- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série e das outras obras do MonsterVerse.
Eu realmente queria muito poder dizer que Paralells and Interiors continua a tendência de melhoria que a série vinha apresentando ao longo de seus três primeiros episódios. No mínimo eu teria adorado afirmar que o ponto de equilíbrio alcançado em Secrets and Lies manteve-se aqui, mas a grande verdade é que o quarto episódio da temporada defenestra o que de melhor Monarch tinha, que são, de um lado, a narrativa no passado e, de outro, o bom uso de Kurt Russell no presente. O episódio até é o que mais teve minutagem de monstro até agora, mas nem isso conseguiu fazer dele algo apreciável para além da linha mediana.
Sendo justo, eu imaginava que a ameaça da toupeira gigante que parece absorver calor seria resolvida rapidamente, em coisa de poucos minutos logo no começo do episódio para economizar computação gráfica, mas eu me enganei. Fiquei até surpreso pelo titã aparecer tantas vezes e, ainda por cima, sem que a direção de fotografia recorresse sempre à escuridão para esconder eventuais falhas de renderização. Sem dúvida Julian Holmes e a produção como um todo merece pontos positivos nesse aspecto. Por outro lado – e aí é que os os problemas começam -, o bicharoco apenas parece estar por ali, passeando, convenientemente não sendo atraído por Lee Shaw e os três jovens sem que outras fontes de calor mais notáveis estejam presentes.
Com isso, Parallels and Interiors acaba demonstrando, em escala menor, um dos maiores problemas dos filmes de kaiju em geral, que é a quase que total incapacidade de se equilibrar a interação dos monstros com os humanos, ou, talvez melhor dizendo, como fazer com que a presença humana seja mais do que um detalhe na narrativa se não houver pelo menos um humano ou pilotando um mecha como em Círculo de Fogo, ou se transformando em um super-herói gigante como em Ultraman, ou utilizando algum equipamento militar relevante como um jato ou um tanque de guerra. O que acontece, aqui, é que a toupeirona só anda para lá e para cá e o roteiro não consegue fazer uso de um expediente narrativo que ele tinha absolutamente tudo para fazer, que é transformar Lee Shaw naquilo que ele deveria ser mesmo em sua versão anciã (ou especialmente nessa versão), ou seja, um sujeito badass invencível que tem solução para absolutamente tudo, mesmo que seja uma solução completamente improvável que exija uma frota de caminhões de doze eixos de suspensão da descrença do espectador.
Kurt Russell deveria estar na série para isso e, em Secrets and Lies, seu personagem ganhou essas habilidades que tornaram possíveis ele fugir de onde estava e, sem documentação, sem dinheiro e sem nenhum tipo de equipamento especial, levar três jovens do Japão até o Alasca. Bastava que Milla Bell-Hart tivesse se inspirado nisso para fazer algo muito mais interessante do que ele sugerir andar “na direção do oceano” ou aceitar que Kentaro se separasse do restante do grupo, não chamasse atenção de Amy para a imbecilidade que é pisar em gelo transparente ou não fizesse mais do que botar fogo em tudo ao seu redor em um momento de desespero e sem o menor critério. O episódio tinha tudo para fazer da versão Matusalém de Lee Shaw um sujeito capaz de lutar contra um kaiju desses usando algo como a hélice do avião destroçado ou criar uma armadilha realmente bem pensada que levasse a algum tipo de resultado que não dependesse de Kentaro aleatória e magicamente chegar em um helicóptero para salvar todo mundo.
E, narrativamente, parece que toda a “aventura na neve” não passou de pura enrolação, pois a única informação tirada dela foi que Papai Hiroshi está vivo, algo que já havia sido determinado pela existência daquela barraca no meio da tundra. Afinal, vamos combinar que aqueles flashbacks sobre como Kentaro, o artista, conheceu Amy, a hacker, só serviram mesmo para encher linguiça e reafirmar a linguagem de “novela da Globo” com draminhas pessoais diante de um cenário apocalíptico em que monstros atômicos gigantescos vagam pela Terra. No final das contas, o hilário mesmo é que Cate, de coadjuvante insuportável, foi rebaixada a extra com duas linhas de diálogo, ainda que a sinopse do próximo episódio indique que ela também ganhará seus “momentos de flashback“.
Sem espaço para lidar com as aventuras de Lee Shaw jovem nos anos 50 e fazendo do Lee Shaw velho um mais do que subutilizado personagem aleatório de cabeça branca que não sabe muito bem o que fazer diante da ameaça da toupeira, Parallels and Interiors dá dois ou três passos atrás na progressão de Monarch: Legado de Monstros. Não que isso não possa acontecer em séries, pois acontece até com constância, mas o problema é que ela sequer havia realmente mostrado a que tinha vindo com seus episódios anteriores. Tomara que o showrunner tenha mais ambição do que a que foi mostrada aqui, caso contrário seu legado será pífio.
Monarch: Legado de Monstros – 1×04: Parallels and Intteriors (Monarch: Legacy of Monsters – EUA, 1º de dezembro de 2023)
Criação e showrunner: Chris Black
Direção: Julian Holmes
Roteiro: Milla Bell-Hart
Elenco: Anna Sawai, Kiersey Clemons, Ren Watabe, Mari Yamamoto, Anders Holm, Wyatt Russell, Kurt Russell, Joe Tippett, Elisa Lasowski, Christopher Heyerdahl
Duração: 42 min.