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Crítica | Não Fale o Mal (Speak no Evil, 2022)

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por Felipe Oliveira
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A forma que Christian Tafdrup iniciou seu filme de estreia se fez interessante por oferecer uma espécie de aviso ao espectador toda vez que a trilha enervante de Sune Kølster entrava: era este o sinal de um terror iminente. A cena em si, de um carro em movimento em um caminho estreito, parecia um flashforward, mas era só um dos artifícios de Tafdrup para espalhar a sensação de inquietude. Em seguida, Não Fale o Mal, parecia mais convidativo ao introduzir a trama em um jantar entre famílias que termina gerando uma troca de contatos. Para um filme de terror psicológico, o longa dinamarquês usava como combustível a análise das tomadas de decisões dos personagens em situações aparentemente comuns. Algo que começa com um simples gesto de desocupar uma cadeira em um clube de piscina até sair em busca de um coelho de pelúcia denota o ponto chave para observação.

A escolha do título, que remete ao provérbio japonês “não veja o mal, não ouça o mal, não fale o mal” talvez seja o único paralelo que Tafdrup tenha aplicado em Speak no Evil, nesse caso o terceiro, ao apresentar a história de personagens que se submetem a subjugação ao omitir desconfortos, reprimir incômodos por uma questão de educação. Porém, notemos que essa característica parte da figura masculina, Bjørn, visto como o “homem da casa”, mas termina colocando a família em situações absurdas por não se posicionar. É engraçado que mesmo o longa tendo dedicado um momento de desabafo ao qual o Bjørn falava sobre se sentir um estranho, imponente, coadjuvante na própria vida, esperávamos por uma atitude que os tirasse do pesadelo que se encontravam – a cena da chave na ignição em que ele simplesmente não age, é um exemplo disso.

Logo, não é atoa a ideia para o título remeter a Iwazaru, o macaco mudo do provérbio japonês que simboliza o “não pronuncie o mal” quando um tópicos de Speak no Evil é a ausência de comunicação impressa na dificuldade de Bjørn em se expressar, mas também sobre sua passividade, tolerância e calma nas descobertas que faz. Se refletirmos todo o terror que Tafdrup conseguiu transmitir pela falta de reação do seu protagonista, podemos reconhecer Bjørn em pessoas que não sabem dizer um simples “não”, e nisso se coloca em situações que ultrapassam os limites. O teste para Bjørn partiu de uma inofensiva pergunta sobre uma cadeira, mas antes de qualquer ameaça externa, sua submissão começava por sempre atender às reclamações da esposa e da filha. 

É um jogo de observação que vinha dos psicopatas ao testar seus alvos até exceder os limites, enquanto que, para o espectador, o terror do intolerável e do desconforto fazia a experiência. Um trecho que ilustra muito bem como os personagens eram contrariados o tempo todo é na dança que se sucede em um bar. A palavra que define é “constrangedor” ao ver Bjørn e a esposa tentando acompanhar o ritmo sensual de outro casal; o momento era simples, mas era claro ao mostrar como o casal dinamarquês não consentia, e sim que eram submissos ao que não se encaixava mais como um fim de semana entre famílias e casais, ou seja, aceitando o papel que lhe foi imposto, designado. A trilha de Kølster surgia apenas para atenuar a tensão em momentos isolados, pois o texto de Christian e Mads Tafdrup era eficiente em ser desconcertante através dos diálogos e dificuldade dos protagonistas em se opor a situações desfavoráveis.

Mesmo com toda a eficiência de Tafdrup ao ter sustentado um filme numa experiência absurda, o que tirava o brilho de Speak no Evil foi por apelar para um caminho protocolar a fim de trazer um desfecho conflitante à obra, ainda assim, a abordagem densa e angustiante conseguia se manter, mesmo em trechos com visuais mais importantes. Vale acrescentar que, embora tenha se desenvolvido numa estrutura familiar jogando o terror de maneira sutil, no cotidiano dos personagens, Tafdrup sempre apontava para uma simbologia, nesse caso, o contentamento, a passividade, o silêncio representado no final brutal.

Não Fale o Mal (Speak no Evil – Gæsterne – Dinamarca, Holanda – 2022)
Direção: Christian Tafdrup
Roteiro: Christian Tafdrup, Mads Tafdrup
Elenco: Morten Burian, Sidsel Siem Koch, Fedja Van Huet, Karina Smulders, Liva Forsberg, Marius Damslev, Hichem Vacoubi
Duração: 94 min

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