Home Diversos Crítica | Não para Sempre, mas Por Enquanto, de Chuck Palahniuk

Crítica | Não para Sempre, mas Por Enquanto, de Chuck Palahniuk

Presas e predadores.

por Ritter Fan
522 views

Não para Sempre, mas Por Enquanto (minha tradução do título original) é muito claramente um livro fruto da mente febril e consideravelmente doentia – no aspecto literário, claro – de Chuck Palahniuk. Sua marcas registradas estão fortemente presentes aqui, com um texto transgressor, ofensivo, depravado, carregado de “choque e pavor” que desafia o leitor a continuar a ler. Da mesma forma, seu estilo narrativo que se vale de muitas repetições, frases longas, capítulos curtos e uma estrutura que por vezes parece episódica toma conta integral de seu romance, o que deixa seus leitores no que eu poderia classificar como uma estranha zona de conforto.

Dito isso, porém, há limite para tudo e, no afã de turbinar ao máximo o nível de irreverência satírica doentia, Palahniuk acaba transformando Não para Sempre, mas Por Enquanto em uma obra cansativa, repetitiva e arrastada que demora demais a realmente achar seu foco e efetivamente contar uma história, algo que, em minha experiência aconteceu somente lá pela metade. E olha que estamos falando de um livro razoavelmente curto, de pouco mais de 250 páginas, mas que parecia ter pelo menos 750 recheadas do que pode ser descrito como a mesma coisa escrita de diversas maneiras (não tão) diferentes.

A premissa, porém, é curiosa e chamativa. Cecil e Otto são adultos-crianças (ou, sendo bem claro para quem tiver alguma dúvida durante a leitura, adultos que se acham crianças e são tratados como tais) privilegiados, extremamente cultos, mas também extremamente depravados e incestuosos que são os herdeiros e aprendizes do negócio de gerações da família, negócio esse que é cometer os mais variados crimes mundo afora, das mortes de Marilyn Monroe e Judy Garland ao atentado às Torre Gêmeas, com início, ao que tudo indica, na famosa Conspiração da Pólvora. Contado a partir do ponto de vista de Cecil, o irmão mais novo e, claro, narrador não confiável, o autor usa a premissa para, na superfície, falar sobre teorias da conspiração (a morte de Garland teria o objetivo de ocasionar Stonewall que, por sua vez, faria da comunidade LGBT massa de manobra de elites) e sobre o conflito de classes, mas, abaixo dela, também sobre vícios e sobre preconceito, mas sempre de maneira enviesada, como também é seu estilo.

Mas Palahniuk pesa a mão no romance e, depois que ele apresenta o leitor a Cecil e Otto, que treinam para ser assassinos matando basicamente quem eles querem, especialmente empregados de sua mansão no País de Gales onde moram com a mãe, e aos negócios da família comandados pelo avô, algo que ele fez por meio de uma estrutura anedotária, tudo começa a caminhar muito devagar, sem rumo e as repetições tornam-se muito mais salientes do que deveriam ser, tornando difícil até mesmo desbravar os curtos capítulos. É, trocando em miúdos, uma sucessão de assassinatos horrendos e atos de completa devassidão sexual que se esvaziam muito rapidamente da novidade e, portanto, de sua força narrativa. Nada contra uma boa dose de imoralidades, ignomínias e violência, mas não quando essa dose torna-se tudo o que se tem a oferecer e especialmente não quando as sucessivas doses são oferecidas muitas vezes com repetições quase literais de palavras, frases e situações anteriores.

É sem dúvida interessante a forma quieta como Cecil vai se tornando cada vez mais importante no romance, mesmo que Otto, admirado incondicionalmente por Cecil, seja constantemente o centro das atenções e, também, como a não-linearidade narrativa é tratada pelo autor, sem chamar muita atenção para si e funcionando mais como uma cola que traz sentido ao todo. Igualmente, gosto do final absurdista que afasta as lentes do recorte específico, permitindo ainda mais liberdades com o texto. No entanto, esses aspectos positivos acabam se perdendo em meio a uma falta completa de progressão na história, como um carro atolado que só faz espalhar lama para todos os lados sem verdadeiramente sair do lugar.

Não para Sempre, mas Por Enquanto é, sem sombra de dúvida, um livro que só poderia sair da mente de Chuck Palahniuk, pois seu DNA literário está todo aqui. O grande problema é que o autor parece ter escrito para ele mesmo, partindo de ideias soltas que ele reuniu quase que como em uma compilação de contos passados em um mesmo universo. Não funciona, portanto, como um romance completo e toda a perversão e subversão que são marcas do autor, além de todas as suas críticas, acabam soterradas pela repetição e pelo cansaço.

Não para Sempre, mas Por Enquanto (Not Forever, but for Now – EUA, 05 de setembro de 2023)
Autor: Chuck Palahniuk
Editora: Simon & Schuster
Páginas: 256

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais