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Crítica | Moby Dick (2010)

Uma versão do clássico de Herman Melville pelo prisma trash do estúdio The Asylum.

por Leonardo Campos
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Um clássico com quase 200 anos e que rende debates até os dias atuais, sempre revisto por prismas diferenciados. Assim é Moby Dick, o volumoso romance de Herman Melville, narrativa sobre a obsessão do Capitão Ahab, um arquetípico personagem envolto na redoma da vingança, apresentado ao público pelo ponto de vista de Ishmael, a figura responsável por nos contar a história que basicamente retrata a saga de pescadores de baleias levados para as mais profundas regiões do planeta, inicialmente guiados pelo desejo de enriquecimento, mas que, na verdade, eram partes do plano do capitão que pretendia dizimar a cachalote que certa vez, arrancou-lhe uma perna. Por meio desta base estrutural, o livro de Melville traz um panorama de interpretações sobre religião, multiculturalismo, racismo, economia, dentre outros. As suas traduções para o cinema e televisão, produzidas em contextos variados, entregam aos espectadores apenas a ponta do iceberg, ou talvez, a calda da baleia, rapidamente para fora na superfície do oceano, pois a adaptação da complexidade deste clássico provavelmente não seja alcançada nem por uma novela global com mais de 100 episódios. É muita coisa, acredite.

Em 2010, no entanto, realizadores do estúdio The Asylum, conhecido por narrativas trash no cinema contemporâneo, resolveram criar a sua versão para Moby Dick, incrementando na trama todos os absurdos típicos deste tipo de produção. Antes de adentrar na história em si, gostaria de tecer alguns comentários para o leitor sobre o meu ponto de vista em relação aos filmes que possuem esta iniciativa. Desde já, nenhum preconceito com o trash, ao contrário, a sua existência nos permite muitos instantes de gargalhadas. Impossível não assistir esta versão de Moby Dick e rolar de rir com a série de exageros apresentados. Para quem conhece o ponto de partida literário ou ao menos algumas de suas traduções cinematográficas mais “sérias”, provavelmente compreenderá o que estou delineando. Filmes trash se tornaram produções de consumo cult, ou seja, assistida por muitas pessoas que reconhecem a sua falta de qualidade dramática conforme os padrões estabelecidos no mainstream. Efeitos visuais abaixo de um orçamento pomposo, elenco com desempenhos dramáticos menos exigentes, montagem com diversos problemas de continuidade, dentre outros, caracterizam este tipo de conteúdo.

O seu público, no entanto, é amplo. São narrativas, em especial, as produzidas pelos executivos da empresa em questão, The Asylum, responsáveis por produzir filmes inspirados em situações absurdas, nalgumas vezes, focadas em histórias que recentemente deram certo em realizações de grande orçamento. O tom, sempre paródico, fica mais engraçado quando os envolvidos tentam levar a jornada numa perspectiva mais séria. Ai entram os embates entre serpentes e crocodilos, tubarões de duas ou três cabeças, insetos gigantes e, neste caso, uma versão turbinada de um ser já considerado de enormes proporções e riscos: a baleia cachalote de Moby Dick. Em seus 90 minutos, o filme dirigido por Trey Stokes, também responsável pelo roteiro em parceria com Paul Bales, traz para o público a vingança do Capitão Ahab (Barry Bostwick), homem que perdeu a sua perna em 1969, depois de uma missão submarina situada na corrida nuclear entre Estados Unidos e União Soviética, situação apresentada logo na abertura. Jovem, ele alerta os seus superiores, mas ninguém acredita que o moço tenha visto o tal monstro, até o momento do ataque ceifar a vida de todos e estabelecer o caos. Ele, no entanto, sobrevive. Mas fica irado.

Corta para o tempo presente. Encontramos a pesquisadora Michelle (Renee O’Connor), a substituta de Ishmael por aqui, envolvida em sua observação de baleias. Interceptada por um submarino que aparece do nada, ela é obrigada a entrar na embarcação, pois o misterioso Ahab deseja algo da sua experiência para conseguir derrotar Moby Dick, uma baleia que aparece fora da água, em suma, faz tudo que os animais dos produtores da linha The Ayslum propõem, com direito até ao som de touros. Ademais, esqueça os arpões. Há armas nucleares, metralhadoras e torpedos, diálogos bizarros, aparições grotescas do monstro, aqui apresentado pelos efeitos visuais da equipe supervisionada por Mark Kochinski, num filme que também é um horror em seu design de produção e direção de fotografia. Nem a trilha sonora, algo já esperado, satisfaz, trabalho assinado pela dupla formada por Chris Ridenhour e Serhat Eftekin. Em linhas gerais, um filme para ver e, assim, crer. Contando nunca será a mesma coisa. E mais: passagens rápidas demonstram consciência de quem escreveu sobre a complexidade do romance de Herman Melville, em especial, nas piadas sobre racismo e nos toques sobre a cor da baleia e sua relação com alegorias religiosas, ser comparada ao Diabo, inimigo do cristianismo.

2010: Moby Dick (Moby Dick) — EUA, 2010
Direção: Trey Stokes
Roteiro: Paul Bales
Elenco: Barry Bostwick, Renee O’Connor, Michael Teh, Tom Rachford, Matt Lagan, Carl Watts
Duração: 90 min.

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