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Crítica | Moby Dick em Cordel, de Stelio

O clássico de Herman Melville pelo viés dos versos da literatura de cordel.

por Leonardo Campos
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Um clássico romance estadunidense traduzido para os versos de cordel brasileiro. Uma publicação e muita beleza, bem como excelência em seu processo de tradução. Composta por Stelio Torquato e com xilogravuras de Lucélia Borges, Moby Dick em Cordel foi publicada em 2019, com um deslumbrante projeto gráfico assinado por Maurício Mallet, uma apresentação de Marco Aurélio, lançada pela Editora Nova Alexandria. Integrante da coleção Clássicos em Cordel, ao longo de suas 49 páginas, nós adentramos por uma imensidão de versos que nos deixa sem fôlego de tão empolgante, tal como a leitura do romance ponto de partida, escrito por Herman Melville e publicado em 1851. Ideal também para propostas pedagógicas de introdução ao universo do cordel e ao romance posicionado no período que a crítica literária denominou de Romantismo, temos aqui um conteúdo visualmente atraente, substancialmente desenvolvido em seus aspectos literários, publicação que precisa ser desvendadas por todos os amantes da literatura e da cultura. Um livro que você não sabe se apenas lê ou se “canta junto”.

Sigamos. Breve e envolvente, Moby Dick em Cordel traduz o volumoso romance em versos estruturados por um design que mescla tons verde água, azul, branco e linhas pretas expressivas. Com uma capa que privilegia a baleia cachalote que nomeia o livro, temos ilustrações focadas em Ismael, Capitão Ahab e no cetáceo conhecido por transformar a jornada de todos os personagens desta história clássica de aventura e muita filosofia. A literatura, um campo de intenso fluxo para debates e reflexões sociais, tem nesta publicação um exemplar digno para ilustrar esta tarefa da arte em questão. Ganância humana, meio ambiente (um tema não discutido no século XIX), a irracionalidade da obsessão de Ahab, a vingança que promove não apenas perda de riquezas de uma jornada que é puro capitalismo, mas também a perda de vidas e muito sofrimento. Todos estes tópicos, caro leitor, são encontrados por aqui.

No entanto, distribuídos em adaptados versos de cordel, uma manifestação literária portuguesa que se desenvolveu no Brasil e ganhou bastante espaço no território de produção cultural nordestino. Ariano Suassuna, Guimarães Rosa, João Cabral de Melo Neto: estes nomes integrantes do cânone, em suas fases mais profícuas, trouxeram o cordel como potência para a composição de suas principais obras. Tradição literária regional conhecida por seus versos, o cordel traz em sua estrutura elementos da linguagem oral, bem como métrica e rima com doses generosas de humor. Impresso em folhetos e com capas que trazem xilogravuras estampadas, ficaram célebres pela disposição em feiras, pendurados em barbantes ou cordas, daí a origem de seus nomes. Esse formato básico, por sua vez, passa longe de Moby Dick em Cordel, uma obra impressa num material sofisticado, cores vibrantes e xilogravuras belíssimas.

Tomando as liberdades comuns ao processo de tradução intersemiótica, o livro nos apresenta o Capitão Ahab logo em suas primeiras páginas, sem criar o suspense que a maioria das adaptações geralmente estabelece, preocupadas em manter o máximo de paralelo com o romance de Melville, a tal da questionável fidelidade. Ademais, tendo uma breve biografia do escritor estadunidense na abertura, Moby Dick em Cordel nos apresenta o começo da saga de Ismael, o encontro com Queequeg, o sermão do padre Mapple sobre Jonas e sua desobediência castigada por Deus, a obsessiva jornada de Ahab e sua ida para as profundezas depois do embate com a baleia cachalote branca.  Tudo isso, sem deixar de flertar com as diferenças culturais, as questões econômicas, os traços psicológicos dos principais personagens, o tom de aventura ideal para tornar a leitura mais acessível ao público em geral, além das ações de figuras ficcionais que, tal como dizia Nietzsche, são “demasiadamente humanas”. E, com isso, as idas e vindas de seus desejos e paixões fulminantes, embarcados rumo ao desfecho apoteótico

Moby Dick em Cordel (Brasil, 2019)
Autor: Stelio Torquato Lima
Editora: Cosac Nova Alexandria
Xilogravuras: Lucélia Borges
Páginas: 48

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