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Crítica | Na Roda da Fortuna

por Roberto Honorato
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Você sabe, é para as crianças

Se você me pedir para fazer uma lista dos meus diretores favoritos, é certo que os irmãos Coen, Joel e Ethan, estarão nela. Com uma ótima filmografia, seu início de carreira já foi bem impressionante. Arizona Nunca Mais e Barton Fink – Delírios de Hollywood são inventivos, seus personagens são envolventes e o enredo é sempre cheio de surpresas e detalhes inteligentes que dão aquela sensação boa de querer assistir o filme várias vezes. E uma coisa que a dupla provou ser mestre ao longo dos anos é fazer comédias, principalmente de humor negro e absurdo, talvez com uma ênfase na palavra “absurdo”, mas é uma coisa boa quando você deixa uma obra na mão desses dois, por isso fiquei bem ansioso na hora de assistir Na Roda da Fortuna, uma produção que passa despercebida por muitos na hora de falar da dupla.

A enorme corporação Hudsucker acaba de perder seu presidente e seus associados precisam realizar um plano elaborado para tomar conta das ações da empresa. Enquanto isso, Norville Barnes (Tim Robbins), um jovem ingênuo e desastrado à procura de um emprego na cidade grande consegue um cargo no departamento de cartas da empresa. E é em Norville que encontram a resposta para seus problemas: fazer com que um idiota despenque as ações e deixe o preço baixo o suficiente para os engravatados poderem comprar sua parte. Mas esse plano não é perfeito e o jovem mensageiro pode não ter sido a melhor escolha, sem contar que agora a jornalista investigativa Amy Archer (Jennifer Jason Leigh) sente algo errado e decide conhecer melhor este novo presidente da Hudsucker.

Na Roda da Fortuna foi dirigido por Joel Coen (Ethan sempre foi creditado como produtor e isso só mudou em 2004, com Matadores de Velhinha) e o filme fez um ótimo trabalho em recriar a época, com todos os arranha-céus e os engravatados com planos malignos, e a direção de arte é uma maravilha, com um dos visuais mais fascinantes da filmografia dos Coen. A forma como a dupla brinca com o gênero das comédia corporativas com um pé no pastelão foi um dos maiores acertos do filme, e quando você lembra que Sam Raimi (aquele mesmo da franquia Evil Dead e a trilogia do Homem-Aranha estrelada por Tobey Maguire — ou seja, aquela que conta) é um dos roteiristas, pode esperar situações bizarras e a presença de Bruce Campbell no elenco, neste caso ele é Smitty, o colega de trabalho de Amy. E aproveitando o momento, dá para perceber a influência de Raimi em algumas partes da direção também, principalmente na cena onde Norville apresenta uma “carta azul” para a secretária e a câmera vem correndo na direção da funcionária que solta um berro aterrorizante. Mais Sam Raimi que isso, impossível.

Talvez o maior problema do longa esteja ligado diretamente ao seu estilo descompromissado e a comédia visual, que são ótimos e de longe a melhor parte do filme, mas isso tudo é basicamente a única coisa que impressiona e recebemos apenas a superfície do que a produção poderia ser. Sabe aquela coisa de estilo e substância? Aqui tem muito estilo, mas falta bastante da substância, o que é uma pena já que a equipe criativa é conhecida por criar personagens marcantes e um enredo que, por mais exagerado, tem um enorme coração durante todo o filme.

Nada na trama parecia ter tanta importância e o foco está apenas na tentativa de criar uma atmosfera e caricaturas convincentes. E o elenco não tem problema algum, o erro está nos personagens que não saem de suas características básicas. Se Tim Robbins convence com sua inocência logo de começo, isso não se mantém nos próximos minutos e em certos momentos seu Norville vai de ingênuo para incômodo já que o roteiro não fez questão de desenvolver ele além da caricatura. Felizmente, atores como Jennifer Jason Leigh e Paul Newman, como Sidney J. Mussburger, são tão bons e comprometidos em sua abordagem que passam a roubar todas as cenas e salvam seus personagens, mesmo com o pouco material que tem em mãos. Leigh é a jornalista durona de fala rápida e comentários sarcásticos e Newman é o típico chefe corporativo com um charuto maior que a própria cara. Mas se não fosse pela forma que Leigh fica indignada quando não percebem sua contribuição em algo ou como menciona seu Pulitzer sempre que possível, talvez não pudéssemos compreender sua personagem tão bem.

Uma dica que dou é que assista esse filme sem pesquisar muito sobre, os trailers e até o pôster podem entregar um pouco das surpresas que a história guarda. E são várias surpresas e brincadeiras visuais e truques que deixam a experiência bem melhor. Não mencionei ainda um detalhe narrativo porque considero mais impactante se assistido sem qualquer conhecimento prévio, mesmo assim, se você já sabe o que acontece, não estraga a experiência, no fim ainda é um filme bem divertido e provavelmente entra na categoria de produções dos Coen que você quer assistir mais de uma vez. Independente dos problemas mencionados anteriormente, a comédia funciona muito bem e a jornada não é nem um pouco cansativa, por mais que a premissa pareça batida.

Na Roda da Fortuna é criativo, louco, engraçado e cheio daqueles artifícios que fazem dos filmes da dupla uma boa experiência, mesmo que não seja tão memorável pela falta de cuidado em outros departamentos importantes, principalmente aquele responsável pela emoção. Pode não ser perfeito, mas vale a pena incluir ele na sua maratona dos Coen, ainda mais tendo em mente que logo depois, em 1996, tivemos Fargo, e eu nem preciso dizer como foi esse.

Na Roda Da Fortuna (The Hudsucker Proxy, USA, 1994)
Roteiro: Ethan Coen, Joel Coen, Sam Raimi
Direção: Joel Coen, Ethan Coen
Elenco: Tim Robbins, Jennifer Jason Leigh, Paul Newman, Charles Durning, John Mahoney, Bruce Campbell, Jim True, Bill Cobes.
Duração: 119 minutos.

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