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Crítica | Mãos Talentosas: A História de Ben Carson

A cinebiografia da edificante jornada de Ben Carson.

por Leonardo Campos
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Um filme sobre pessoas diante da superação e dos reencontros após a sequência de fases repletas de conflitos e obstáculos. Mãos Talentosas: A História de Ben Carson é uma cinebiografia que segue os padrões da linguagem dos telefilmes e traz para os espectadores, a trajetória de um homem que tinha tudo para dar errado na vida, mas com força e consciência de seu lugar no mundo, deu algumas guinadas que o tiraram de um destino já tracejado desde os primeiros anos de sua existência.  Sob a direção de Thomas Carter, realizador guiado pelo roteiro de John Pielmeier, a produção abarca os caminhos trilhados pelo personagem interpretado por Cuba Gooding Jr desde a sua infância, um período de pobreza, assédios na escola e problemas diante do baixo rendimento escolar, ao momento adulto, repleto de congratulações e reconhecimento pelos seus esforços e contribuições para o campo da medicina.

Filho de uma mãe solteira analfabeta, Ben Carson é um garoto que passa por muitas dificuldades nas aulas. Ele não consegue acompanhar a sala de aula no mesmo ritmo e não tem apoio da maioria de seus professores, figuras impacientes que o consideram um caso perdido, exemplo cabal de alguém incapaz. A sua mãe, mesmo diante de tantas limitações, surge em cena como a sua maior incentivadora. Ela o encaminha para a leitura, forçando-a a entender a biblioteca como um espaço de aprendizagem além da burocracia da nota. Ao propor dois livros por semana como projeto de vida, numa função empreendedora e educativa, a sua matriarca lhe permite a pavimentação de um caminho que o leva ao Hospital Anthony Hopkins, numa jornada inicialmente complexa e com fortes indícios de desistência, perspectiva turva que logo se transforma e permite ao personagem se tornar um dos mais renomados neurocirurgiões de sua época.

Benjamin (seu nome completo) é fruto de um lar marcado pelo abandono. No trabalho de sua mãe, a casa de uma viúva, teve a oportunidade de aprimorar a leitura. Acompanhamos essa trajetória com os elementos básicos das narrativas televisivas: a trilha sonora de Martin Davich adorna as passagens com tons melancólicos e triunfantes, a direção de fotografia de John B. Aronson constrói quadros e ângulos que ora o colocam como um oprimido, ora o exaltam como um herói vencedor, numa narrativa que também buscou ser meticulosa no que tange aos espaços por onde passam os personagens, trabalho do design de produção de Warren Alan Young. Em sua caminhada de muito estudo, investigação científica e aplicação de metodologia da pesquisa diante de cada caso médico que lhe vinha como desafio, o protagonista consegue alcançar metas muito além daquilo que inicialmente havia planejado para a sua vida.

Seu auge foi em 1987, quando alcançou renome numa cirurgia delicada que marcou para sempre a vida de todas as pessoas envolvidas, a separação de gêmeos siameses, unificados pela parte superior da cabeça, um processo considerado inimaginável para muitos profissionais de seu segmento. Foram árduos cinco meses de preparação, num procedimento que durou em média 22 horas e contou com apoio de 70 profissionais de saúde. Aos 33 anos, tornou-se chefe da neurocirurgia pediátrica, tendo ficado conhecido por introduzir o coração dos pacientes à hipotermia, estratégia que manteve o coração dos bebês parados, evitando perda de sangue e, consequentemente, dando chance ao processo de reconstrução do sistema circulatório do cérebro de cada um dos gêmeos separados nesta jornada revolucionária.

Interessante observar que mesmo pressionado pelo desestimulo que vinha de vários lados de seu cotidiano, o anseio pela pesquisa e pelo conhecimento era algo integrado no protagonista, uma figura que precisou de orientações para conseguir driblar as suas incertezas. Quando criança, Ben se envolveu com uma pesquisa sobre rochas que o levou a ler, analisar, desenvolver senso crítico e pesquisar para aprimorar as suas habilidades interpretativas. Ademais, em Mãos Talentosas: A História de Ben Carson, podemos observar como a questão da leitura, tema polêmico e geralmente desanimador, é um forte elemento empreendedor em nossas vidas. No filme, compreendemos que ler não é devorar e memorizar bibliografias, mas assimilar o seu conteúdo e aplicar na transformação da informação em conhecimento. Via de inclusão social, a leitura permite a ampliação do nosso repertório cultural, dando maior embasamento para o que produzimos dentro de nossas respectivas áreas de atuação cidadã.

Sem curva dramática exponencial demais, tampouco pontos de virada emocionantes, o roteiro de John Pielmeier para Mãos Talentosas: A História de Ben Carson segue um fluxo linear, com alguns flashbacks explicativos, se mantendo no mesmo nível do começo ao fim. Apropriado por pessoas no campo da administração, psicologia, pedagogia e até mesmo no meio dos doutrinadores evangélicos, o trajeto biográfico de Benjamin Carson é uma narrativa de numerosas possibilidades reflexivas, tendo no entretenimento um produto acima da média, com bons momentos dramáticos, desempenho esforçado do elenco e concepção estética dentro de seus limites, não sendo uma obra-prima do cinema, mas contendo em si méritos que atendem ao que a sua estrutura propõe. Dentro os principais pontos de vista, como já mencionado, é uma história para pensarmos superação, mas também a importância da leitura como meio canalizador de novas aprendizagens sempre, bem como desenvolvimento do raciocínio.

Aqui, concluímos que ler não apenas decodificar símbolos, mas generalizar, sintetizar, propor hipóteses para o que é debatido, num diálogo com aquilo que está escrito e exposto para nossa interpretação. Em seus 86 minutos, Mãos Talentosas: A História de Ben Carson funciona como uma narrativa de entretenimento médio, estruturada por um tecido dramático coeso e simples, sem grandes momentos para a história da dramaturgia, mas com uma trama que evita o tom novelesco geralmente prejudicial da linguagem de muitos telefilmes. O direcionamento narrativo é direto, objetivo, prende o espectador e permite reflexões sobre as nossas vidas, independente do ponto em que nos encontramos localizados, tanto para quem começou o seu projeto de vida por agora quanto para aqueles que já estão avançados, firmes, isto é, estabelecidos nesta vida em que nada é uma certeza absoluta e tudo pode mudar num segundo. Lembra-se da pandemia que nos pegou em 2020? Pois é, prova cabal de que nada pode ser mais tão estagnado como pensávamos. Fica a reflexão.

Mãos Talentosas (Gifted Hands: The Ben Carson Story) — Estados Unidos, 2009
Direção: Thomas Carter
Roteiro: John Pielmeier
Elenco: Cuba Gooding Jr., Kimberly Elise, Aunjanue Ellis
Duração: 86 min

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