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Crítica | Menina Afegã: Uma Verdade Revelada

por Leonardo Campos
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Na era previa ao advento da internet e das redes sociais como suportes comunicacionais dominantes, muito do que sabíamos sobre outras culturas se origina dos documentários, das reportagens televisivas, do cinema e em muitos casos, da fotografia jornalística. Os fotojornalistas nos trouxeram imagens dos campos de batalha, de desastres ecológicos, de passeatas em prol da democracia, em suma, a cobertura visual para ser complementada pelo texto, justapostos para expor as condições sociais, políticas e culturais da humanidade enquanto o século XX avançava diante de tantas turbulências. Primeira e Segunda Guerra, Vietnã, impactos ideológicos entre russos e estadunidenses, simbolicamente chacoalhados em 1989, com a queda do muro de Berlim, dentre tantos acontecimentos globais que se transformaram em capa de revistas, edições comentadas ainda hoje, na cultura digital, como é o caso da National Geographic e sua capa de junho de 1985, com uma misteriosa jovem afegã, de olhos esfuziantes e enigmáticos.

A foto da menina afegã, mote do documentário em questão, pode não ser reconhecida em todas as suas peculiaridades estéticas e históricas, mas se você é parte da cultura visual das últimas três décadas, provavelmente já a viu estampada em algum livro de ensino de geografia, história, ou então, nalguma reportagem televisiva. Sob a direção de Lawrence Cumbo, seguimos numa trajetória breve de 53 minutos do fotojornalista Steve McCurry em 2002, numa busca pela jovem que registrou em 1985 e ficou para sempre na memória cultural, em especial, dos ocidentais. Narrado por Sigourney Weaver, Menina Afegã: Uma Verdade Revelada é uma produção com tom didático, focada em traçar um panorama da expedição do fotógrafo que na época, utilizou trajes regionais para não ser identificado, indo do momento em que encontrou a jovem, fotografou e logo depois, teve a imagem como mercadoria visual na era da reprodutibilidade técnica.

Prova cabal do apego da nossa cultura contemporânea pela imagem, a fotografia nomeada com o mesmo título do documentário circulou bastante pela mídia na época e depois, transformada num ícone do sofrimento da mulher afegã, ali refugiada, num breve momento sem burca, flagrada no que Evandro Teixeira, mestre do fotojornalismo brasileiro, chamaria de instantâneos de realidade. Por meio de tecnologias utilizadas pelo FBI, ele e sua trupe retornam para o mesmo território geográfico, tendo em vista reencontrar a garota da foto, agora uma mulher adulta, cheia de história para contar e que talvez desconheça a sua imagem, realizada há quase duas décadas. Uma das técnicas para comparar as imagens atuais das candidatas com a garota da imagem é uma técnica de identificação da íris. Por detrás daquele olhar interpretado durante tanto tempo como a exposição do medo e da angústia, há histórias que precisam ser contadas.

Ao menos é o que pensa a equipe de produção. Nos desdobramentos do processo, descobrimos que ela se chama Sharbat Gula, na época com 12 anos, numa diáspora de refugiados em Nasir Bagh, no Paquistão. Casada, hoje vive com os filhos numa região remota e jamais soube do impacto que a sua imagem tinha causado na cultura midiática até então. Com depoimentos e situações registradas por diversos diretores de fotografia que assumem o projeto, acompanhamos a saga pela descoberta de Steve McCurry, em pleno solo oriental, um ano após o polêmico 11/9. O design Michael Lentz emprega alguns gráficos básicos para formar um design básico ao documentário, dando destaque ao seu tom didático, isto é, explicativo, acompanhados pela trilha heroica de aventureira de Lenny Williams e Chris Biando. É uma equipe dedicada, paciente e confiante nos resultados da busca da “inspiradora” Mona Lisa afegã.

Num território que não lhe pertencia, o fotógrafo captou uma jovem que é órfã desde os seis anos de idade. Na época, a sua angústia representava o medo diante da invasão soviética em solo afegão. Foi uma imagem de miséria e dor que se tornou arte para quem a recepcionou com outro ponto de vista. O sucesso extenso não deu nada além de fama para a garota que recentemente, envolveu-se num processo de documentação falsa e acabou sendo indenizada com uma multa e um apartamento para morar adequadamente com a família. É uma história externa a foto, mas que traz significância para pensarmos a trajetória desta personagem. E sobre seu fotógrafo, profissional de carreira sólida que cobriu eventos nas Filipinas, no Camboja, na Guerra do Golfo, etc. Ele começou a sua trajetória profissional estudando Arquitetura e Artes na Universidade da Pensilvânia, em 1968, mas se formou mesmo foi no curso de Artes Cênicas, em 1974. Na faculdade, assinou as imagens do The Daily Collegion, a sua base para adentrar na carreira que o manteve como longevo ícone da comunicação, o homem que fotografou a menina afegã.

Menina Afegã: Uma Verdade Revelada (Search For The Afghan Girl) — Estados Unidos/Afeganistão, 2002
Direção: Lawrence Cumbo Jr.
Roteiro: Lawrence Cumbo Jr.
Elenco: Sharbat Gula, Steve McCurry, Sigourney Weaver,
Duração: 85 min.

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