Se a graça da série O que aconteceria se…? sempre é modificar um evento do cânon, perde-se o gosto se a alteração não formular uma falta emocional geral e, ainda mais, não provocar consequências dificultosas para os super-heróis. O que aconteceria se Os Vingadores tivessem lutado a Guerra Kree-Skrull sem Rick Jones? pressupõe a ausência do personagem como motivação da história, como observa o Vigia na sua narração e repetição de uma vinheta para enfatizar a mudança de realidade entre duas páginas da revista. Uma decisão de Ronan com Rick torna-o mais vilanesco momentaneamente, deixando a guerra Kree-Skrull ainda mais perigosa para a Terra, e tirando uma porta de acesso que Mar-vell tinha com o uso da arma Kree chamada Omniondas. No entanto, tudo isso soa irrelevante para o drama da narrativa, com algumas reações de personagens, mas servindo mesmo para criar a oportunidade de colocar outros heróis da Terra e criar uma rainha Skrull.
É compreensível uma certa despretensão dentro da linha editorial de histórias alternativas, tratando momentos clássicos dos Vingadores como oportunidade de, quase 10 anos depois, recontar os eventos finais de uma guerra intergaláctica sem a pressão dos leitores que acompanhavam a série Avengers durante a década de 70. Assim, retirar Rick Jones da jogada, como um Deus Ex Machina empático de um vingador honorário para resolver uma guerra entre duas raças, retira o peso dramático e abre margem para o roteirista Tom DeFalco se divertir. No entanto, talvez o texto, junto com arte de Alan Kuppenberg emulando Neal Adams da edição #96 de Avengers, com uma certa limpeza excessiva na pintura de Carl Gafford, cria uma peça insossa; uma aventura repaginada sem intensidade.
Em princípio, a falta de Rick Jones na história testifica ainda mais como ele era um objeto funcional no original do que um personagem de fato. Mar-vell fica bravo ao descobrir a morte do jovem , clamando por vingança, e existe uma menção melancólica nas últimas páginas para dizer que ele é importante para os Vingadores. Mas para a trama em si, as alternativas encontradas para segurar a guerra Kree-Skrull não torna tudo mais difícil para os super-heróis; não afeta diretamente o drama da guerra, apenas tira o atalho de tensão para incluir Quarteto Fantástico, X-Men, Homem-Aranha, Inumanos e todos os personagens Marvel da Terra para uma união comum numa splash page do Professor Xavier telepatizando para eles um pedido de ajuda. Nem há ação num número considerável de quadrinhos para que esse enchimento do roteiro impulsione a leitura, que na verdade esvazia a trama.
O que antes era uma guerra que articulava o espaço entre Hala e o palácio Skrull e desmontava com Rick Jones como ponto de integração maior e intensidade, se torna apenas uma aventura entre os dois espaços, com algumas cenas de ação legais e imagens bonitas, bem colorizadas para serem bem chamativas com a enxurrada de novos personagens, introduzidos em uma meia dúzia de vinhetas. A ‘globalização’ da guerra, ao ponto de Thor pedir ajuda para Odin – após Homem de Ferro ficar fora de batalha, como uma tentativa de convencer a dificuldade da batalha sem Rick Jones – incrementa, mas não aprofunda nada. Até a trama de Visão, que é a constante dramática pela busca da Feiticeira Escarlate, parece deslocada. Também a confusão palaciana entre os Skrulls, envolvendo a princesa Anelle criando uma revolução para depor o pai, e o conflito da Inteligência Suprema dos Kree com o Ronan, por mais que sejam adições realmente interessantes do roteiro, são ainda superficiais para valorizar uma rainha Skrull e um novo corpo para o ser inteligente da história dos Kree.
O que aconteceria se Os Vingadores tivessem lutado a Guerra Kree-Skrull sem Rick Jones? é uma pergunta boa com uma resposta bem ruim. Quando a edição #97 de Avengers mostrou na sua capa Capitão América, Namor, Caveira Flamejante, Tocha Humana original e vários personagens da Marvel dos anos 40, e também havia uma splash page de ação com os personagens, tinha um efeito inusitado, surpreendente. Já a mesma ideia de chamar os Três Guerreiros de Asgard, chamar o Demolidor entre outros para uma guerra no espaço é uma alternativa comum, apenas para bater uma foto de como eles estavam numa guerra importante para o cânon da Marvel. Essa parece ser a real motivação dessa one-shot da linha O que aconteceria se…?, algo que nem é incomum para a proposta comercial, mas que se configura um desperdício, por propor uma foto legal sem o drama, sem preservar valor narrativo para incluir os personagens no lugar de Rick Jones.
What If #20: …the Avengers Had Fought the Kree-Skrull War Without Rick Jones? (EUA, abril de 1980)
No Brasil: Coleção Oficial de Graphic Novels Marvel – Clássicos n°37 (Editora Salvat, 2018)
Roteiro: Tom DeFalco
Arte: Alan Kupperberg
Arte-final: Bruce Patterson
Cores: Carl Gafford
Letras: Tom Orzechowski
Editoria: Dennis O’Neil, Mark Gruenwald
25 páginas