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Crítica | Matador de Aluguel (1989)

Brucutu zen.

por Ritter Fan
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O final dos anos 80, comumente caracterizada como a década dos filmes de brucutu, foi marcada pela transição dos heróis bombados e invencíveis para protagonistas mais “normais”, mais humanos e, portanto, mais relacionáveis. Claro que o ponto máximo dessa tendência foi o sensacional Duro de Matar, em 1988, mas, logo no ano seguinte, foi lançada uma obra menor, de orçamento mais modesto, e estrelando um ator que foi revelado para o mundo em sua ponta em Vidas sem Rumo, mas que ganhou tração de verdade com Dirty Dancing, em 1987. Patrick Swayze tentou o caminho dos “brucutus frágeis” em Matador de Aluguel, resultando em um filme que caminha hesitantemente pela fronteira entre a tentativa de se construir um personagem que é mais do que uma eficiente máquina de matar e a mera sucessão de sequências de pancadaria, mas que, no final das contas, encontrou seu nicho e, diria, tornou-se cult.

No longa, Swayze vive James Dalton, um leão de chácara de boa reputação, mas com o obrigatório passado sombrio, que é contratado por Frank Tilghman (Kevin Tighe) para reabilitar seu bar/boate Double Deuce, na cidade de Jasper, no Missouri. Chegando lá, Dalton encontra uma absoluta baderna, com brigas constantes, colegas de profissão que não sabem controlar o público, bartenders ladrões, garçonetes que vendem drogas e tudo mais de muito errado que pode haver em um lugar desses. Usando seu estilo zen não confrontador, ele começa o trabalho criando inimizades com quem demite, mas ao mesmo tempo construindo sua reputação que, claro, logo contraria os desejos do magnata local, que é basicamente a encarnação do milionário babaca, o que lhe vale toda a sorte de problemas, incluindo atentados e assassinatos.

A premissa do filme é bem feijão com arroz e isso é ótimo, mas o roteiro coescrito por R. Lance Hill (cujo currículo é sofrível) e Hilary Henkin (que pelo menos tem Mera Coincidência para realmente orgulhar-se em sua carreira) tenta demais preencher o formulário padrão desse tipo de filme, primeiro escrevendo um Dalton como um personagem que tem seu lado “bonzinho” esfregando isso na cara do espectador das maneiras mais óbvias e mal escritas possíveis, com direito a constantes lembretes de que ele não parece muito grande para ser um leão de chácara, uma bucólica sessão de Tai Chi Chuan à beira do rio e coisas nessa linha, com seu lado “malvado”, ou o tal segredo sombrio de seu passado, vindo à tona da maneira mais inadvertidamente hilária nos 20 minutos finais do longa em que o bem “na cara” título em português finalmente é justificado e explicado.

E isso porque sequer estou mencionando que Dalton aluga um quarto em uma fazenda que, sem ele saber, fica exatamente do outro lado do rio da mansão de Brad Wesley (Ben Gazzara), o psicopata dono da cidade, e, também sem saber, começa a ter um caso com a bela médica Elizabeth (Kelly Lynch), que não só é sobrinha do dono da loja de peças automotivas aonde ele vai comprar um para-brisas, como, principalmente, é objeto de desejo de ninguém menos do que o próprio Wesley. Como diria Robin, “Santa Coincidência, Batman!”, não é mesmo? Em resumo, o roteiro é patético na forma como derrama no filme toda a sorte de clichês do gênero sem se preocupar com um mínimo de verossimilhança e sem sequer se decidir se o que vemos é uma espécie de sátira ou algo a ser levado a sério, mesmo que a dupla redatora mereça pontos por ter tido a sacada de transformar um Monster Truck na Arma de Tchekhov da vez.

No final das contas, o que salva o filme é o fator carisma. Há, claro, Patrick Swayze que se escora nessa sua característica para compensar sua dificuldade em criar as nuanças dramáticas que o roteiro, em tese, pedia de seu personagem e há a presença magnética e absurdamente simpática do cantor cego canadense Jeff Healey como o músico Cody, que toca todas as noites no Double Deuce e que já conhecia Dalton de outras eras. Além disso, na segunda parte do longa, Sam Elliott entra no elenco como Wade Garrett, leão de chácara mais veterano que fora mentor de Dalton e, então, a carga de carisma é imediatamente triplicada, com o ator basicamente chamando para si todos os holofotes nas cenas em que aparece, seja pelo seu visual, seja pela sua voz inconfundível. Do restante do elenco, a única menção que vale o esforço (ok, Lynch é belíssima, mas estou falando de atuação) é a de Gazzara que, sem ter com que trabalhar, cria um daqueles vilões tão absurdamente vilanescos que não dá para não rir toda vez que ele entra em cena para fazer as maiores barbaridades.

A direção de Rowdy Herrington (outro com um currículo pífio) até se esforça para dar alguma personalidade a um roteiro indigente, aproveitando-se, claro, do star power nascente de Swayze e das várias sequências de briga no bar e outras repletas de sexualidade exagerada e completamente deslocada, de forma a criar um trash que parece ser mais do que apenas isso, algo que as cenas finais com muita violência – e que parecem deslocadas no longa, quase como se a produção tivesse exigido refilmagens com litragem bem mais alta de sangue depois de ver o primeiro corte – acabam depondo contra. Matador de Aluguel, independente de seu sucesso financeiro e de eventuais apreciadores dessa bobagem que não consegue ser lá, nem cá, é uma obra que subutiliza seu elenco e subestima reiteradamente o espectador.

Matador de Aluguel (Road House – EUA, 1989)
Direção: Rowdy Herrington
Roteiro: R. Lance Hill, Hilary Henkin
Elenco: Patrick Swayze, Kelly Lynch, Sam Elliott, Ben Gazzara, Marshall R. Teague, Julie Michaels, Red West, Sunshine Parker, Jeff Healey, Kevin Tighe, John Doe, Kathleen Wilhoite, Travis McKenna, Roger Hewlett, Kurt James Stefka
Duração: 114 min.

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