell, Mickey Rose, Bryna Wilson, Hideo Andô, Ben Shapiro
Elenco (vozes/dublagem original, em inglês): Woody Allen, Frank Buxton, Louise Lasser, Julie Bennett, Len Maxwell, Mickey Rose, Bryna Wilson
Elenco original (japonês): Tatsuya Mihashi, Mie Hama, Akiko Wakabayashi, Hideyo Amamoto, Susumu Kurobe, China Lee, Kumi Mizuno, Tadao Nakamaru, Tetsu Nakamura, Sachio Sakai, John Sebastian, Zal Yanovsky, Osman Yusuf
Duração: 80 min.

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