- Há SPOILERS deste episódio e da série. Leia aqui as críticas dos outros episódios.
403 Forbidden foi assim: comecei a assistir, pisquei e aí o episódio acabou. Eu realmente não canso de me impressionar o quanto a direção de Sam Esmail flui à perfeição, de modo que a própria noção do nosso tempo vendo o episódio se dilui, parece que passa rápido demais, tamanha é a quantidade de coisas que temos na tela: a beleza com que essas coisas são expostas e a qualidade técnica de absolutamente cada frame dos episódios da série. Chega a ser perturbador.
Nesta semana, o roteiro de Courtney Looney fica um pouco atrás dos dois anteriores pelo simples fato de ter que nos trazer um capítulo aberto, fazendo a ponte entre um momento com revelação importantíssima (a terceira personalidade de Elliot, citada em 402 Payment Required) e a preparação para uma série de coisas em torno dessa grande revelação que, obviamente, um showrunner tão escrupuloso quanto Esmail jamais entregaria de bandeja já no episódio seguinte, com explicações didáticas, linha do tempo e pedidos oficiais de desculpa. Esse tipo de preparação não torna o episódio ruim (algo impossível em Mr. Robot), mas mina a sua força porque lhe faltam coisas para completar o ciclo narrativo. Não chega a ser uma armadilha de roteiro, mas é uma daquelas consequências chatas que frequentemente vemos em diversas séries.
Muitos momentos favoritos se acumulam aqui. Emocionalmente, tivemos aquela soberba parte inicial do episódio, com Whiterose contra a parede, tendo que lidar com impasses diante do despacho de seu projeto para o Congo e preferindo o ataque direto à escolha da paciência, o que, segundo sua assistente, pode lhe custar tudo. Essa temática foi plantada já em 401 Unauthorized e aqui, num capítulo inteiramente ambientado na véspera de Natal, temos espaço para um amor proibido na China dos anos 1980 e o que parece ser o início da jornada de Whiterose para aquela palavrinha mágica que ela disse lá na 1ª Temporada: hackear o tempo. A obsessão da personagem com esse aspecto da vida parece ir muito além do trabalho pelo trabalho ou por interesses pessoais de dominação. Uma sensação de culpa, perda, amor não cultivado e responsabilidade por um parceiro perdido é somado a esse pacote e, por mais clichê que isso seja, minha felicidade foi que o episódio não tornou o bloco um poço de melodrama, sabendo jogar muito bem com a tragédia amorosa e o sério e impessoal dilema tecnológico desses indivíduos na atualidade.
A minha cena favorita aqui foi a brilhante decupagem interna do quarto de hotel onde vemos Whiterose e o namorado. A disposição dos espelhos, o tipo de lente utilizada, o ângulo da câmera e a maneira como o diretor move o centro de atenção do público são aplaudíveis, e juntam-se àquela passagem da câmera na grua, indo do lado branco das rosas para o lado manchado de vermelho pelo sangue do parceiro de Whiterose, minutos depois. Vale também citar a belíssima disposição das luzes e o tralho da direção de arte no bar onde Elliot encontra Olivia Cortez (funcionária do banco do Chipre, que ele pretende hackear para atacar Whiterose) e posteriormente no banheiro dessa mesma personagem, onde uma luz direta, de filtro laranja, incide sobre os personagens que confessam seus vícios e sofrimentos um para o outro. É de cortar o coração, tanto pelo conteúdo, quanto pela atmosfera criada esteticamente.
O encadeamento do plano geral da temporada parece avançar da maneira mais estranha possível (no bom sentido), com todo mundo fazendo grandes movimentos, mas com consequências que não conseguimos entender imediatamente. Talvez por isso venha o meu impasse com a justificativa de Fernando Vera para tentar encontrar Elliot. Por um lado, faz sentido diante do plano do criminoso, mas por outro parece… vindo do nada esse desejo, especialmente se considerarmos o passado dos dois. Já foi levantado aqui mesmo, na parte de comentários do site, a possibilidade de Vera ser a outra personagem de Elliot, mas como ainda estamos falando de hipóteses, a única forma correta de analisar o que nos é apresentado é assumindo aquilo que o diretor nos quis mostrar no momento. Quando vierem as revelações, a gente dá nome aos bois e liga os pontos, afinal, não somos os roteiristas aqui.
O final desse episódio é tão tenso, que o espectador sente aquele estranho medo de um perigo real que se pode ver através da janela. A trilha sonora vira apenas um zunido macabro (cellos e baixos fazendo o seu papel de puxar a alma do ouvinte) e a ameaça está dada. Aqui, duas possibilidades: ou ninguém está ouvindo e Elliot só está preocupado demais… ou alguém realmente está ouvindo e Tyrell Wellick começou com o pé errado a sua relação profissional com Whiterose. Independente do que vier, etá claro que coisa boa não deve esperar na esquina…
Mr. Robot – 403 Forbidden (EUA, 20 de outubro de 2019)
Direção: Sam Esmail
Roteiro: Courtney Looney
Elenco: Rami Malek, Carly Chaikin, Martin Wallström, BD Wong, Elliot Villar, Christian Slater, Dominik Garcia, Jing Xu, Eugene Shaw, Ross Kurt Le, Jas Anderson, Gloria Reuben, Adam Garcia, Ajay J. Perez, Dean Scott Vazquez
Duração: 47 min.