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Crítica | Meu Amigo Dahmer

por Pedro Cunha
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O que você faria se soubesse que um antigo amigo foi preso por ter cometido diversos crimes hediondos, incluindo assassinato, canibalismo e estupro? Derf Backderf ficou tão impactado quando recebeu a notícia sobre os assassinatos cometidos por Jeffrey Dahmer, seu antigo colega de escola, que decidiu contar as origens desse vilão da vida real. E já que Derf é ilustrador, é fácil entender o porquê dos quadrinhos terem sido escolhidos como a mídia para essa narrativa.

Todo esse trabalho do autor resultou em Meu Amigo Dahmer, (primeira HQ da Editora Darkside Books). Como já dito anteriormente, a HQ conta a origem de um dos serial-killers mais famosos da história. Acompanhamos, então, a adolescência de Dahmer, um menino que vivia na cidade de Bath, Ohio, que tinha um lar completamente desestruturado, com uma mãe que sofria de doenças mentais e não as tratava, um pai que estava mais preocupado com seu trabalho do que com seus filhos e seu irmão, que não é de grande importância para a história do quadrinho.

Derf Backdert é um grande nome do cenário de quadrinhos underground dos Estados Unidos, muito devido a essa obra e sua predecessora Punk Rock & Trailer Parks. É notável a influência do estilo na narrativa de Derf, vemos páginas com uma narrativa de ação para ação, muito comum nos quadrinhos americanos. Além do bom uso de preto e branco, da proporção que cada personagem, com seus focos de ação como mãos e pés, possui em cada quadro.

É louvável todo o trabalho de pesquisa feito para este quadrinho, no final da edição da Darkside vemos que quase toda a página possui um sumário, dando a fonte para as situações ocorridas na trama. Derf pesquisou em entrevistas, livros, diários de memórias e em muitos outros lugares. Além de deixar bem claro suas fontes, o autor evidencia as suas motivações para escrever a obra; logo no começo ele cita “tenha pena, não empatia”, referindo-se a Dahmer.

Onde estavam os adultos? Esse é o questionamento que Backderf faz em diversos momentos da sua narrativa. O autor quer, com esse questionamento, provocar o leitor, fazendo-o não ser complacente com aquilo que ele presencia no seu cotidiano. Derf mostra através dessa pergunta outra auto-motivação para escrever o quadrinho.

Com um trabalho de pesquisa tão extenso, era de se esperar que o roteiro de Meu Amigo Dahmer fosse, no mínimo, interessante e pode-se dizer que ele é, entretanto, ele não consegue ser nada além disso. Derf é um ótimo ilustrador, mas falha muito como roteirista, sua narrativa é repetitiva, carregada e excessiva, cheia de frases que explicam aquilo que o leitor já entendeu durante a sua observação dos quadros. O autor também gosta de dividir diálogos que não precisavam ser divididos, mas isso é algo compreensível e passível de boa interpretação, já que ele quer causar uma impressão de lentidão em toda a sua história.

Backderf compensa suas falhas de roteiro com uma narrativa gráfica excelente, é notável o esmero que o autor possui quando vai desenhar cenas que Dahmer é protagonista, aqui vemos um ótimo trabalho de composição, Derf pensa em qual ângulo deve retratar a cena, no ambiente e nas proporções. Cada quadro tem sua própria reflexão, essa que o leitor é capaz de chegar sozinho, mas que Derf faz questão de narrar aquilo que está sendo mostrado, subestimando assim a capacidade de interpretação de seu público.

Outros aspectos da arte dignos de serem mencionados são as cores e as luzes, o quadrinho é em preto e branco, a falta de cores mais vivas dão muito valor à mensagem que o autor gostaria de passar, mostrando um personagem sem cor, com uma vida carregada de escuridão. Quando um quadrinho não faz o uso das cores, ele deve fazer um excelente uso de luz e Derf consegue fazer bom uso delas, vemos quadros nos quais ele ilumina Dahmer de forma macabra e impessoal, dando mais destaque ainda às formas estranhas de sua arte.

Meu Amigo Dahmer é um quadrinho que possui um roteiro muito ciclotímico, que repete tanto que acaba sendo ofensivo para seu público. Mas que possui uma narrativa gráfica assaz interessante, transformando uma HQ média em uma história reflexiva. Dahmer está longe de ser um herói, mas não é por isso que sua história não deve ser contada, muito pelo contrário, olhemos para Jeffrey Dahmer para nunca mais sermos complacentes com algo que está nitidamente errado.

Meu Amigo Dahmer (My Friend Dahmer) — EUA, 2012
Roteiro: Derf Backderf
Arte: Derf Backderf
Editora original: Harry N. Abrams
Data original de publicação: 2012
Editora no Brasil: Darkside Books
Data de publicação no Brasil: 23 de maio de 2017
Páginas: 288 Páginas

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