O Natal é um segmento no campo da ficção que rende anualmente um manancial de narrativas cômicas, dramáticas, de terror, além de render muitas séries e especiais televisivos. O Primeiro Natal do Mundo é uma das apostas brasileiras neste circuito cada vez mais abrangente em nossa cinematografia, com resultados positivos se comparado aos demais exemplares sobre as confusões dos personagens diante das situações adversas estabelecidas no período natalino. O elenco está bem entrosado, o humor, apesar de muitas vezes fora do tom, abraça o exagero de maneira a tornar o desenvolvimento da história mais cativante, e o epicentro do roteiro entrega uma perspectiva criativa para que a trama ganhe corpo: aqui, o Natal desaparece como num passe de mágica, sendo uma batalha dos protagonistas a caminhada em prol do resgata da magia desta comemoração anual de nosso calendário. Mais substancial que Um Natal Cheio de Graça e Ritmo de Natal, duas grandes produções recentes sobre o tema, este filme natalino diverte, emociona e traz também um amontoado de reflexões.
Dirigido por Susana Garcia e Gigi Soares, tendo como base o roteiro escrito por Julia Lordello, Carolina Minardi e Guilherme Ruiz, O Primeiro Natal do Mundo abre com duas narrações distintas, entrecortadas por uma eficiente edição. Neste percurso, enquanto a voz feminina reclama expansivamente sobre as situações do período, a outra voz, masculina, delineia como esta época do ano é mágica. Logo sabemos que se trata de Tina, interpretada pela ótima Ingrid Guimarães, e Pepê, interpretado pelo também talentoso Lázaro Ramos. Separados pelo shopping, eles se encontram mais adiante e somos informados da sua composição de casal. Ele, viúvo, tem duas filhas, e ela, divorciada, tem dois filhos. Juntos, formam uma família diversa e moderna. As diferenças se destacam logo nesta abertura: enquanto ele sonha em decorar a árvore ao chegar em casa, ela almeja que chegue rapidamente o dia 26 de dezembro.
Acompanhados pela trilha sonora de Berna Ceppas e captados pela assertiva direção de fotografia de Dante Belluti, a família passa pelos triviais momentos de um grupo com suas habituais diferenças. Os filhos mais velhos se desentendem constantemente, os dois mais jovens, de cada um, também vivem se engalfinhando. Fora isso, o casal ainda precisa lidar com a síndica do condomínio, Silvana (Fabiana Karla), personagem que ocupa aqui o ponto alto dos momentos cômicos, um talento natural da atriz que nalgumas vezes sobe o tom demais, mas não estraga a diversão, ao contrário, potencializa. Ela se torna a responsável por criar algumas situações que tiram a paz não apenas da família, mas de todos aqueles que gravitam em torno da sua existência múltipla: além de síndica, é produtora, dentre outras coisas mais.
Na arrumação para o Natal, uma das crianças se aborrece, vai para a janela do quarto e diz em alto e bom som que deseja que o festejo acabe para sempre. Pronto. A confusão está formada. Ao acordar no dia seguinte, o Natal sumiu e apenas a família formada por Tina e Pepê se dá conta disso. A decoração desapareceu, os emojis natalinos idem, ninguém se lembra da história do Papai Noel e todos os símbolos associados ao período se foram. O que fazer agora? É o que o espectador descobrirá ao assistir O Primeiro Natal do Mundo, uma comédia divertidíssima que refresca o nosso entretenimento com uma abordagem menos banal sobre o tema. Ao lutar para resgatar a magia natalina e dissociar da conexão exclusiva com as demandas capitalistas, Pepê e sua família vão atravessar situações arriscadas, absurdas, garantindo para o público um desfecho feliz, no entanto, nem um pouco fácil de ser alcançado.
O Primeiro Natal do Mundo (Brasil – 2023)
Direção: Susana Garcia, Gigi Soares
Roteiro: Gui Ruiz, Carolina Ruiz, Alessandra Gelman, Leandro Soares, Julia Lordello, Susana Garcia
Elenco: Lázaro Ramos, Ingrid Guimarães, Fabiana Karla, Igor Jansen, Yasmin Londuik, Theo Matos, Valen Gaspar, Cezar Maracujá, Rafael Infante, Wilson Rabelo, Stella Miranda
Duração: 93 min
