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Crítica | O Primeiro Que Disse

Comédia dramática italiana flerta com tensões familiares.

por Leonardo Campos
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Uma história sobre modelos de família. E também uma representação delicada e humorada sobre a saída do armário, tema cada vez mais discutido no terreno ficcional sem a atmosfera de horror que habitava qualquer filme sobre o assunto, do dramáticos aos cômicos. O Primeiro Que Disse, lançado em 2010, é uma comédia dramática que ao longo de seus 110 minutos, toca em temas profundos, mas com a leveza típica do cinema de Ferzan Ozpetek, realizador também responsável pelo texto, escrito numa parceria com Ivan Cotroneo. Na trama, acompanhamos Tommaso (Ricardo Scamarcio), um jovem que diferente dos demais membros da barulhenta família Cantone, não se envolveu nos empreendimentos locais e seguiu outra vida, algo que se encaixa nas sábias palavras de sua avó, personagem que ocupa aqui o arquétipo de mentora ao dizer afirmar que “se você fizer sempre o que os outros pedem, não vale a pena viver”.

Ele é apaixonado por literatura e escrita, diferente das vias desejadas por seu pai, Vincenzo (Ennio Fantastichini), a representação cabal do que podemos conceber por patriarcado, um homem que sempre tem a palavra final, senta na cabeceira da mesa de jantar e dá opiniões que precisam ser consentidas até mesmo por quem discorda. Tudo isso, como mencionado, é apresentado com leveza e humor, mas sem deixar os aparatos do cinema reflexivo de lado. Tommaso também não quer participar dos negócios da família no futuro, num suposto retorno para casa depois de sua estadia aventureira fora. Ele inclusive aguarda a resposta de uma editora para a publicação de seu primeiro livro. A sua volta para casa num breve período de férias, no entanto, foi planejada para dar conta desta agenda de revelações para a família.

A ocasião escolhida por Tommaso é o jantar comemorativo de Antonio (Alessandro Preziosi), seu irmão que atende aos anseios do pai e cuida das questões empresariais da família. Ele acabou de receber uma promoção e todos estão em ritmo de festa, afinal, o pai orgulhoso quer reforçar para o filho a sua aprovação diante do caminho que o outro, apaixonado por coisas que não lhe interessam, segui. O problema é que antes de começar a sua revelação, Tommaso é surpreendido por uma reviravolta perpetrada por Antonio. Ele faz a revelação do momento: é gay e quer seguir novos rumos. O pai, como já era de se esperar, despenca no dramalhão e vai parar no hospital com defasagem cardíaca. A sua mãe, Stefania (Lunetta Savino), faz de tudo para colocar ordem na situação. Luciana (Elena Sofia Ricci), o estereótipo da tia solteirona, assiste tudo subsidiada pelas forças das bebidas alcoólicas.

Tudo se transforma num típico festival de arquétipos italianos divertidos. Quem se destaca em toda a situação é a avó (Ilaria Occhini), mulher que no passado, teve uma história de rebeldia semelhante ao comportamento empreendido por Tommaso. Os acontecimentos são apresentados em paralelo aos conflitos da trama central, uma distração que pode frear as emoções em alguns momentos, mas não atrapalha substancialmente o resultado geral da narrativa. Agora, sem ter como fazer as suas confissões para a família, em especial ao pai, tendo em vista atender aos pedidos de conservação da saúde do patriarca, Tommaso segue e ainda precisa enfrentar outro desafio: a recepção inesperada do namorado e de seus amigos que chegam de surpresa na grandiosa casa da família. É quase impossível disfarçar as afetividades dos amigos e a paixão na troca de olhares com o seu companheiro Marco (Carmine Recano).

São desafios extras adicionados nesta narrativa com visual belíssimo, graças ao design de produção de Andrea Crisanti e a formidável direção de fotografia de Maurizio Calvesi, eficiente na captação dos dramas humanos nos planos mais fechados e poético ao abrir os enquadramentos em contemplar as paisagens naturais da mansão Cantone e de seus arredores. A boa condução musical ficou por conta de Pasquale Catalano, compositor que sabe dosar as emoções narrativas através de suas partituras. Diante dos dramas expostos, Tommaso segue com a missão de colocar as coisas em seus devidos lugares e seguir adiante com as suas propostas. A família que pretendia uma fusão com os proprietários de outro grupo para injeção de capital agora tem desafios mais íntimos para resolver, material dramático que conduz o filme até o seu desfecho. É um filme sobre a ida de encontro aos ditames da hipocrisia que ainda rege a nossa sociedade. E também é um painel de conflitos familiares bem ao estilo Mario Monicelli, um mestre na manipulação destas celeumas como material dramático para cinema.

O Primeiro que Disse (Mine Vaganti, Itália – 2010)Direção: Ferzan OzpetekRoteiro: Ivan Cotroneo, Ferzan OzpetekElenco: Riccardo Scamarcio, Alessandro Preziosi, Nicole Grimaudo, Lunetta Savino, Ennio Fantastichini, Ilaria Occhini, Elena Sofia Ricci, Bianca Nappi, Massimiliano Gallo, Daniele Pecci, Carolina Crescentini, Carmine Recano, Paola Minaccioni, Gianluca De Marchi, Mauro Bonaffini, Gea Martire, Matteo Taranto, Giorgio MarchesiDuração: 110 min

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