Home Diversos Crítica | A Escolha do Assassino (Mistérios do 87º Distrito #5), de Ed McBain

Crítica | A Escolha do Assassino (Mistérios do 87º Distrito #5), de Ed McBain

por Luiz Santiago
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Mais uma vez temos uma introdução escrita por Ed McBain para um de seus livros que nos dá uma ótima visão de contexto, fazendo-nos conhecer a história editorial da obra e as motivações por trás da escolha do autor que não necessariamente tiveram algo a ver com as suas ideias originais para Os Mistérios do 87º Distrito. Neste quinto volume da série, intitulado A Escolha do Assassino (também conhecido como Afinal, Quem Foi Annie?, em edição brasileira), descobrimos que o autor teve que criar um “personagem-herói” porque o mesmo editor que o impediu de matar Steve Carella em O Traficante do Vício, dizendo que “não se podia matar o herói do livro“, agora chegava à conclusão de que Carella não era o herói coisa nenhuma.

Essa discussão editorial nos faz pensar bastante sobre as escolhas que se fazem na esteira de publicações em qualquer tipo de obra ficcional, especialmente quando falamos da condução de personagens. A nova diretriz para McBain era apresentar uma novidade ao leitor, um policial que precisava ter as características essenciais do herói literário de então (na verdade, de sempre), ou seja, um policial que fosse jovem, bonito e solteiro. Carella tinha todas as “qualidades certas” mas não era necessariamente jovem, não era necessariamente bonito e já era casado, inclusive muitíssimo apaixonado pela esposa, o que o colocava “fora de ação” no quesito de ser desejado por um grupo de leitores e também de ser admirado por outro.

E assim surgiu Cotton Hawes, detetive transferido do 30º Distrito policial, após a morte do agressivo Roger Havilland, na primeira parte do livro. Apresentado como alguém interessante, mas não exatamente alguém que o leitor se sente à vontade logo de cara, o jovem e belo detetive vem de um Distrito Policial de alta classe, onde os crimes eram bem menos impressionantes e onde o número de assassinatos era uma piada de mal gosto se comparados ao do 87º. Todos os ingredientes de aprendizado do personagem são colocados na mesa, e é durante esse processo que o leitor vai percebendo a humanidade desse indivíduo, que comete erros (como bater na porta de um criminoso antes de entrar e quase matar o detetive mais querido e respeitado do Distrito, por exemplo) mas apesar do orgulho, está disposto a aprender.

Na outra ponta dessa investigação da morte do policial Havilland temos uma investigação genuinamente interessante e que vai atrair por completo a atenção do leitor, por se tratar do típico “quem matou?” com um tempero humano e também cínico. A vítima da vez é Annie Boone, encontrada com quatro tiros no peito e muitos cacos de vidro em seu corpo e ao seu redor, resultado da destruição que fizeram na loja de bebidas onde ela trabalhava. A cena é terrível e a descrição que o autor faz do ambiente nos permite criar com vivacidade a cena, pensando no forte cheiro de álcool e no sangue correndo por todo o chão molhado e repleto de cacos.

O curioso nessa investigação é que o autor resolve encurralar os detetives, reservando para o final a resolução do caso com uma conclusão moral que me fez lembrar um pouco do conceito desenvolvido em Punição para a Inocência, de Agatha Christie, fazendo-nos pensar nas implicações que um assassinato pode trazer para a família da vítima, além de uma reflexão sobre a real culpa do crime. Evidente que o assassino é o culpado do ato, mas muitas vezes essa é apenas uma parte da culpa, e é isso que McBain nos traz à reflexão ao final desse volume.

Em A Escolha do Assassino o público é apresentado a um bom número de visões sobre uma jovem mulher. Para alguns, ela era uma inteligente e espirituosa companhia. Para outros, apenas uma bêbada manipuladora. Essas diferentes visões tornam a construção do quebra-cabeça sobre a vítima algo bem interessante e instiga o leitor a procurar ainda mais coisas, mais causas ocultas nas entrelinhas do assassinato. Uma daquelas tramas que mesmo quando terminam, nos dão a impressão de que não terminaram, tamanha é a organicidade e fluidez com que o autor trata os acontecimentos e como aplica um interessante senso de continuidade, preparando o terreno de forma muito inteligente para o próximo capítulo da série.

A Escolha do Assassino (Killer’s Choice) — EUA, 1957
Série:
Os Mistérios do 87º Distrito / 87º DP (87th Precinct) – Livro 5
Autor: Ed McBain
219 páginas

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