Episódio
Temporada
SPOILERS! Leia a crítica para as temporadas e episódios anteriores aqui.
E eis que a Terceira Temporada de Mr. Robot chega ao fim. Existem duas formas de avaliar este momento da série, então começarei pelo episódio Shutdown, isoladamente, e seguirei pelos elementos da temporada e como este capítulo faz jus ou fica aquém do prometido e esperado do show este ano.
Como peça única, o Finale foi mais uma hora de pura qualidade e tensão oferecida por Sam Esmail, que mais uma vez dirigiu e escreveu o enredo. Um dos pontos mais sutis e muito interessantes que aqui tivemos foi, enfim, um acordo pacífico entre Elliot e Mr. Robot, não no sentido simples da coisa, destratando o fato de o personagem ter um distúrbio de múltipla personalidade, mas colocando isso como parte orgânica dele, em seu cotidiano, fora de uma luta de resistência e tentativas de controle que marcaram a temporada (e a série, de certa forma). Esse aspecto teve o seu momento de brilhar e ainda bem que terminou no momento certo, antes de parecer apenas um joguinho enjoativo e repetitivo.
Continuando as sugestões de Stage 3, Shutdown realiza o devido afunilamento de tramas estavam espalhadas, aparentemente resolvendo algumas de uma vez por todas (Irving se foi de vez?), incrementando outras e abrindo algumas possibilidades que no montante da temporada não parecem muito claras, o que contribuiu para a nota final um pouco menor do que eu gostaria de ter dado. Ao longo de todo o processo, porém, Esmail manteve a composição de planos inclinados ou com personagens descentralizados, dentro do desconforto que ele tanto utilizou nas temporadas 1 e 2, mas isso não impediu que existisse um padrão cinematográfico envolvido, especialmente na qualidade das tomadas e na edição simplesmente bárbara, realizada a quatro mãos por Justin Krohn e John Petaja, ambos já envolvidos previamente com a série.
Cada bloco vai encontrando sua grandeza a partir de uma montagem de atrações e conflitos que opõe momentos de confissão (Price é o pai biológico de Angela) com gore e tensão à toda prova (Irving dando machadadas em Santiago e toda a sequência no celeiro), tendo alguns poucos trechos de contenção de expectativas e pausa para algo enigmático, com destaque para a cena em que vemos Whiterose na banheira assistindo à ação no celeiro, falando “wo ai ni” para o seu então braço direito do momento e utilizando a mão de obra de Elliot para conseguir finalizar — ao menos é o que parece — os seus planos em relação ao Congo. Cada peça de ação nestes momentos da série faz o nosso coração acelerar e recebe no roteiro pequenas indicações políticas (com direito a citação à Marx e problematização realmente angustiante e necessária sobre as consequências de se desfazer o hack de 9 de Maio) e nuances dramáticas que fazem Dom uma personagem ainda mais interessante e nos convida a pensar sobre como as ações de Elliot e Darlene influenciam negativamente (e para sempre) a vida das pessoas à sua volta.
Assinada por Tod Campbell (fotógrafo oficial da série e de quem já conhecemos o trabalho de shows como Sleepy Hollow, Togetherness e alguns capítulos de Stranger Things) a direção de fotografia mantém todo o temor da morte e de um mundo contaminado por grupos de interesses distintos e pendor à corrupção através de uma paleta de cores escuras, com filtro cinza para o domínio central de todas as maiores incidências de luz e cor ao longo do episódio: verde, marrom, branco e azul. Com uma montagem ágil e dentro da dinâmica “pingue-pongue” que fortalece a atração visual, essa presença dominante de cor em cada bloco e a identificação geral através de uma coloração cinza dá uma tremenda sensação de unidade, uma boa composição visual para um episódio cheio de dilemas morais, sociais e econômicos que nos fazem pensar no nosso próprio mundo e como essas decisões de mexer com a economia de fato acontecem, via mega empresas, e que assim como os personagens terciários do show, não temos absolutamente nenhum controle sobre isso, a não ser sofrer as consequências de coisas que nos enganamos ao dizer que controlamos através da democracia, mas que nas últimas décadas não tem sido assim, porque os Estados não são mais apenas um corpo político de poder único. Eles são também uma grande feira de compra e venda de pessoas, governos e destinos de nações.
E é aí, nesse macro plano social, que chegamos à visão geral da temporada um pouco abaixo do que esperávamos. Embora o episódio final funcione perfeitamente de maneira isolada, é difícil encaixá-lo com a mesma perfeição no montante, especialmente no destaque para o que mais intrigou o público aqui: o real plano de Whiterose. Para mim, a grande decepção da temporada foi plantar raízes nesse núcleo e deixá-lo para ser desenvolvido de verdade apenas no quarto ano sem nem ao menos um glimpse do que a questão do Congo de fato significa. Em vez disso, tivemos um baita “momento WTF”, com a volta de Fernando Vera (por quê? Qual é a deixa aqui, Sam Esmail?), um verdadeiro anticlímax.
Alguns espectadores vão sentir falta de Tyrell Wellick aqui, algo que entendo perfeitamente e até compartilho o sentimento de falta, mas consigo entender o foco do showrunner para este episódio, então é algo que não teve um real peso negativo para mim. A aparição final do personagem anteriormente deu a entender um futuro reinício de arco e estava quase certo que isto não seria aqui na Terceira Temporada.
Cheia de episódios memoráveis e com um final que poderia fazer muitíssimo melhor se compararmos com tudo o que tivemos de bom ao longo do ano, Mr. Robot sai para um hiato e promete trazer uma quarta temporada com um novo começo, agora que o hack foi desfeito e Elliot está em paz consigo mesmo. Isoladamente, o episódio final foi excelente. No escopo da temporada, é como aquela refeição tremendamente saborosa que vem apenas uma porção para alimentar uma criança de 4 anos e você não deixa de pensar: “está muito bom, mas não era para vir só isso não“.
Mr. Robot – 3X10: eps3.9_shutdown-r (EUA, 13 de dezembro de 2017)
Direção: Sam Esmail
Roteiro: Sam Esmail
Elenco: Rami Malek, Carly Chaikin, Portia Doubleday, Michael Cristofer, Grace Gummer, BD Wong, Bobby Cannavale, Christian Slater, Omar Metwally, Grant Chang, Joey Bada$$, Joseph Mckenna, Hailie Sahar, Daniel Morgan Shelley
Duração: 47 min.