- Há spoilers. Leia, aqui, as críticas dos demais episódios.
Chegando na metade da temporada, Elgin James, que também dirige o episódio, o primeiro de três seguidos na temporada, preferiu usar a “técnica” do bate e assopra ou, talvez melhor dizendo, assopra e bate. Apesar do título já prenunciando a pegada sombria, grande parte de Dark, Deep-Laid Plans inegavelmente lidou com acontecimentos positivos envolvendo a grande maioria dos personagens, somente para fazer tudo desmoronar de vez ao final, relembrando-nos do que faz Mayans M.C. ser a série que é.
Coco foi, possivelmente, o único personagem a permanecer em queda livre, com o roteiro de Debra Moore Muñoz fazendo uma angustiante demonstração do poder irresistível das drogas. E nem falo aqui do furto do quilo de cocaína que ele executa debaixo do nariz de EZ, que jamais imaginaria que seu colega seria capaz disso. Meu foco está muito mais no momento em que Coco faz a entrega da encomenda a Isaac, personagem que JR Bourne tem construído de maneira deliciosamente maquiavélica, em que é perceptível a fragilidade do Mayan e, mais ainda, sua consciência clara de que ele está completamente dominado e adestrado, como uma foca que faz um truque para ser agraciada com uma sardinha. É de dilacerar o coração ver o personagem indo cada vez mais fundo nos círculos de seu inferno particular de onde desconfio que ele não conseguirá sair vivo.
Mas Coco é a nota discordante do episódio, por assim dizer. O restante é pura alegria ou pelo menos o máximo de alegria que Elgin James permite a seus personagens (e a nós, espectadores, claro). De um lado, temos o plano de Bishop finalmente dando certo graças a engenhosidade de EZ que consegue “subir” a “ponte do rio Kwai” e o risco que assume ao dar uma de Evel Knievel com a picape cheia de drogas. Ambos ganham seus minutos de felicidade, com Bishop realmente achando que seu caminho para ser o único rei está traçado e EZ decidido em conciliar-se com Gaby. Mas a direção do showrunner parece invocar nuvens de chuva por sobre a cabeça dos dois, pois, mesmo no triunfo, a tragédia futura é mais do que perceptível, tragédia essa que vem muito rapidamente no caso de EZ naquela assustadora sequência final em que, quase como em um videogame, somos arremessados em meio à ação em semi-primeira pessoa que deixará evidente para Gaby, quando a poeira finalmente baixar, quem realmente sua paixão é e o que ela atrai.
Apesar de previsível, esse cliffhanger foi muito bem executado e muito menos trágico – pelo momento – do que achei que seria, já que realmente imaginei que o primeiro alvo do atirador seria justamente Gaby. E esse momento, claro, é apenas um detalhe nos “planos sombrios e profundos” do título que parecem envolver o Cartel Lobos Sonora que mata e queima o simpático traficante musical do Cartel Galindo e também os clubes de motocicleta do lado americano da fronteira, tudo potencialmente provocado pelo vingativo Palo que, por enquanto, permanece nas sombras, ainda que provavelmente não por muito tempo.
A imagem de Palo, vale lembrar, serve de gatilho para a introdução de uma nova personagem Laura, vivida por Natalia Cordova-Buckley (a Yo-Yo de Agents of S.H.I.E.L.D.), que é procurada por Taza na sondagem sobre o paradeiro de seu irmão. Novamente, vemos uma pegada que chega quase a ser bucólica, com os dois, à sombra de uma bela árvore, relembrando o passado e tendo alguns segundos de alegria, ainda que, mais tarde, o reencontro dos dois demonstre o quanto esse passado realmente pesa nos ombros de Laura. Fica a torcida para que a personagem permaneça na série por mais tempo e ganhe o respectivo desenvolvimento, já que a atriz merece esse destaque.
Outra atriz que vem merecendo destaque é Carla Baratta como a sofrida Adelita. Depois de passar o pão que o diabo amassou nas mãos dos americanos e depois de percebe que ela não pode mais coadunar com as táticas de seu antigo grupo, ela procura Angel, descobrindo que ele próprio fugira para outras mulheres. Sem saída e extremamente traumatizada, tudo parecia mais calmo até que o Reyes mais velho se precipita e literalmente propõe casamento à moça, levando-a a sacudir a poeira, raspar o cabelo e, ao que tudo indica, sumir sem dar satisfações. A intensidade dos olhares e atitudes de Baratta, que não precisa recorrer a uma palavra sequer, diz tudo sobre a qualidade dramática da atriz e sobre as intenções de sua personagem. Veremos no que isso vai dar.
E, em meio a isso tudo, um momento verdadeiramente surpreendente: a conversa de Miguel com Felipe sobre Dita, depois que o primeiro descobre que a mãe no mínimo tinha alguma afeição pelo segundo. Não sei se a leitura é que ele só foi até o açougue para entender a situação e depois retornar com um machado e uma serra elétrica – considerando o quão desequilibrado está o personagem -, mas tenho para mim que, considerando sua reconciliação com Emily ao final, ele parece ter encontrado alguma paz ao ouvir anedotas sobre a mãe. Ou, claro, ele concluiu que Felipe é também responsável pela morte dela, nunca se sabe… Seja como for, foi belíssimo o abraço emocionado de Felipe em seu filho (porque Miguel é filho dele, não é mesmo?), mostrando em brevíssimos segundos mais um momento de qualidade de Edward James Olmos.
Dark, Deep-Laid Plans foi um cuidadoso e até mesmo lento, mas não menos magistral episódio de metade de temporada que parece realmente começar o ciclo que levará a temporada ao seu fim. Elgin James, na direção de mais dois episódios seguidos pela frente – e de novo no penúltimo – parece querer assumir completamente as rédeas desse belo, mas bruto e violento cavalo de corrida que precisa domar. Diria que toda a alegria possível na série acabou aqui mesmo e o que vem por aí será devastador.
Mayans M.C. – 3X05: Dark, Deep-Laid Plans (EUA – 06 de abril de 2021)
Showrunner: Elgin James
Direção: Elgin James
Roteiro: Debra Moore Muñoz
Elenco: J.D. Pardo, Sarah Bolger, Clayton Cardenas, Michael Irby, Carla Baratta, Richard Cabral, Raoul Trujillo, Danny Pino, Edward James Olmos, Emilio Rivera, Emily Tosta, Sulem Calderon, JR Bourne, Natalia Cordova-Buckley
Duração: 54 min.