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Crítica | Moby Dick em Pop-Up, de Sam Ita

Uma deslumbrante tradução intersemiótica do romance de Herman Melville

por Leonardo Campos
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Os livros pop-up são publicações que adotam uma estrutura lúdica de amplo potencial artístico e pedagógico. Pensado como conteúdo para o público infantil, na verdade este tipo de material consegue alcançar maior faixa de leitores. Os primeiros exemplares, por exemplo, datados do século XIV, foram produzidor para os adultos, focado em ilustrar os avanços dos estudos científicos que afloravam na época. Astronomia, medicina e outras áreas utilizaram de seus recursos para vislumbrar melhor as maravilhas de descobertas que mudaram a história da humanidade, isto é, a relação do homem com os fascínios do conhecimento. Nestes livros que remontam aos princípios da estética barroca, o leitor desenvolve habilidades cognitivas e linguísticas por meio de mecanismos visuais, verbais e táteis, com base tridimensional envolvendo mãos e olhos, ação e reação, descoberta e desejo. Com terminologia originada do inglês, pop-up em tradução significa “saltar pra frente” e, nesta publicação, mergulhados no saltar de misterioso universo de Moby Dick, tradução do romance homônimo de Herman Melville.

Para quem não conhece a estrutura narrativa do livro, apresento um breve panorama para maior compreensão da publicação pop-up analisada por aqui. Inspirada numa história real de aventura, horror e sobrevivência, o romance tem como figura narradora o jovem Ismael, um aventureiro que faz amizade Queequeg, um homem não-civilizado conforme os ditames cristãos e, juntos, embarcam num navio baleeiro direto do porto de Nantucket. Nesta viagem, o propósito aparente é caçar baleias para extração de espermacete, valioso para a produção capitalista do período. Há, no entanto, uma mudança de rumo. O Capitão Ahab revela que seu interesse não é econômico, mas uma vingança pessoal contra a baleia que nomeia o livro, cetáceo que numa ocasião anterior, ceifou uma de suas pernas e estabeleceu o seu ódio mortal. Nesta empreitada, eles acabam naufragando depois de um ataque furioso do animal, situação que sela o destino de todos, com exceção de Ismael, o jovem que fica para contar a história.

Sobre a tradução pop-up de Moby Dick, podemos destacar que esta edição veiculada no Brasil pela Publifolha, em 2009, capricha na organização das abas, janelas, volantes e demais recursos de montagem de um livro que traz em sua abertura, uma página dupla que promove o movimento e faz com que determinados elementos recortados e dobrados sejam levantados para formação de uma figura tridimensional. Com movimentação que requer interação, muito além do que o passar de suas páginas, as abas, persianas, volantes e demais recursos estabelecem uma movimentação empolgante que acaba logo, mas sintetiza muito adequadamente os principais pontos do romance inspirado no trágico naufrágio do Essex, em 1821, história que deu muito o que falar na época e ainda hoje, ganha releituras em diversos suportes narrativos.

O livro é dividido em seis grandes passagens, uma adaptação traduzida por Bruno Salerno Rodrigues, profissional que tem como base, o excelente trabalho de Sam Ita, lançado originalmente em 2007. Primeiro, contemplamos o baleeiro e a história de Queequeg, um personagem que ganha destaque na abertura, para logo depois, acompanharmos o sermão do Padre Mapple, a famosa passagem do romance sobre a história de Jonas, figura bíblica que desobedeceu aos mandatos divinos e acabou indo parar no interior de um enorme animal marinho, criatura que muitos interpretam como sendo uma baleia. Interessante a inserção deste trecho do romance, pois quem conhece Moby Dick sabe que o autor teceu a narrativa com diversas simbologias religiosas. Mais adiante, temos a apresentação do Capitão Ahab, imponente e centralizado no meio da página, grandioso perante as demais figuras ficcionais que gravitam em torno de sua presença. É com ele e por ele que toda tripulação passa os perrengues em alto-mar.

Logo mais, o livro nos oferta a continuidade da travessia, antecipando o ataque da baleia cachalote branca e misteriosa, com suas cicatrizes que representam os embates anteriores com caçadores que tentaram a todo custo, aniquila-la para extração do óleo de baleia que funcionava como matéria-prima básica para a indústria da época, antes da descoberta do petróleo como novo recurso natural de exploração capitalista. Por fim, o audacioso projeto da Neo9 Design traz a sobrevivência do narrador Ismael, desfecho de uma história trágica sobre indivíduos em busca de ascensão social. Vitimados pelo destino avassalador, causado pela fúria de Ahab, uma figura multifacetada, de grande complexidade literária e filosófica, focado em enfrentar a inevitabilidade do destino e as forças da natureza, tudo em vão.

Moby Dick (Moby Dick/Barcelona, 2007)
Autor: Sam Ita
Editora no Brasil: Publifolha
Tradução: Bruno Salerno Rodrigues
Páginas: 7

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