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Crítica | Morte Morte Morte (2022)

Um cômico whodunit sobre a geração Z.

por Felipe Oliveira
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Algo que marcou as expectativas em torno de Morte Morte Morte é de que o segundo filme da diretora Halina Reijn viria para fazer uma sátira de terror sobre a era digital. A forma com o que o roteiro de Sarah DeLappe começa a traçar o terreno que irá espelhar esse escopo é algo sugerido em poucos minutos através de Bee (Maria Bakalova): tímida, ansiosa por ter se mostrar sociável, e antenada em acompanhar os movimentos de internautas nas redes sociais. A notável insegurança na sua relação com Sophie (Amandla Stenberg) ganha um contraponto quando elas chegam à grande mansão para um momento de curtição com seus amigos: eles, os corpos submersos numa piscina, é como se estivessem muito bem definidos em suas bolhas em comparação às parceiras, que aparentemente não foram convidadas.

É curioso como antes do roteiro entrar na zona de tensão entre os personagens, a direção de Reijin acompanha a perspectiva de Bee, a única desconhecida. Os planos abertos dando o tom para como ela transita naquele espaço também desconhecido, é fundamental para como a sua personalidade vai sendo estabelecida junto a dinâmica de explorar a ambientação. Em oposição à visão superficial de Bee aos amigos de Sophie, Reijin insere em sua execução um breve zoom in em alusão ao desconforto da protagonista em ter que interagir com o grupo enquanto se força a comer um pedaço de bolo, o que é mostrado num plano mais fechado.

Para envolver a trama no forro whodunit, o texto de DeLappe chama de morte morte morte o jogo cuja inspiração vem de Werewolf, Among Us e Enemy of Board, games populares que trazem a mecânica de desvendar quem dentre os personagens é um traidor, um lobo fazendo vítimas inocentes, ou suspeitas ocultas que só serão descobertas no fim do mistério. Mas vejamos como pouco a pouco a configuração que denota um ambiente virtual vai sendo montada, ao menos de maneira representativa. Primeiro, temos o anúncio de uma tempestade que se aproxima, o que impede que a reunião de amigos seja feita na área externa da mansão, depois, o que motiva o início do jogo é um leve momento de ciúme, entretanto, as desavenças omitidas não demoram a pipocar no que deveria ser uma descontraída rodada de bebidas e trama de assassinatos entre amigos que passa a se mostrar além do jogo quando um deles aparece morto.

O que fecha essa organização, é a chegada da tempestade que faz a energia cair e passamos a ver os personagens se movendo por um espaço escuro, exceto pelas lanternas de seus dispositivos móveis definindo toda a dinâmica do que poderá ser visto na grande casa. Embora a fotografia de Jasper Wolf seja habilidosa para compor essa estética, equipada a balada experimental da música de Disasterpeace, um arranjo eletrônico carregado de uma tensão excitante, a direção de Reijin começa a perder pontos quando não consegue brincar com o whodunit que tem em mãos.

À medida que mais corpos aparecem, o roteiro busca plantar a dúvida entre os personagens, alternando o jogo de suspeitas. Contudo, estamos diante de um whodunit que não consegue ser envolvente pela maneira que é conduzido, nem mesmo ser tenso pelo fato de que alguém começou a levar o jogo a sério demais. As mortes, a movimentação que leva a descoberta dos corpos, nada atinge um impacto suficiente para embarcarmos na mesma sintonia dos personagens. Apesar de falhar nessas escolhas, o roteiro acerta ao aproveitar muito bem o elenco com destaque para Rachel Sennott e na maneira que tece uma sátira ao comportamento da geração Z no meio virtual.

Muito desse acerto é por DeLappe entender a linguagem virtual e usar aqui de maneira inteligente, sem apelar para uma abordagem hiper expositiva ou envoltos numa metalinguagem. Assim, conseguimos identificar que os diálogos se assemelham de forma hilária a uma thread problematizadora do Twitter com uma acidez muito bem dosada para como os personagens aplicam as frases prontas, as deduções, o jeito como tudo é dito  — ao caráter que se assume nos comentários de uma postagem no Instagram dada a forma banal com o que as mortes vão sendo tratadas pelos personagens: não importa a gravidade da situação, ela vai sendo engolida pelas discussões estúpidas e inseguranças vindas de suas relações cada vez mais líquidas.

O desfecho serve para coroar a genialidade com que o humor funciona no filme, muito mais bem-vindo que a mistura satírica de terror e comédia que não acerta na tensão pretendida. Também, é a graças a forma debochada que esse final é apresentado que Bodies Bodies Bodies recebe a garantia de que não será resumido a um surto coletivo de muitas expectativas para algumas piadas sobre os arquétipos virtuais.

Morte Morte Morte (Bodies Bodies Bodies – EUA, 2022)
Direção: Halina Reijn
Roteiro: Sarah DaLappe (baseado numa história de Kristem Roupenian)
Elenco: Maria Bakalova, Amandla Stenberg, Rachel Sennott, Chase Sui Wonders, Myha’la Herrold, Pete Davidson, Lee Pace, Connor O’Malley
Duração: 94 min.

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